"O Amarcord é uma
reflexão sobre a incapacidade de
observarmos criticamente o nosso passado fascista, um passado que recusamos,
mas do qual nunca nos poderíamos separar: o que faz parte do passado de cada um
de nós forma inalteravelmente uma parte íntima de si próprio. Por isso o
Amarcord é mais um exame do presente do que uma nostalgia. Na realidade, quando
foi estreado o Satyricon, muitos viram o filme como um comentário sobre o Maio
de 68. Creio que filmes como Casanova ou O Navio podem ser interpretados como
reflexos de uma certa actualidade, como o jornal da noite. (...) Muitas vezes
simplifiquei o sentido cabalístico da palavra amarcord, dizendo que é um termo romagnolo e que significa
"Lembro-me". Mas não é bem verdade. Penso que a ideia original me
ocorreu depois de ter lido qualquer coisa sobre o sueco defensor do aborto
Hammercord, e que a sonoridade do seu nome o ponto de partida. Se se juntarem
as palavras amare (amar), cuore (coração), ricordare (lembrar) e amaro (amargo)
obtém-se Amarcord." Federico Fellini -"Sou Um Grande Mentiroso
- Uma Conversa com Damian Pettigrew",Tradução
de Miguel Serras Pereira, Fim de Século, 2008.