segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

Os Filhos da Madrugada: Rita Rato

       “Era um espaço muito aberto (Biblioteca Municipal), aonde podíamos ir buscar livros, descobrir coisas que não tínhamos, onde fiz trabalhos de grupo. Felizmente sempre vivi em casas onde existiam livros. Alguns amigos, os únicos livros que tinham em casa eram livros de escola. Estamos a falar do final dos anos 80. Também havia acesso a um conjunto de ofertas culturais. A primeira vez que fui ao teatro e vi a Maria do Céu Guerra foi em Estremoz, não foi em Lisboa. A primeira vez que ouvi ópera foi em Estremoz. O poder local permitiu isso. Uma política cultural e desportiva muito próxima das pessoas. Sinto que ter nascido em 1983 e não ter nascido em 1963, foi transformador na minha vida.”

in "Os Filhos da Madrugada", de Anabela Mota Ribeiro, Temas e Debates e Círculo de Leitores, Novembro de 2021.

"Os anos 20 um século depois" de Bradley W.Hart

"Os anos 20 nasceram então no meio de mortalidade a uma escala insondável. Em nenhum outro lugar isto se encontra mais bem reflectido do que na arte da época. Enquanto alguns artistas trataram directamente o assunto da Gripe, Eduard Munch nos seus Auto-Retrato com a Gripe Espanhola e Depois da Gripe Espanhola, ilustra dramaticamente o preço a pagar pela doença, representando-se como um espectro. Tratar a violência do conflito era mais comum. Na Alemanha devastada pela guerra e pela hiperinflação, os expressionistas utilizavam os seus talentos para retratar o horror puro, com Der Krieg, as gravuras de Otto Dix, a representarem o mais tenebroso dos exemplos. O Expressionismo não era apenas sobre tragédias do passado, era também sobre o presente e o futuro. Não foi por acaso que a arte expressionista sofreu fortes críticas por parte dos conservadores alemães, tendo sido totalmente proibida e confiscada pelos nazis em 1937.
   Esse fenómeno não se circunscreveu à Alemanha – por toda a Europa, durante os anos 20, os artistas começavam a romper com convenções e “regras”, Matisse e Picasso, entre outros, aproximaram-se dos estilos e cores pelos quais são famosos nos nossos dias. Encontramos uma crítica semelhante ao mundo de antes da guerra dos anos 20 no movimento Bauhaus. Em meados da década, Walter Gropius e seus associados tinham introduzido princípios radicais de design que ainda hoje mantém a capacidade de nos chocar. Estes projectos faziam bem mais do que romper com as tradições artísticas do período clássico ou com os estilos arquitectónicos cada vez mais datados que durante tanto tempo dominaram a Europa. Tratava-se de construir um futuro liberto da morte e destruição do passado."

in Electra, nº12, Primavera de 2021.

Um Verso dos Echo & Bunnymen

Under a blue moon I saw you 

"A Débil" de Cesário Verde

Eu, que sou feio, sólido e leal,
A ti, que és bela, frágil, assustada,
Quero estimar-te sempre, recatada
Numa existência honesta, de cristal

Sentados à mesa dum café devasso,
Ao avistar-te, há pouco, fraca e loura,
Nesta Babel tão velha e corruptora,
Tive tenções de oferecer-te o braço.

E, quando socorreste um miserável
Eu, que bebia cálices de absinto,
Mandei ir à garrafa, porque sinto
Que me tornas prestante, bom, saudável. 

Os Filósofos e o Amor

     "Frase curiosa e delicada, "no amor, ao mesmo tempo que nos revelamos a nós mesmos, é um outro que nos é dado com a sua história, as suas possibilidades, o seu universo. Isso é-nos sempre oferecido envolto em mistério, o outro é-nos simultaneamente próximo e estranho, senão já não seria outro. Observarmos o nosso amante, sentimo-lo como uma evidência, quase como uma extensão de nós mesmos e no entanto perguntamo-nos o que pensará ele, o que sentirá, quem é ele, no fundo."

in "Os Filósofos e o Amor" de Marie Lemonnier e Aude Lancelin, tradução de Carlos Vaz Marques, edição da Tinta da China, Maio de 2010.