terça-feira, 17 de abril de 2018

Da Arte

          “Eu diria que a arte é, em primeiro lugar, não sobre o mundo mas sobre o sujeito que a produz. A arte é um modo através do qual o sujeito pratica o desenho da sua própria aparência do mundo. A arte manifesta não o modo como eu vejo o mundo, mas o modo como quero que o mundo me veja a mim. Regra geral, a imagem que apresentamos ao mundo não nos agrada – por isso tentamos mudá-la por meio da filosofia, da política e da arte. E, ao mudarmos a nossa imagem da sua prática, a arte transforma o mundo no qual acontece. A arquitectura, por exemplo: independentemente de gostarmos dela ou não, temos de viver dentro dela. A arquitectura define o nosso modo – isso pode ser dito de todas as formas de design. Mas também somos formados pelos filmes que vemos, os livros que lemos, etc. Nada disso é feito pela natureza – nem por nós, enquanto leitores ou espectadores. E a nossa relação com toda esta arte não é uma relação externa, estética. Não temos a liberdade da distância estética e do juízo estético. Vivemos dentro da arte e somos formados por ela. Por isso é uma pergunta legítima: como é que este processo formativo acontece? E é precisamente uma questão da poética, não da estética.”

Boris Groys numa entrevista a António Guerreiro, revista Electra, Março de 2018