segunda-feira, 4 de março de 2019

Missiva Pré-Primaveril com Destino a Janeiro Alves no Entrudo Pleno

Caro Janeiro Alves,
Redijo-lhe estas linhas nos debutantes sussurros primaveris de 2019, desejando que o meu amigo se encontre guarnecido das mais promissoras expectativas para o próximo estio, que segundo asseveram as mais altas patentes da meteorologia, será o mais quente de sempre. Quaisquer mangas cavas ou demais refrescos e gelados será sempre pouco para o verão tórrido que se avizinha!
O motivo desta missiva é interrogar-lhe sobre o seu conhecimento de um tal Felício Chanfra. Recebi um convite duma publicação azórico-lusitana de reconhecido gabarito para interrogar este psicoterapeuta dada a sua reputação, trabalho e reconhecimento em terapias psicológicas oportunamente avançadas. Encetei com contumácia as questões necessárias e li mesmo toda a literatura ilustrada sobre a Psicologia Moderna. Até aqui labor intenso e esforçado. O meu amigo Janeiro Alves sabe que sou um brilhante interrogador, possuidor de um estrepitoso charme e assertivo nas minhas convicções hodiernas. Doravante, eis que não saberei o que me irá acontecer. É que quando procurei recolher informações sobre Felício Chanfra no grande motor de busca global, fui confrontado com ausência biográfica, surgiram mesmo algumas frases redondas e referências próprias de uma fragilidade inconfundível, muitas delas poderiam mesmo constar de qualquer mural nas redes sociais. Isto, para não falar de uma hiperealidade abissal. Indaguei assim a razão do sucesso de Felício na lista das personalidades promissoras deste novo século, e nada consegui concluir. Na lista de grandes promessas figuram ainda o irreparável Victor Klaus e o inefável Alberto Ai. Conjecture lá, Janeiro Alves, tamanho descaramento!
Como deve imaginar, não sei o que hei-de fazer para diminuir a ansiedade, desatei por isso a escrever e escutar interrogatórios de forma compulsiva, socorrendo-me apenas da recordação dos momentos de folia quando interroguei Giorgio Delle Mare e Andar Carrasco. Em breve, faço questão de lhe endereçar o resumo, a súmula do depressivo e suculento encontro que irei ter com esse famoso psicoterapeuta retirado do mundo. Segundo me afiançam, convirá também ficar atento aos ligeiros achaques e altivez a que habituou o seu público desde que ganhou o Prémio Sigismundo F, atribuído pela Academia dos Atos Falhados.
Despeço-me no ápice da euforia e no cúmulo da folia sobretudo pelo trabalho que o meu amigo tem vindo a realizar em prol da literatura de cordel, augurando-lhe, desde já, um Feliz Entrudo. Com um até breve na caixa do correio. 
No esplendor máximo da estima e da consideração,

Doutor Mara

A Mesa está Posta de Jorge Silva Melo

“São textos dispersos, textos que escrevi, entrevistas, coisas que disse, cinquenta anos de viver e de andar a pensar e a fazer. É uma escolha, são textos díspares em que água mole foi batendo em pedra sempre dura, mas não está cá tudo, nem pensar, há textos perdidos, outros que ficaram de lado, outros que andam por outras recolhas*. São cinquenta anos insistentes, felizes, teimosos, sempre a defender, ó monotonia!, essa coisa mais linda que é viver entre palavras, palavras de outros, antigos, modernos, tantos. São textos recuperados, corrigidos, revistos, alguns inéditos, tanta coisa sobre Teatro, pois é, foi uma vida.”

Jorge Silva Melo

*Apresentação do livro no dia 7 de Março, no Teatro da Politécnica.