A FACA (Festa de
Antropologia Cinema e Arte) abriu portas ontem, dia 16, no Centro de Actividades Culturais do Nordeste, na Ilha de São Miguel
e irá até ao dia 20 de Fevereiro. O certame abriu com a sala cheia do edifício
inaugurado pela Câmara Municipal do Nordeste a 30 de Novembro de 1997 e andará
espalhado por vários locais da Ilha (Rabo de Peixe, Ponta
Delgada, Maia e Sete Cidades) nos próximos três dias. Um iniciativa de cinema e
arte associada à disciplina dedicada à Antropologia Visual, promovida pelo
CRIA-Centro em Rede de Investigação em Antropologia, sediada em Lisboa, e que
se foi assim entendendo ao arquipélago dos Açores. Deste modo, abre caminho
para uma maior divulgação e implantação nas ilhas açorianas contando a ilha de
São Miguel com a colaboração da AJECTA (Agência para a Coesão Territorial) e
do Museu Carlos Machado, parcerias que desta feita promovem e alargam a mostra a novos
filmes e temáticas insulares, como são os casos de "Pão", de André
Laranjinha e "Xailes Negros", de Zeca Medeiros.
Sendo assim, os alunos
da Escola Secundária do Nordeste puderam assistir em primeiro lugar a
“Inoperável”, de Carolina Val-do-Rio, filme em formato muito curto sob a forma de manifesto
relacionado com a operacionalidade do corpo na sua existência indefinível e
respectivas representações sociais que cada cultura impõe, nem sempre fáceis
de aceitar. Seguiu-se o filme "Wawata Topu", incursão de David
Palazón e Enrique Alonso pelas "mulheres sereias timorenses", uma
curiosa e atribulada viagem pelas pescadoras que vivem em Belois, na ilha de
Timor Leste, dedicando-se estas, conjuntamente com os seus maridos e filhos, à
luta pela sobrevivência e demais estratégias de como existir em meio hostil,
permitindo este documentário atender à simples respiração de como os lugares
nos condicionam e moldam a nossa humanidade e existência. A simples necessidade
de troca dos peixes pescados por outros alimentos, essencialmente por arroz e café, bens essenciais à sobrevivência no mercado local,
originam por isso uma luta quotidiana com a natureza de forma feroz e contínua.
Por último, esta
pequena mostra terminou com um filme deveras inspirador sobre esse alimento do
dia-a-dia e que tem, sem dúvida, uma importância primordial na nossa
existência: o pão. Sem carácter
narrativo ou referencial, aborda todos os percursos que vai desde a semente ao
forno, sobretudo todo o percurso até chegar às mesas, preocupado que está desde
o início com a situação da chegada dos cereais – excelente plano inicial dos
cargueiros que entram e fazem a descarga de cereais no porto de Ponta Delgada
dirigidos à Moaçor, interrogando assim as razões que o tempo presente
modificou, destinados que estamos a aceitar o momento em que estamos a viver,
ignorando a possibilidade de uma catástrofe ou cataclismo. André Laranjinha
realizou um filme em que arrisca tudo através da via do silêncio e da poesia, são poucos os depoimentos, não dá pistas sobre os intervenientes e
lugares, sendo que é através das imagens de forma poética que nos introduz
naquele universo, permitindo que observemos e contemplemos as suas linhas de
orientação na consumação deste propósito. “Pão” é um belíssimo filme, elaborado
sob diferentes camadas e sucessivos ingredientes até percebermos de forma
clarividente o conteúdo e o miolo dos processos inerentes à chegada deste
precioso alimento à mesa das nossas refeições ou casas. É bem provável
que seja necessária uma padaria por perto após o visionamento deste filme tão
sugestivo.
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