quinta-feira, 30 de junho de 2022

quarta-feira, 29 de junho de 2022

"Amoras" de Sophia de Mello Breyner

 O meu país sabe a amoras bravas no
Verão.
Ninguém ignora que não é grande,
nem inteligente, nem elegante o meu país,
Mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.
Raramente falei do meu país, talvez
nem goste dele, mas quando um amigo
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos,
reparo que também no meu país o céu é azul.

Verão

Fotografia de Tânia Neves dos Santos 
 

quinta-feira, 23 de junho de 2022

"Ordem (III)" de Manuel Fernando Gonçalves

Ouvir-te, em casa, quando dizes:
reconheço esta palavra,
foi nesta rota, a meio, perto
de um campo de açucenas, que me faltaste, 
regressar só é possível se o coração recolhe
outro nome. Nesta divisão permanecem,
nítidos, os meus amigos de lá.

in CAOS, frenesi edições, Novembro de 1987

terça-feira, 21 de junho de 2022

Sobre a Falta

     "Uma coisa fique clara: o espanto liga-se ao desejo, não às necessidades. Caímos frequentemente na tentação de pensar que necessidades e desejos talvez não sejam argumentos diferentes, já que refletem a mesma experiência: a da falta. Porém, entre ambos, como explicou Jacques Lacan, existe uma diferencça insuperável: é que "o desejo não tem objecto". A posse de um objecto satisfaz uma necessidade, mas o desejo é de outra ordem. O sujeito sabe o que deseja, mas não sabe o que deseja. O desejo é a forma de existência de um sujeito que é em si mesmo falta. Emerge em nós como percepção profunda de que somos lacuna (ou, na precisa definição de Lacan, de que somos um "aparato lacunar"). Por isso, mais do que oferecer-nos uma flecha, o desejo destapa em nós uma ferida. É uma força que atua por esvaziamento. O desejo desarma-nos primeiro para que possa acontecer o espanto."

José Tolentino Mendonça, in Revista do Expresso, 17 de Junho 2022. 

segunda-feira, 20 de junho de 2022

A Ilha dos Gigantes: às 22h50 na RTP1

Trailler aqui: https://www.youtube.com/watch?v=t2yWSbFoN_c

"Spring Departure" de Rui Machado

 Era o tempo da carne a despertar 
quando a força que havia era o rosto
numa língua que julgávamos prodigiosa
Apesar de termos todo o tempo do mundo
dizíamos que o dia nos faltava sempre 
porque só damos valor ao que temos
já tão perto de perdê-lo. Aqui é a tua casa
aqui a tua dança ressoa. Então os dias 
arrastavam-se e neles tudo surpreendia 
se pouco sabíamos da exatidão das coisas
Mas a luz entretanto escurece num delírio 
tudo escureceu na quietude das horas ilusas
Nem uma réstia de alegria a iluminar a vida há 
nem lugar aonde ir como aprendiz de espumas.

in Grotta #2, 2017, Letras Lavadas. 

"Ordem (IV)" de Manuel Fernando Gonçalves

Os mapas estão abertos 
à superfície da água
Outros silêncios te  animam a pensar:
como parece demorar o tempo.

in Caos, novembro de 1987, Frenesi edições. 

sexta-feira, 17 de junho de 2022

Dar Espectáculo: a Cultura em Portugal no Século XX*

     "Os consumos culturais transferiram-se em grande medida para o espaço doméstico, e este está cada vez mais equipado com tecnologia que disponibiliza as transmissões, desde logo televisivas, a públicos de todos os estratos sociais. O gosto é a marca da diferença perante o escândalo da democratização das imagens e sons. Por isso, as novas identidades foram determinadas pelos hábitos de consumo, que, de alguma forma, tornam culturais todas as dimensões do quotidiano. Tal como o povo camponês do início do século, o suburbano dos discursos do gosto não é uma categoria social, mas uma representação cultural. Do mesmo modo que um mundo rural pôde ser idealizado por intelectuais urbanos por causa da distância - entre a cidade e o campo, as letras e o analfabetismo - , o subúrbio contemporâneo não passa de um referente vazio, sem substância sociológica."

Luís Trindade in "O Século Português", Tinta da China Outubro de 2020.

Merci Jean Louis Trintignant (1930-2022)

Os actores Vittorio Gassman e Jean Louis Trintignant
Fotograma de "Il Sorpasso" de Dino Risi (1962)
 


Verso de Garota Não

Podem dizer para estarmos calados 

quinta-feira, 16 de junho de 2022

"Lúcia e Conceição": A Vida Continua!

Fotograma de "Lúcia e Conceição", Fernando Matos Silva
Aqui: https://arquivos.rtp.pt/conteudos/lucia-e-conceicao/
Fotografia de Carlos Melo 
    Aquela senhora que sorria e que estava sentada à minha frente num café da Ribeira Grande era a Conceição. Não tinha qualquer dúvida. Tirei a folha de sala da altura da sessão escolar, guardada numa mochila que transportava e, aproveitando para mostrar a uma outra pessoa, logo confirmei: o rosto, o olhar, o sorriso, as expressões eram as mesmas da adolescente que enfrentava a câmara do documentário do Fernando Matos Silva. O fotograma daquele documentário  tem 48 anos e as feições do rosto actual de Conceição pouco ou nada mudou. Aproximei-me e ouvi o que esta me contou do seu regresso para o descanso merecido na ilha que a viu nascer. Aqui ficará durante o verão para acompanhar as festas da sua freguesia. Contou-me, assim, que consumou o seu desejo de partir para o Canadá há meio século, que criou família, fez duas casas com o seu marido, que aprendeu línguas, que aprendeu a gostar de lá estar e viver. A vida, essa, continua.

Versos de Arnaldo Antunes

Pois o mar que nos divide 
Pode nos unir também 

segunda-feira, 13 de junho de 2022

"Lisboa Clichê" de Daniel Blaufuks

“Lisboa Clichê”, de Daniel Blaufucks, é um livro de fotografias. Será? Julgo que este é mais do que um livro de fotografias e é, sobretudo, um livro de memórias de quem viveu e vive a bonita cidade de Lisboa. Como se de um diário de viagem se tratasse. Uma viagem no tempo, pois claro. Não que as fotografias não tenham a devida importância, antes pelo contrário, mas sim porque estas fotografias estão carregadas de significado, testemunhos, histórias. Quem viveu os anos 80/90 neste país à beira-mar plantado irá identificar-se com estas fotografias, ao mesmo tempo que pode ler este texto literário possuído de romantismo e de uma nostalgia de um passado que foi e não volta ser.  
    Esta Lisboa de Daniel Blaufucks está carregada de luz e de referências arquitetónicas, artísticas e morais. Por isso, é um livro de toda uma geração que por ali trabalhou, criou ou vadiou em torno de uma cidade bonita e acolhedora. Às vezes, metido até ao tutano e tantas outras apenas a tocar de raspão. Devagarinho, mas sempre cheia de sentimento! 

domingo, 12 de junho de 2022

FLORA

     "É o coletivo utilizado para indicar o mundo vegetal. Na mitologia romana era a deusa da Primavera e das flores, poder que lhe foi dado pelo esposo, Zéfiro. que igualmente lhe concedeu eterna juventude. 
    Os gregos chamavam-lhe Clóris (de Kloros, verde). Figuravam-na como uma bela ninfa, ornada de grinaldas e com um açafate de flores aos pés." 

Orlando Neves, in Dicionário do Nome das Coisas e Outros Epónimos, Notícias Editorial

An Happy Summer in Azores

     "Não voltou John Walkman a dispor de outro feliz verão como esse nos Açores; a morte atalhou-lhe o passo na primavera imediata, numa tarde em que levava à tipografia as provas revistas do seu livro. Nunca pôde, por isso, saber em que medida o nosso olhar que sobre nós lançou."

Urbano Bettencourt in "Algumas das Cidades", Instituto Açoriano de Cultura, Colecção Ínsula.

Um Verso de Jorge Ben Jor

 Eu quero paz e arroz 

Porque hoje é Domingo!

Exposição: Festa.Fúria.Femina.
Obras da Coleção da FLAD
Arquipélago-Centro de Artes Contemporâneas


FAUNO/A

    "Fauno era o deus da fecundidade dos rebanhos e dos campos. O seu nome significava "o que deseja o bem". Era uma das divindades itálicas mais antigas e populares que se identificava com o deus grego Pã. Protegia os bosques, os prados, o gado, sendo o representante da vida nômada e pastoril. Foi Lineu quem, em 1746, utilizando o feminino, deu este nome ao conjunto de espécies animais a um território."

Orlando Neves, in Dicionário do Nome das Coisas e Outros Epónimos, Notícias Editorial. 

segunda-feira, 6 de junho de 2022

"Êxodo" de Pedro da Silveira

 A essa terra que não era a tua 
deste o vigor dos teus braços,
deste o teu suor 
e o teu engenho.

Por essa terra que não era a tua 
deste generosamente o teu sangue.
E deste-lhe, povoador de mundos,
os teus filhos.

Agora, fechados os portos à tua entrada,
já o mar não é caminho aberto de emigrantes,
o mar não é mais a estrada livre dos barcos 
de clandestinos...

O Mar...
(você o disse Jorge Barbosa)
é o hoje a nossa prisão sem grades.
Irmão, deixá-lo...
Nas nossas ilhas erguemos o sonho que te negam 
O nosso mundo.

in Jornal Arauto, 23 de Março de 1964. 

Dia 8, 21h00, no Teatro Faialense

"Entre Ilhas" de Amaya Sumpsi
Sessão do Cineclube do Faial
Trailler aqui:

https://www.youtube.com/watch?v=_O0cDFyBJSI