sexta-feira, 21 de junho de 2013

Energia e Ética

Sei isto: a minha energia está canalizada
Para a palavra fazer, gosto da ideia de construção
E o que dela existe nos movimentos normais.
Agrada-me a palavra engenharia e o que ela
Representa: não saias de um sítio sem deixares algo
Atrás de ti. Dirijo-me apenas às coisas que me excitam
Positivamente e me levam a fazer outras coisas, dirijo-me
Às pessoas de que gosto, nunca às de que não gosto;
Sempre me pareceu insensato que se pare,
Nem que por um momento, de admirar, há
Sempre actos e coisas que nos ajudam
neste cálculo infernal da distância entre o dia de hoje
e a nossa própria morte. E qualquer pessoa dar um passo que seja
em direcção ao que não aprecia, para insultar, derrubar,
parece-me uma brutal perda de tempo, uma falha grave
no órgão de admirar o mundo
(deves combater uma combater uma ou duas vezes na vida,
se combateres duzentas vezes
é porque os combates são fracos)
Não sei pois como viver. O que li e vi
serve-me apenas para ser mais lúcido, não
Para ser melhor pessoa. Adquiri esta regra (ou nasci com ela)
-e é talvez uma moral-
mover-me apenas em direcção ao que gosto
se o prédio alto, escuro, feio
me impede de ver o sol, não fico a insultá-lo, não
moverei um dedo para o deitar abaixo:
contorno sim os edíficios necessários
até chegar ao espaço de onde possa receber aquilo que
quero. Se chegar lá de noite, montarei acampamento.



Gonçalo M. Tavares, Livro 1, Relógio de Água 2004

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