Tempo de interioridade, estação do frio e do
recolhimento, espaço de encontro com as artes visuais. Cineclubismo em alta,
condições renovadas e aprimoradas da sala do Cineteatro Garret – Póvoa de
Varzim - para desfrutar da sétima arte, partilha e pluralidade de visões do
mundo bem como diferentes cinematografias. A começar, o filme “Parasitas”, de
Bong Joon-Ho, uma película aclamada com a Palma de Ouro no último Festival de
Cannes, reconhecida com as melhores críticas da especialidade. Um filme que
mistura diferentes géneros, ao mesmo tempo que centra a sua ação no interior de
uma casa arquitetonicamente preparada para o efeito e no confronto “classista”
entre duas famílias. Repleto de humor, imaginação e ironia sobre o “elevador
social” coreano, “Parasitas” é um filme que agarra o espectador, provocando emoções díspares sobre o comportamento humano em diferentes situações. Chega a ser confrangedor e motivo de vergonha alheia o momento em que, aproveitando-se a ausência dos proprietários da casa, a família de vigaristas se reúne para celebrar o golpe e
desvendar as motivações rasteiras que estiveram na origem daquele ajuntamento.
Ali mesmo ao lado, na segunda maior cidade deste
pequeno país, onde já se viveram outras histórias e memórias, relembre-se que o
Cinema Trindade, no Porto, é sala com mais de um século, continue, por isso, com
nova dinâmica, atrai agora um leque alargado de amantes do cinema, sendo já novo pólo de
encontro e curiosos interessados nos diferentes géneros da sétima arte. A quarta vida renascida deste espaço deve-se
a Américo Santos, fundador da Nitrato Filmes, empenhado que está em dar cinema
quatro vezes por semana aos portuenses e seus visitantes. O primeiro filme a ser visto foi
“Rapariga Fácil”, de Rebeca Zlotowski, um drama em jeito de comédia, procurando
nesse cenário estival, Cannes, sul de França, a leveza e diversão em tornos desses anos voluptuosos e sensoriais do período juvenil. A
câmara acompanha duas jovens Naima e Sofia em plenas férias, as noites quentes
de verão, o glamour e a luxúria das marinas. No final, a sabedoria pertence obviamente a Sofia. Surpreendente é o filme “Clara e
Claire”, de Safy Nebbou, numa adaptação do romance de Camille Laurens. Uma
película densa que, apesar do tom palavroso ou mesmo de grande pendor
descritivo, recupera o gosto pela celebração da arte da representação, a diversidade das emoções humanas e das expressões
faciais, denotando também um especial gosto pela duplicidade e exploração da
“persona”, aqui expresso na personagem interpretada pela actriz multifacetada –
Juliette Binoche. A actriz francesa interpreta aqui Claire, uma professora
universitária, de meia idade, recém-divorciada, que inventa um perfil no
Facebook, vivendo assim uma outra vida, jogando aí outra existência, virtual
e arriscada.Um filme que é, per si, uma belíssima homenagem à actriz francesa,
que nos continua a seduzir e agarrar desde o princípio até ao final da narrativa, por sinal, muito bem engendrada.