segunda-feira, 6 de abril de 2015

Ver Estranhas Formas a Pensar – sobre a escultura e os desenhos de Agnes Juten

           
Fotografias: (www.agnesjuten.com)
           Agnes Juten  está a expor, desde o dia 20 de Fevereiro até 10 de Abril  (termina esta sexta-feira), esculturas e desenhos na Casa Manuel de Arriaga, na cidade da Horta, Ilha do Faial. São desenhos e esculturas muito recentes, alguns trabalhos realizados para o efeito, intitulados de “Novas Obras”, que a artista elaborou, imaginou e concebeu no seu atelier da rua Visconde de Santana, nº7. Há quase meio século que o seu gesto escultórico se repete, confirmando e renovando o seu percurso de artista visual a partir de objetos que quotidianamente cria, (re) inventa e constrói. Agnes Juten é uma artista plástica, holandesa, radicada na Horta, com um longo percurso e pergaminhos, os quais mais uma vez teremos a oportunidade de apreciar neste conjunto considerável da sua vasta obra.
Numa sala algo minúscula, amontoada de materiais de outras exposições ou objectos, provavelmente à espera de serem usados, ela vai também desenhando, realizando esboços e outras intenções que se concretizarão enquanto combinação de materiais e formatos, ou simplesmente desenhando traços, revelando as figuras e formas de um conjunto de objectos à espera da arte final ou trabalho conceptual. Este trabalho diário de agregar técnicas e moldar objectos faz com que sejam vários os objectos que se disponibilizam às suas mãos, se submetam à sua inventividade, à curiosidade, e ainda ao enorme rigor criativo envolvido da sua parte. Desta relação com os materiais constam essencialmente o ferro, a madeira, o arame, alguns invólucros de produtos, pegões e afins. Agnès ousa assim romper com a normalidade, com o frágil equilíbrio que nos sustenta, daí que cada vez que usa um nome para um objecto, atira-nos com nomes como “Suporte”, “Movimento”, “Deitado”, “Declive”, “Avalanche”, “Pegão” ou outras estruturas sujeitas a limites como “Linha Vermelha” ou mesmo “Ilha”. É dessa forma que arrisca este quebradiço equilíbrio que nos sustenta, permitindo-se mesmo iluminar a escuridão por detrás de si, interrogando os caminhos da arte, do seu tempo, evidenciando num primeiro risco ou traço, um primevo olhar sobre a forma e os objectos, fruto de uma revelação interior.
"Suporte"Agnes Juten (2015)
    Agnes Juten vai, no entanto, deleitando-se com as pequenas narrativas que outros seres fazem acerca destes objectos artísticos depois de usados em exposições, muito embora para si tenham o condão de ser duradouros, dado o apego e pertença que ainda hoje por estes manifesta, tem consciência do carácter efémero e volátil que estes simbolizam para o público espectador. Ironiza, inclusive, com a necessidade alheia de utilizar as suas esculturas para representar qualquer situação ou objecto do mundo real. Agnès Juten sabe que ali está a representação do seu próprio mundo, o seu pensamento, o escultórico gesto que vibra com o desenrolar do tempo e da vida (quase meio século dedicada à escultura e ao desenho). E o que fazer dessa necessidade permanente em “satisfazer” o desafio de criar imagens, representações, significados, sem pensar na utilidade da arte?
     Na verdade, as esculturas de Agnes Juten respiram sobriedade, leveza formal, assentam no pendor criativo e na ilustração dos vários estados de alma que percorrem qualquer ser pensante. São esculturas que dão trabalho ao pensar, à estranheza que convida e cultiva a introspecção, que imploram à interioridade e ao recolhimento.
    Do mesmo modo, os seus desenhos evocam simples gestos, movimentos, cruzamentos, clausura, os nós e os laços que que estabelecemos enquanto o silêncio vai esculpindo a “persona” de que somos feitos. Estamos, portanto, perante uma sensibilidade inquieta, inabitual modo sereno de nos fazer cogitar, essa curiosidade permanente pelos opostos existenciais. Que luzes ou sombras, que caos ou o mundo harmonioso nos sustenta este equilíbrio que julgamos habitar? Dessa hospitaleira resposta aqui fica o convite ao desassossego formal, à estranheza  e, essencialmente, ao prazer de poder ver novamente os seus trabalhos expostos. Inquietemo-nos.

Ontem escrito numa parede da cidade

O meu avó que era pescador dizia:"Em águas calmas tem peixe".