segunda-feira, 21 de março de 2016

A Música Omnipresente do Terceiro Tremor

"Paus" no Coliseu Micaelense - Fotografia de Joana Camilo
“Estás em todas” foi a expressão mais ouvida durante o dia de sábado, o "prato principal" desta terceira edição do Tremor. E, como de facto, não se podia estar mesmo em todas – foram quarenta concertos de quinze em quinze minutos – fez-se os (im)possíveis para percorrer os vários lugares por onde esta maratona musical teve lugar.
A festa da música começou com uma curta audição de Luís Senra na Biblioteca da Escola Secundária Antero de Quental, onde decorreu o Mini-Tremor, com muita pequenada presente entretida com os sons do saxofone e os desenhos de Yves Decoster. O momento musical convidava no entanto a partir para outras paragens sem antes apreciar a obra de Tomás de Borba Vieira, presente na escadaria da respectiva escola. À chegada à Rua d´Agoa 50, o ambiente começava a aquecer com os “Rapeciâz”, os músicos encontravam-se no local e convidaram o público a entrar para a respectiva sala, cumprindo assim de forma improvisada, dissonante e, por vezes, harmónica, os preparos sonoros desta actuação. A pulcritude daquela casa e o concerto do trio (acompanhados pelo “performer” João Malaquias) proporcionaram uma viagem criativa e planante. Com regresso marcado ao planeta terra, lá fomos à galeria Fonseca e Macedo, apreciar e sentir os noruegueses “Sturle Dagsland” que, para além de uma performance intensa e evocativa das florestas do norte da Europa, demonstraram um apetite voraz pelos kiwis locais. Depois, partida para o auditório Luís de Camões para ouvir os “Kobayan”, agrupamento possuidor de uma segurança e tranquilidade em palco, aquecendo o público que se ia acumulando pelos diferentes abalos musicais espalhados pela cidade. O dia estava quente, pré-primaveril, e as ruas de Ponta Delgada enchiam-se de gente com pessoas a acumularem-se na recepção do Louvre Michaelense, descobrindo assim a área do primeiro andar e assim escutar a “Sara Fontán”, uma virtuosa do violino em pleno devaneio intimo e auspicioso pelo mundo das bandas sonoras para filmes reais ou inexistentes. Um pouco mais acima, na Rua de Pedro Homem, a Galeria/Editora Miolo esperava por nós para assistirmos aos “Diários Visuais” do fotógrafo António Júlio Duarte, pequenos registos livres de um festival que se realiza por entre vacas a pastar, piscinas termais e a imponência do verde.
Entretanto, o Solar da Graça encontrava-se deliciado a ouvir Julianna Barwick, com a madeira a servir de suporte e vibração numa convocação de música etérea e sombria. Apertados com a escassez do tempo, nova partida para a Igreja do Colégio, pois era lá que se encontrava em cena o “Filho da Mãe”, um guitarrista exímio e merecedor de um espaço e assistência a condizer, motivado com a solenidade devida daquele lugar. Sem dúvida, um momento propício para escutarmos os temas deste autor seguidor da tradição musical portuguesa, ainda que, com variações e sonoridade nas cordas muito próximas da kora africana. Foi, sem dúvida, um momento especial deste Tremor, não descurando a contemplação e a beleza da igreja.
A noite musical abriu com uma passagem pelo som dos “HHY and Macumbas” que subiram ao palco do Ateneu Comercial, num concerto de música bem animada e recheada de salero. Alguns metros à frente, novamente no bonito Solar da Graça, o rock soou muito alto com os decibéis no máximo, pois estavam em palco os canadianos Black Mountain”. Seguir-se-ia os “Bitichin Bajas e Bonnie Prince Billy”, no Auditório Camões, um concerto a abarrotar de gente, ainda que se desconfie que deveria ter sido noutra ocasião o momento para escutar este narrador contemporâneo e a sua desmesurada melancolia. “Keep on Keeping on” debitava o cantor ao público que resistiu até ao final, e assim se prosseguiu em romaria, apaziguados e sedentos de mais música.
Por último, uma passagem pela Tascà onde se encontrava o Dj Fábio "Quesadilla", animador que virou o Tremor do avesso, jorrando danças e folias para dentro daquela antiga taberna, permitindo apenas um derradeiro fulgor no Coliseu Micaelense. Na sala de espectáculos mais antiga do arquipélago, esperava-nos os divertidos e festivos, “Capitão Fausto”, mas viria a ser a banda "Paus", o que de melhor se viu e ouviu durante a noite. Aquelas duas baterias, sintetizador e guitarra, num cenário tribal e de bruma, levaram ao delírio a assistência presente e, aquilo que viria a seguir, já só serviu para cumprir o programa anunciado, o que, voltando à expressão inicial, seria de todo impossível ir a todas, ainda que houvesse vontade. Passada a festa e o abalo musical e, sabendo agora que já estamos todos a ressacar, o que não é bom sinal, conviria deste modo agradecer à organização e esperar que estas réplicas musicais se repetissem com mais frequência e se pudessem estender durante o ano inteiro.