quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

"Nas Nuvens" por João Decq

"1. Nuvens

Etéreas, voláteis, passageiras.
Carregadas de chuva. Contrastes de um céu azul.
Pretas ou cinza, brancas, lilases, rosa.
Sempre mutantes, sempre livres.
Prenúncios do que há de vir,
as nuvens são coisas de ver.
Se me oferecessem nuvens pô-las-ia no chão ou numa 
cama para poderem descansar. Dava-lhes chá ou
limonada. Abria-lhes todas as janelas e portas de casa
para que pudessem partir sempre que quisessem.
Toda a gente sabe que as nuvens adoram piqueniques." 
                  
                                         (...)

in Exposição de continuidade "Quatro por Quatro", Centro de Artes Contemporâneas, Ribeira Grande

"Três Andares" de Nanni Moretti no Teatro Micaelense

     “O ser espectador de cinema conta muito na minha vida. Quando, durante a pandemia, esperei que reabrissem as salas, não quis vender "Três Andares" à Amazon, à Disney, etc. Esperei que as salas abrissem. Fi-lo porque ainda antes de ser realizador, produtor ou exibidor, falo como espectador. Uma das coisas que mais me faltaram durante o lockdown foi ir ver os filmes em sala. Não é uma questão ideológica ou nostálgica. Faz parte estruturalmente da minha vida, dos meus dias.”
         Nanni Moretti,  Ípsilon, 5 de Novembro de 2021.

Tínhamos muitas saudades de ver filmes de Nanni Moretti no grande écran: a sua ironia, o seu desplante crítico, a sua forma prazerosa de fazer cinema e estar na vida. “Três Andares” não tem nada disso, não há ironia, nem identificação fácil com um único personagem. É um filme duro, tal como o tempo que nos encontramos a viver. Os seres humanos, ali evidenciados, colocam-nos questões, as vidas dos condóminos não são a preto e branco e, talvez por isso, saímos dali sem nenhuma certezas sobre o bem e o mal. Baseado num romance do israelita Eshkol Nevo, o filme “Três Andares” é um outro Moretti que emerge, muito mais próximo de Thanatos do que de Eros, ainda que haja redenção no fim de tudo isso.