terça-feira, 7 de dezembro de 2021

Andar a Pé...

            "No meu passeio da tarde, gosto de esquecer completamente as tarefas que realizei de manhã e as obrigações sociais. Mas acontece. às vezes, não consegui sacudir de mim a civilização com facilidade. Os pensamentos à volta de algum trabalho correm na minha cabeça e não me encontro onde o meu corpo está - perco a consciência. Gostaria de voltar a estar presente. Que faço eu nos bosques, se a minha concentração foge para algo que não é o estar ali? Recrimino-me e não consigo evitar um arrepio quando me reconheço tão abstraído, mesmo se são nobres os motivos da abstração - o que, de facto, acontece com frequência."

Henry David Thoreau in Alma dos Livros.

"Vírus" de Inês Lourenço

Há uma tristeza inerme nos feriados,

um entrega do pulso das cidades

a um vírus insidioso 

habitante das janelas onde 

nada está para chegar 

ou para partir. Lá dentro cumpre-se o decálogo

dos cansaços. Cá fora perdemo-nos 

no planetário do asfalto, na vã arritmia

dos semáforos acesos. As fachadas 

transbordam de umbrais vazios

e as frontarias bancárias da Baixa 

semelham basílicas fechadas ao culto. À beira-mar 

grupos de catalépticos auditores da Bola 

oriundos de algum centro comercial 

passeiam filhos, esposas e animais de companhia

até às esplanadas da outra margem,

para regressos na fila de escapes do crepúsculo. 

in "Um Quarto com Cidades ao Fundo", Quasi edições, 2000.

"Curta Açores" na Ribeira Grande

       Primeiro dia do Curta Açores-Festival de Cinema da Ribeira Grande com um filme belo e surpreendente oriundo da Sérvia: "Moon Drops", do realizador  Yoram Ever-Hadani. Uma narrativa cinematográfica feita de engenho e amor, evidenciando aquilo que o cinema possui de mais fantasioso e imaginativo. O Festival abriu ainda com outra curta sintonizada com o tempo actual - "Lista", da brasileira Luciana Oliveira e com argumento de Gustavo Pinheiro. Uma curta sobre a solidão do tempo presente agravada por um vírus desconhecido e em que a esperança é a última a morrer. Um texto que vive da força  e representação da actriz  veterana com origens micaelenses, Lília Cabral.