sábado, 29 de julho de 2023

Do Veto

      "Umas das razões que sustentam o veto do Presidente da República é a de que o diploma cria "uma disparidade entre o continente e as Regiões Autónomas". É que, nas ilhas, a solução adoptada foi a da devolução integral do tempo de serviço. Bem sei que os professores exigem ser colocados em escolas perto de casa, mas isto seria capaz de justificar um movimento pendular a nado. Honestamente, não encontro razão pra que os professores continentais não tenham os mesmos direitos dos professores das regiões autónomas. Será mais difícil lidar com crianças que vivem numa ilha? Só estou a ver uma explicação para esta discriminação: quem fez a lei tinha acabado de ler "O Deus das Moscas".

Manuel Cardoso, in E se a Carreira Docente fosse Decente?Expresso, 28 de Julho de 2023.

sexta-feira, 28 de julho de 2023

Miles Davis por Lee Tanner

in Lenine´s-on-the- Tumpike, West Peabody
Massachusetts, 1968

 

Viagens de Stefan Zweig

      
       "Os portos e as estações de comboio são a minha paixão. Sou capaz de ficar horas à frente deles, até uma nova vaga ruidosa de pessoas e mercadorias se sobrepor à anterior. Adoro as tabelas misteriosas, com indicações de horas e trajectos, os gritos e os ruídos, coloridos e indistintos, que se interpenetram de forma significativa. Cada estação é diferente, cada porto, cada barco traz uma carga diferente Eles representam o mundo nas nossas cidades, a diversidade no nosso quotidiano."



in "Viajar ou ser levado em viagem", Relógio de Água, Agosto 2021.                                    

quarta-feira, 26 de julho de 2023

Esplanada de Paulo Ramalho

Cacofonia na esplanada: olho à volta e nada ouço
Cada um
isolado no búzio secreto dos seus pensamentos 
constrói a grande teia de ruído 
A situação é mais aflitiva no centro da esfera oca
porque os que mais falam (Babel) são os que menos ouvem

in Manual de Sobrevivência para Náufragos, Douda Correria, 2020.

Canta Conto Conta no CAC - Arquipélago

um projecto Discos de Platão
inserido no âmbito da "Odisseia Nacional"
Teatro Nacional D. Maria II
 

terça-feira, 25 de julho de 2023

Amanhã, às 10 horas, no Ribeiragrandense

     "Na fronteira entre o Equador e o Peru, à beira do rio Pastaza, a comunidade de Suwa tem menos de uma centena de habitantes da etnia equatoriana Achuar. E são as crianças de Suwa que Inês Alves filma: e através delas toda uma maneira de viver a infância em comunidade que hoje já quase não existe na sociedade ocidental. Os miúdos ficam praticamente sozinhos todo o dia: brincam, tratam uns dos outros, vão à pesca ou à caça ou apanhar fruta, cozinham refeições, sem a presença de pais ou familiares. E o que começa por nos parecer, aos nossos olhos ocidentais, uma absoluta irresponsabilidade paternal de deixar miúdos sozinhos à solta, revela-se - através do olhar paciente e atento da realizadora - um olhar profundo sobre o que pode significar ser criança."

 Jorge Mourinha, PÚBLICO

sábado, 8 de julho de 2023

Da Graciosa

 "Há na Graciosa um sentido de comunidade raro no país. O isolamento provocado pela insularidade explicará parte do fenómeno mas não todo. Ao longo do ano não faltam festividades a unir a população - de um forte Carnaval às Festas do Senhor Santo Cristo dos Milagres (em Agosto), sem esquecer as celebrações do Espírito Santo (em Maio) - esse será um dos segredos. Outro é a noção de interdependência entre todos. Dos que trabalham a terra (produzindo carne e legumes) aos que transformam os alimentos em alimento (seja na forma de queijos - cujos cristais, que na verdade são grânulos de tirosina, atestam a qualidade, de queijadas afamadas ou de refeições tradicionais), todos se conhecem. E contam também com o que o Atlântico oferece, muitas vezes em troca de muito esforço."

João Miguel Salvador in Revista Expresso, dia 7 de Julho de 2023.

Antes que o verão chegue

Antes que o verão chegue

e as longas tardes

se espalhem pelo coração

e te prendam ao desgaste habitual

toca uma palavra

para que permaneça

na minha boca

onde mais ninguém

possa ficar confundido.

 Uma apenas.

E vê como pesa menos sobre o silêncio

a sombra que vais mover.


Vasco Ferreira Campos, in “A Voz da Chuva”, Pedra Formosa, Guimarães, 1996.