quarta-feira, 4 de setembro de 2024

Um Poema de Cesar Pavese

Tens rosto de pedra esculpida,
sangue de terra dura,
vieste do mar.
A tudo acolhes e auscultas
e empurras para longe,
como o mar. No coração
tens silêncio, tens palavras
submersas. És sombria.
Para ti a madrugada é silêncio.

E és como as vozes
da terra - a pancada
do balde no poço,
a canção do fogo,
a queda de uma maçã,
as palavras resignadas e amargas
na soleira das portas,
o grito da criança - as coisas
que ficam para sempre.
És sombria. Imutável.

És o subterrâneo fechado,
de chão de terra batida,
onde o menino descalço,
uma vez entrou
e de que se recorda sempre.
És o quarto escuro
que se recorda sempre,
como aquele pátio antigo
em que a manhã despontava.

in "Virá a morte e terá os teus olhos", 5 de Novembro de 1945