quinta-feira, 13 de julho de 2017

A Mulher de Muitas Caras

Do sítio: www.garboForever.com
"Um velho preconceito condiciona, muitas vezes, o olhar dos espectadores de cinema sobre os filmes mais “antigos”. Por acção de uma cultura televisiva que tende a produzir ironia sobre qualquer manifestação artística a que não seja possível colar o rótulo de “actualidade”, tudo o que no remeta para épocas mais ou menos distantes é encarado como pitoresco, anedótico e, no limite, irrelevante.
O trabalho dos atores, por exemplo. De facto, não é verdade que o cinema mudo tenha sido habitado apenas por actores peritos em esgares mais ou menos histriónicos. Em primeiro lugar, a evolução da comédia até à eclosão do som, em finais da década de 1920, está longe de ser coisa banal ou desprezível; depois, os atores transfigurando desde os primeiros filmes que “reproduziram” a cena teatral até aos que, a pouco e pouco, souberam diversificar as escalas das imagens e enriquecer específico da montagem.
Nesse contexto, Greta Garbo (1905-1990) é um prodígio de versatilidade, subtileza e intensidade dramática. E não apenas porque passou, incólume, do mudo para o sonoro. Também porque toda a sua evolução revela um labor alicerçado na certeza d que a câmara de filmar, longe de ser um mero objecto de registo, é uma “coisa” que refaz as coordenadas do espaço e tempo, obrigando o actor/actriz a uma sofisticada arte corporal."


João Lopes, in “Açoriano Oriental” 13 de Julho de 2017

quarta-feira, 12 de julho de 2017

A Terra dos Homens

            “A terra ensina-nos muito mais sobre nós do que todos os livros. Porque nos resiste. O homem descobre-se quando se mede com o obstáculo. No entanto, para o atingir, necessita de uma ferramenta. Precisa de uma plaina ou de uma charrua. Na sua lavra, o camponês vai, pouco a pouco, arrancando alguns segredos à natureza, extraindo uma verdade que é universal.”
                                     in Terra dos Homens, Antoine Saint-Exupéry, edição Relógio d`Água (pág 11)

terça-feira, 11 de julho de 2017

Se eu Vivesse Tu Morrias no Teatro Micaelense

nós gostávamos que vocês
não nos lessem
ao mesmo tempo
que fazemos
gostávamos que vocês
em vez de nos lerem
ao mesmo tempo que fazemos
nos lessem
antes de fazermos
nós damos um tempo
para vocês lerem
e depois fazemos
e assim, por um lado, podem ler sem renunciar
a verem-nos fazer o que leram
e por outro lado
e isto é o mais importante
vocês sabem o que vamos fazer
É certo que podem preferir não saber
o que vamos fazer
e isso é perfeitamente compreensível
lerem previamente o que vamos fazer é como
se deixassem de estar aqui pela primeira vez
é perfeitamente compreensível que vocês
queiram ter a ilusão de que estão aqui pela primeira vez
sem saber o que vem
e ao que vêm.

mas para nós é importante
que saibam o que vamos fazer
é que se eu vivesse
(faz gesto com as mãos abrangendo todos)
tu morrias.

de Miguel Castro Caldas, sábado, dia 15 de Julho, 21h30, palco do Teatro Micaelense (Espectáculo integrado na 7ª Edição do Walk and Talk

Quando Foi que nos Sentimos Felizes?

“O que se transmitia assim, de geração em geração, com o lento progresso de um crescimento de árvore, era a vida mas era também a consciência. Que misteriosa ascensão! Surgidos de uma lava em fusão, de uma massa estelar, de uma célula viva miraculosamente germinada, vamos, pouco a pouco elevando-nos ao ponto de escrevermos cantatas e de calcularmos vias lácteas.
          A mãe não se limita a transmitir a vida: tinha ensinado aos filhos uma linguagem, tinha-lhes confiado a bagagem tão lentamente acumulada no decorrer dos séculos, o património espiritual que ela mesmo recebera como herança: esse pequeno lote de tradições, de conceitos e de mitos que constitui toda a diferença que separa Newton ou Shakespeare do bruto das cavernas.
        O que sentimos quando temos fome, aquela fome que impelia os soldados de Espanha, sob a chuva das balas, para a lição de Botânica, que impelia Mermoz para o Atlântico Sul, que impelia outro para o seu poema, é que a génese ainda não está concluída e porque nos falta tomar consciência de nós mesmo e do universo. Precisamos de lançar pontes na noite. Só ignora isto quem pensa que a sabedoria se estriba numa indiferença que julga ser egoísta; contudo, tudo desmente essa sabedoria! Companheiros, meus companheiros, tomo-vos como testemunha: quando foi que nos sentimos felizes?”
in Terra dos Homens, Antoine Saint-Exupéry, edição Relógio d`Água, (pág 140)

Um Verso de Konstandinos Kavafis

Quando de repente, à hora da meia-noite, se ouvir

Ontem, escrito numa parede da cidade

Não fazes um filho para andar toda a vida com ele ao colo.

sábado, 8 de julho de 2017

Alvo Périplo na Edição do Walk and Talk de 2017



Estamos já a preparar a montagem da Exposição e a impressão das fotografias, pois o Largo do Colégio espera por nós, dia 22, ao cair da tardinha. Ao mesmo tempo e, como gostaríamos de envolver a comunidade no processo, preparamos uma Performance Teatral com música própria para o evento pelo João Luís Macedo.
A exposição contará com vinte fotografias a preto e branco de Jorge Kol e a performance, muito embora, tenha um núcleo de actores participantes, membros da peça teatral "Sala de Embarque", está aberta à colaboração daqueles que quiserem dar o seu contributo.  
Este grupo de actores e, demais membros da comunidade, terão como intuito celebrar a vida na rua. A vida das casas e labores que provém das antigas profissões. Convocados estão também a maratona grega, os pastores da Terceira, os Cesteiros da Madeira e uma "roqueira" de São Miguel. Será que isto serve para exaltar a vida ao ar livre?
 A responsável pelo desenho gráfico é, mais uma vez, a Júlia Garcia. 

quinta-feira, 6 de julho de 2017

Escrito no passado Outono

amar é tão difícil falar de amor.
soletramos plantas que não dão flor esta estação
pelo caminho pisamos as folhas que nos deixaram 
                                                                        nuas
                                       as árvores caídas no chão.

Tiago Rodrigues

quarta-feira, 5 de julho de 2017

A Génese de "Alvo Périplo Rua Abaixo Movimentado"

Design Júlia Garcia

            
      Na génese está a solicitação de um texto e uma conversa implícita sobre as fotografias em questão. A descoberta da semelhança entre os Pastores da ilha Terceira e os Carreiros do Monte da ilha da Madeira esteve na origem destas imagens. Estes corpos vestidos de branco encerram no seu trajar, na sua correria, memória de tempos passados, metáfora da vida que corre, que pela corda atam, enrolam e desenrolam, para manobrar ou simplesmente deixar correr e fazer correr.
         As fotografias de Jorge Kol apresentam-se assim com o movimento e a genica de homens que correm no desempenho de funções ao ar livre, alvos corpos com chapéu rua abaixo, vestes e postura semelhantes em ilhas diferentes: Madeira e Terceira. Dessa alva exaltação o fotógrafo dá conta, fixa esta gente que trabalha e vive na rua, manifesto de um tempo que continuará a existir. 
       Assim, a função do texto impunha uma vivência em que a rua fosse cerne e interrogação.