domingo, 29 de maio de 2016

3ª Sessão na Galeria Miolo

Cartaz de Victor Marques

Luz da Tarde

Tânia Santos (Loch Ness, Escócia, 2016)

Resposta a Janeiro Alves no Maduríssimo Maio

Apreciei abundantemente a ligeireza e a desfaçatez da sua carta, amigo Janeiro. Começo, de facto, a ficar deveras preocupado com a sua falta de maneiras e inexistência de delicadeza da sua parte. Serão, porventura, esses solilóquios junto da natureza e da árvore de pinho que o fazem retroceder a essa força vital e primitiva de outros tempos? Velhos, sim, foram os tempos em que o amigo Janeiro se dirigia à minha pessoa com respeito e reverência. Um verdadeiro gentleman na arte de congratular-se pelas bolas para o pinhal que tantas vezes lhe ofertei em anteriores missivas. O que é que se passa consigo, meu bom amigo? Será a febre dos fenos e seus respectivos esbirros e espirros?
A verdade é que eu já desconfiava que o nome de “Janeiro Alves” pudesse estar por detrás do enredo e consequente desaparecimento de mais uma obra prima de Miriam Manaia.  O que eu não sabia é que por esse motivo o amigo Janeiro aproveitasse para viajar até à Rússia e apanhasse uma valente bruega de vodka na bonita estação de Moscovo. Dizem, amigos comuns, pertencentes à União dos Amigos de Eisenstein, que só faltou trautear Alfredo Marceneiro e o “Playback”, de Carlos Paião, dado o fervor pátrio em que o nosso amigo estava imbuído. E, por fim, ainda lamentou a nossa trágica sorte pela perda das antigas colónias e os filhos e filhas que lá deixamos num manto de saudade irreparável. Que triste, Janeiro Alves. O meu amigo talvez ainda não saiba, mas tive uma fase da minha vida em que, também eu, chorava baba e ranho quando me traziam uma garrafa de “groguinho” da Ilha de Santo Antão.
Deixe-me dizer-lhe que sim, é verdade. Estou mal, muito mal, amigo Janeiro, pois sofro de uma patologia para o qual soube há instantes não haver cura mas apenas uma terapêutica preventiva. Padeço, portanto, de papiromania…um vício ignominioso e obsessivo por papéis. A enfermidade é tal que me faz engoli-los ou devorá-los consoante o momento em que os vejo ou encontro. Acordo sobrevoado de papéis, deito-me com papéis e bebo a pensar ficar rodeado por estes que acabo a julgar que, também eu, estou mergulhado até ao tutano nos célebres papéis do Panamá. Nada a fazer, penso. Muito embora, a psiquiatra, a Doutora Alice Campos Ferreira, me aconselhasse uma terapêutica de substituição: abrir uma conta no Livro das Caras ou realizar diariamente três quilómetros de caminhadas junto do mar!
            Por último, espero que Janeiro Alves se encontre bem aí para os lados de Belém. Coma, portanto, um pastel de nata para diminuir a azia, o que certamente lhe fará bem às próximas missivas a enviar e ajudará nas competências sociais a desempenhar.  
Com um grande abraço de amizade,

Doutor Mara