quinta-feira, 11 de junho de 2020

Um Poema de Lucebert

não sou um poeta amoroso
sou o vigarista iroso
do amor, vejo debaixo dele o ódio
e por cima um gesto cacarejando

a lírica é a mãe da política 
apenas sou o apregoador de revolta
e a minha mística é a comida corrompida
da mentira com a qual a virtude se desintoxica

proclama que os poetas de veludo
estão a morrer tímidos e humanísticos 
doravante a ardente gola férrea
dos carrascos comovidos abrir-se-á em cânticos 

ainda eu, que moro nesta coletânea
como um rato na ratoeira, anseio pelo esgoto
da revolução e grito: ratos de rima, zombai
zombai ainda desta escola da linda poesia
                     
                                  in revista Grotta nº4, Arquipélago de Escritores, (Dossier Lucebert -Traduções de Jos van den Hoogen, Daniel Rocha e Arie Pos), Junho de 2020