domingo, 16 de março de 2014

O Guia Açoriano

       “Tu és a pessoa indicada para a realização de um guia à volta do arquipélago.”- declarou a chefe de redacção alagada de salamaleques identitários quando ouviu falar na diminuição de pessoal no jornal e uma adquirida reestruturação do quadro da redacção do diário. Eu pensei rapidamente que aquela era uma forma subtil de me dizer qual era o caminho mais fácil para a desocupação laboral. Num breve instante passaram-me pela cabeça todos os artigos e reportagens que tinha escrito para aquele diário em dez anos de jornalista com carteira profissional para além das noites que passei naquela minúscula sala a escrever como um vagabundo, sem rota nem destino, a acrescentar o álcool vertido e o odor do tabaco colado à roupa, andrajos que no regresso a casa iam directamente para a vetustíssima máquina de lavar. “Quanto tempo é que precisas para realizar tal tarefa?”- Repetiu de forma contundente a senhora redactora e de mim apenas saiu um esgar de cansaço e um sorriso furtivo e sem alma. Era garantido que uma visita ao arquipélago açoriano era, no imediato, o que se me afigurava no horizonte em perspectiva.

       
Fotografia de Tânia Santos
         A minha interrogação, no entanto, crescia a cada momento pois não parava de indagar sobre o que é que eu sabia sobre as nove ilhas açorianas deixadas a meio do oceano atlântico por um antigo império ultramarino? Outra questão era o que é que a senhora redactora terá visto em mim para me escolher como organizador de um guia turístico para sair em breve com o jornal, ao mesmo tempo que me retirava das funções de sempre, da rotina a que estava habituado há tanto, tanto tempo. Desliguei o computador, saí da redacção do jornal e indaguei qual seria a agência de viagens mais próxima, precisaria entretanto de saber o preço das viagens já que com a contenção tudo me seria pedido nos próximos dias. Numa primeira instância precisava digerir o anúncio do despedimento ou afastamento das minhas funções de jornalista durante algum tempo. Daí ter procurado o café mais próximo para ler o jornal concorrente e pensar no que me estava a acontecer. Não era grave. Pensava em todos os amigos que tinha tido das diferentes ilhas durante o período da Universidade e numa viagem em tempos longevos a quatro ilhas integrado numa comitiva de jovens estudantes de Biologia nos idos anos noventa.