terça-feira, 24 de junho de 2014

Inquérito do Estio

Neste Estio conseguimos uma coisa que só é mesmo possível na estação dos garajaus e das  hortênsias: um inquérito de verão ao Doutor Mara. Há muito que se aguardava um regresso desta natureza, fruto de uma longa ausência e má vontade da sua parte em lidar com o barril de pólvora mediático que nos assola. As últimas notícias davam conta de um homem afastado da realidade social, dado que se tinha retirado há muito deste mundo para viver num moinho junto de um cerrado, elaborado e construído por si e mais dois amigos ligados à nova carpintaria portuguesa. Sorvamos, assim, as doutas respostas deste doutor, enviadas pelo correio e com um selo antigo com o preço desactualizado, escrito  na sua estranha caligrafia, inserido num envelope de papel cuchê  de cor carmim.
 
DM:Doutor, doutor, rio ou mar?
DM:Mar, evidentemente. O rio tem sido invadido por motas de água e outras espécies raras.
DM: Destaca o quê concretamente neste verão?
DM:As hortênsias que estão muito preclaras e sublimes mas que, infelizmente, são invasoras, segregando tudo em redor. É pena. E ainda os garajaus que continuam a fazer voos rasantes e algo despropositados face à temperatura muita fria das águas.
DM: Como eram os Verões da sua meninice?
DM: Eram passados à beira-mar, a maior parte das vezes refugiava-me dentro dos botes ou dos batéis (conhecidos por Caicos) para escapar ao sol, ainda sem a preocupação do buraco do ozono. A maior parte das vezes adormecia no interior destes e isso causava um transtorno enorme para a minha família pois passavam a tarde inteira à minha procura.
DM: O que é que mais gosta de fazer nesta estação?
DM: De dar banho ao cão.
DM: De que é o que o Doutor tem mais saudades de fazer nestes meses estivais?
DM: De andar de comboio. Foi nesse meio de transporte que aprendi os nomes das terras do meu país e a gostar de ler.
DM: O Doutor quer dar-nos três músicas para ouvir?
DM-“Watermellon in the Easter Hay”do Frank Zappa, álbum”Joe´s Garage, “Vulcão dos Capelinhos” de Luís Alberto Bettencourt e o “Marujo”, pela voz do Carlinhos Medeiros.
DM: Uma frase que o tenha marcado recentemente?
DM:“Ao decidirmo-nos a dissertar sobre um qualquer objecto, é aconselhável reflectir, e depois dar a conhecer aos outros, sobre o modo como chegámos a pensar precisamente nesse objecto, e quais as condições que nos levaram a dedicar-lhe uma atenção crescente.”É uma frase  do meu velho amigo Goethe.
DM:Que tipo de leituras costuma efectuar na estação favorita de Johannn Wolfgang Goethe?
DM:De manhã leio poetas, sobretudo alemães, mais poemas de portuenses frequentadores do Pequeno Orpheu e também poetas das nossas ilhas ultra periféricas. À tarde, leio ensaios sobre a crise capitalista e as energias renováveis, ao cair da tarde entro a fundo nos ensaios sobre a natureza da estética ou o fim da arte na era da técnica. E, à noite, remato sempre com um ou dois romances que abordam a atomização crescente dos indivíduos e a  falta de esperança das novas gerações de políticos formados nas escolas de Economia e Direito.
DM:De que sente falta na canícula?
DMMuito sinceramente, tenho saudades de comer um super maxi (nunca percebi porque lhe chamam assim) bem como o de me encontrar com os Manos Manaia, sobretudo com a minha amiga Miriam Manaia. Ah…e ainda do meu magnífico e escapulido amigo, o Janeiro Alves, nem imaginam o quanto é bom entrar noite dentro com ele e com as nossas charlas intermináveis rodeados de vinho biológico e favas escoadas.
DM: O nosso mui obrigado, Doutor.