terça-feira, 23 de abril de 2024

Desconfiava que isto iria ser assim...

    "-Sim, é certo, eu desconfiava que isto iria ser assim”. afiançou com toda a pujança. “-Assim, como?”, perguntei. Naquele precioso instante desfilavam na minha memória imagens de pirolitos frescos a escorrer pela garganta, bicicletas exangues encostadas ao musgo das paredes, tardes de praia temperada com barracas de tiras azuis a proteger da nortada, numa frase ouvida e repetida numa eternidade:“-Vem aí os Canhões!”.  Enfim, cinquenta anos passaram sobre o momento histórico e até parece que tudo isto não passa de uma canção que ressoa a liberdade em cada um de nós na hora de voltar à carga. Valha-nos, pois, essa palavra leve e verdadeira com que cunhamos a efeméride. Uma palavra que pretendemos justa, como carne vivificada em nós, uma elevação maior perante o que ainda poderemos fazer no futuro. “É pouco”, diz-me quem já não acredita que se possa ter como lema existencial o archote da esperança! “Talvez”, apaziguo-lhe a raiva e confirmo-lhe a incerteza do tempo sombrio que nos calhou viver. Reafirmo, no entanto, que a mágoa do abandono é grande e não é só desta pessoa em concreto mas também por tudo aquilo que foi amado e que já não volta, e por isso faço questão de relembrar esse gesto inicial que retoma agora à sua fonte principal e, quem sabe, ainda se possa renovar. Acreditemos!

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