segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Pública Poesia

                      "E portanto
                    antes que decidas trocar o silêncio
                         por novas tapeçarias – procura o
                         amor por entre o ritmo das folhas
                                                                 lá fora."



Ilustração de Pedro Valim
Leonardo Sousa
            
             Ler poesia é um acto que comporta alguma seriedade e justeza. Num primeiro plano é uma tarefa rodeada de alguma exposição e uso pessoal dos textos de outros, já que são poucos os que lêem a sua própria poesia, podendo e devendo  ser esta uma fonte de valorização e enriquecimento da palavra em verso ou não, nem sempre aceite ou compreendida pelos arredados das letras. Há, portanto, nestes  momentos de leitura de poemas em público em que a poesia pode sair a ganhar mas também é certo que muitas vezes corremos o risco de banalizá-la caso esta seja desvirtuada dos procedimentos com que foi realizada.
            É justo pensar que cada poema tem a sua organicidade, isto é, o seu próprio funcionamento interno. Não há aqui nada contra a leitura espontânea (o autor deste texto já a concebeu muitas vezes, evidentemente) de poemas junto do público. A não ser que quem o diga seja também o autor dos próprios poemas que se encontra a dizer. Quando se lê  poemas de  outros poetas penso que devemos tentar saber tudo sobre os autores em questão e o período em que estes foram escritos. Conhecer-lhe os modos e o tempo entre quem  escreveu os seus poemas e o tempo actual, descobrir-lhe os gestos possíveis ou imaginários, cruzar referências ou perceber os seus tempos, ingressar a fundo nos temas se os houver, e, a partir daí, encarnar um tom num conjunto de possíveis, essencialmente, experienciar individualmente os poemas antes de poder proferi-los publicamente. Um poema deve, sobretudo, funcionar para quem lê, trabalhá-lo enquanto ritmo, tempo e acentuação e só depois apresentá-lo aos ouvintes. Por isso, é importante mostrá-lo a alguém, sobretudo alguém atento que possa ser perspicaz na crítica da forma e do dizer, na exigência constante de uma boa leitura. Há, certamente, neste mundo da poesia, muito boa gente convencida que diz muito bem a poesia dos outros em público. Mas também não mentiria se dissesse que por vezes são raros os que, no meu entender, ganham novos ouvintes para a poesia e concedem aos escritores e poetas mais algum tempo de existência.

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