terça-feira, 31 de janeiro de 2023

Performance no CAC: A Hora da "Loba"!

          Mariana Pacheco de Medeiros apresentou, neste último fim de semana, na blackbox do Centro de Artes, Arquipélago, Ribeira Grande, a sua performance teatral intitulada “A Loba”. Ao todo cinco sessões, sempre com a sala composta e com bilheteira esgotada algumas horas antes. Houve também tempo para apresentações escolares e ronda de debate e discussão pública.      
                 “Loba” recria em cena os rituais de passagem para a idade adulta, a afirmação da sexualidade e os valores da feminilidade, a necessidade de fantasia e ainda de transformação, associados à arte e evasão pessoal. O mote é-nos dado pela evocação do célebre “Conto do Capuchinho Vermelho”, sendo que a saída para o baile de debutantes rondará a “floresta” até ao cair do pano. Por momentos, observamos um corpo que dança e que se manifesta, como se o mundo estivesse suspenso perante os espelhos dos caminhos que se abrem e multiplicam. Qual é o destino desta “Loba”?
            A performer/actriz surpreendeu o público presente numa recepção íntima do banho, narrando num registo autobiográfico a sua visão de mundo, convidando a audiência a segui-la neste seu relato pessoal.  A audiência sentou-se, assim, diante de uma banheira ao mesmo tempo que se projectavam na parede vídeos em simultâneo que aludiam ao conteúdo sonoro  escutado. Enalteça-se, pois, a coragem e ousadia inicial desta “Loba” – a água como ritual iniciático e fundacional – despertando os sentidos para os elementos cénicos em disputa, mantendo sempre a tensão e o suspense sem nunca atingir o clímax. 
Deste modo, enquanto decorriam as várias projecções, escutava-se uma narrativa de permeio, permitindo à assistência ingressar naquela intimidade – memórias e lembranças daquele corpo feminino em crescimento, visualizado esse quebrar de convenções, esse desejo e ânsia de viver, um protesto libertador que visa acalmar e, por fim, "quando a barriga estiver cheia, adormecer".
          Porventura, alguma profusão e dispersão de imagens fosse desnecessária tal como a introdução da voz natural combinasse melhor com alguma artificialidade pela voz gravada e consequente distanciamento. No entanto, é caso para referir que este “Loba” é um gesto teatral/performativo forte e intenso, ao que parece tão radical e urgente num tempo de retrocessos e fechamentos.
       Por último, uma referência à música presente na “Loba” , dado que esta está carregada de dramatismo e balanço, com os devidos parabéns a Elliot Sheedy, tornando este momento altamente criativo, com relativa emoção e expressividade, deliciando e cativando a assistência que se deslocou à blackbox do Centro de Artes Contemporâneas, Arquipélago.

"A Decisão" de João Luís Barreto Guimarães

Vem Janeiro e
hesitamos no que fazer ao pinheiro
mais antigo
do jardim. Janeiro tem duas faces. Por nobre
que possa ser o
seu sumptuoso tronco
as pinhas e a caruma que encobrem
a erva rasa vão
criando um paraíso (distante das leis do fórum)
nada menos que
anárquico. Há anos que
o jardineiro lhe promete a motosserra
(detido pelo mau juízo do nosso
sim
definitivo). Nem é tanto pela mágoa de
trocarmos a madeira por meros
instantes de cinza é
não sabermos depois onde a Sombra
da árvore cortada
habitaria. 

in “Aberto Todos os Dias”, Janeiro de 2023.

sábado, 28 de janeiro de 2023

quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

A Aventura de Michelangelo Antonioni (2)

Monica Vitti, 1960
(Fotografia Museo Antonioni, Ferrara) 

 

segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

sábado, 21 de janeiro de 2023

Um Poema de João Paulo Esteves da Silva

 (de impossível esta música)

Vem a música à procura…
sobre a poeira mais seca
de seus passos saltam peixes,
traz a tua vida no cantil que se derrama;
em água vestida de sede 
procura o que vai criando:

palavras e violinos. 

in "Notas à Margem", Poemas sobre "Habitar o Tempo" de Vieira de Freitas, Amores Perfeitos, Maio de 2002.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

A Aventura de Michelangelo Antonioni

Monica Vitti em "A Aventura", 1960.
(Foto: Museo Antonioni, Ferrara)
 

terça-feira, 17 de janeiro de 2023

FALTA#5: FAUNA e FLORA no Prelo!

 Chega, assim, como quem não quer a coisa. Com a temperatura amena e o vento da estação. É um facto: não está muito frio, dizem. Pelo menos por aqui ainda se avistam outras estações do ano, por pequenos momentos, é verdade. A água, essa, é sempre abundante, não tem parado de cair. Por vezes, o sol irrompe, há neblinas, tardes lentas e prazenteiras, árvores silenciosas, ainda que não tivéssemos notícias de que o ilustre compositor veneziano tivesse alguma vez passado por este território. 

segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

"Prazeres"

O primeiro olhar da janela de manhã
O velho livro de novo encontrado 
Rostos animados 
Neve, o mudar das estações 
O jornal
O cão
A dialética 
Tomar duche, nadar
Velha música 
Sapatos cómodos 
Compreender 
Música nova 
Escrever, plantar 
Viajar, cantar 
Ser amável. 

Bertolt Brecht 

sábado, 14 de janeiro de 2023

quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

Um Poema de Ana Paula Inácio

 Deixa a mulher indicar-te o caminho
atrás tens o lago 
à frente o destino

são páginas a mais 
eu sei,
desfaz-te delas
faz uma tocha 
alumiar-te-ei o caminho. 

Setembro de 2020, (Porto, Ilhas). 

segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

Do "Estrangeiro" de Caetano Veloso

O amor é cego

Ray Charles é cego

Stevie Wonder é cego

E o Albino Hermeto não enxerga mesmo muito bem

quarta-feira, 4 de janeiro de 2023

"Lobo e Cão": Esta Luz Crepuscular!

         
       Assistir a “Lobo e Cão”, uma longa-metragem focada no que é vital e diverso no humano, assinada pela realizadora Cláudia Varejão, no Cinema Trindade, no Porto, longe das ilhas, pode ser o segredo para um olhar distanciado propiciador de uma reflexão mais livre e descomprometida. 
         Comece-se, pois, pelo título que remete de imediato para um lugar de transição, essa linha ténue que vai da clausura à liberdade, a realidade entre o dia e a noite, do interior ao exterior, a divisão do feminino e masculino, no fundo, esse feixe de luz crepuscular em que tudo se transforma. Daí, ter sido muito feliz a escolha deste título na fixação efémera dessa passagem, dado que estamos na presença de três amigos adolescentes em mudança.  
      “Lobo e Cão” é, sem dúvida, um filme delicado, que não tem pretensões em dividir as águas, mas sim aproximar e dialogar com as diferenças, sem ser invasivo. A película aborda a comunidade queer de São Miguel, no que isso possa ter de "particular" ou “alienígena”, sobretudo para quem se limita a observar do exterior. No entanto, o seu olhar é feito a partir de dentro e com grande respeito pelas pessoas. É que Cláudia Varejão gosta de filmar, com vagar e proximidade, a assunção de personagens comprometidas com o seu corpo e os seus sentimentos, associados ao lugar de origem, refletidos na sua identidade. Por esse motivo, a realizadora filmou "Ana", Ana Cabral, com muito cuidado e sensibilidade, sendo que esta tem aqui um papel de enorme expressividade física e contenção sentimental. A “Paulina”, Marlene Cordeiro, a mãe de "Ana", transporta consigo o passado e o medo de ter falhado nos cuidados maternos, realçando um registo facial sofrido, de resistência e firmeza desmedida. Depois, há também Ruben Pimentel (Luís) e Cristiana Branquinho (Cloé) que dão oportunidades de sobra à realizadora portuense de tocar em emoções reprimidas, soltar afetos contidos, expressar perdas e outros tantos sonhos por cumprir. A imagem do filme absorve-os de tal modo que estes parecem dominar o mundo da representação há muito tempo, tal é o desembaraço perante as câmaras. No entanto, após o visionamento do filme, o embaraço é dos que continuarão a recusar a diferença dos que vivem e sofrem em silêncio com os seus desejos e anseios por realizar.
             Desta feita, esta primeira longa metragem de Cláudia Varejão, com a duração de 110 minutos, é um rico presente cinematográfico que nos devolve a ilha sob a forma de mosaico humano plural - para além da bonita fotografia - sendo esta filmada maioritariamente na freguesia de Rabo de Peixe, em São Miguel.
           Por último, sublinhe-se que “Lobo e Cão” já ganhou o prémio principal da secção Giornate degli Autori do Festival de Veneza e que contém uma banda sonora capaz de abarcar os mais diferentes registos sonoros: Xinobi, que traz três temas imponentes “Toute une Premier Fois” “Searching For” “Cruise Fort V2”, os Vive La Fête, com um dos temas musicais evocativos da narrativa - “Porque te Vas?”- num tema antigo de Jeanette, a britânica que adorava a cultura espanhola, o “Concerto em D Minor, BWV 974 II Adagio” de Johann Sebastian Bach, interpretado por Olga Schoeps, ou ainda o “Das Buch der Klänge”, de Hans Otte, tema mais que hipnotizante tocado aqui pela pianista Joana Gama.

terça-feira, 3 de janeiro de 2023

segunda-feira, 2 de janeiro de 2023