domingo, 12 de janeiro de 2020

Ver Cinema a Norte


Tempo de interioridade, estação do frio e do recolhimento, espaço de encontro com as artes visuais. Cineclubismo em alta, condições renovadas e aprimoradas da sala do Cineteatro Garret – Póvoa de Varzim - para desfrutar da sétima arte, partilha e pluralidade de visões do mundo bem como diferentes cinematografias. A começar, o filme “Parasitas”, de Bong Joon-Ho, uma película aclamada com a Palma de Ouro no último Festival de Cannes, reconhecida com as melhores críticas da especialidade. Um filme que mistura diferentes géneros, ao mesmo tempo que centra a sua ação no interior de uma casa arquitetonicamente preparada para o efeito e no confronto “classista” entre duas famílias. Repleto de humor, imaginação e ironia sobre o “elevador social” coreano, “Parasitas” é um filme que agarra o espectador, provocando emoções díspares sobre o comportamento humano em diferentes situações. Chega a ser confrangedor e motivo de vergonha alheia o momento em que, aproveitando-se a ausência dos proprietários da casa, a família de vigaristas se reúne para celebrar o golpe e desvendar as motivações rasteiras que estiveram na origem daquele ajuntamento.
Ali mesmo ao lado, na segunda maior cidade deste pequeno país, onde já se viveram outras histórias e memórias, relembre-se que o Cinema Trindade, no Porto, é sala com mais de um século, continue, por isso, com nova dinâmica, atrai agora um leque alargado de amantes do cinema, sendo já novo pólo de encontro e curiosos interessados nos diferentes géneros da sétima arte. A quarta vida renascida deste espaço deve-se a Américo Santos, fundador da Nitrato Filmes, empenhado que está em dar cinema quatro vezes por semana aos portuenses e seus visitantes. O primeiro filme a ser visto foi “Rapariga Fácil”, de Rebeca Zlotowski, um drama em jeito de comédia, procurando nesse cenário estival, Cannes, sul de França, a leveza e diversão em tornos desses anos voluptuosos e sensoriais do período juvenil. A câmara acompanha duas jovens Naima e Sofia em plenas férias, as noites quentes de verão, o glamour e a luxúria das marinas. No final, a sabedoria pertence obviamente a Sofia. Surpreendente é o filme “Clara e Claire”, de Safy Nebbou, numa adaptação do romance de Camille Laurens. Uma película densa que, apesar do tom palavroso ou mesmo de grande pendor descritivo, recupera o gosto pela celebração da arte da representação, a diversidade das emoções humanas e das expressões faciais, denotando também um especial gosto pela duplicidade e exploração da “persona”, aqui expresso na personagem interpretada pela actriz multifacetada – Juliette Binoche. A actriz francesa interpreta aqui Claire, uma professora universitária, de meia idade, recém-divorciada, que inventa um perfil no Facebook, vivendo assim uma outra vida, jogando aí outra existência, virtual e arriscada.Um filme que é, per si, uma belíssima homenagem à actriz francesa, que nos continua a seduzir e agarrar  desde o princípio até ao final da narrativa, por sinal, muito bem engendrada.