segunda-feira, 5 de fevereiro de 2024

Afinal o que importa...

 Aos jovens é frequentemente dito que são uma geração desprovida de cultura. Não há nada mais errado. Nunca existiu uma geração sem cultura e, se alguma assim houvesse, não seria certamente a de quem é jovem nos dias de hoje. Aquilo que há é portas por abrir e pontes por construir. Existem de facto muitos jovens que são alheios a aspectos da cultura que as gerações mais velhas consideram fundamentais tal como existem cada vez mais pessoas envelhecidas que não compreendem nem se relacionam com a cultura dos jovens. A equação funciona para os dois lados e nenhum tem maior culpa. Simplesmente é como é. A vertigem de um mundo digitalizado vai fazendo com que, mais do que nunca, se rompam laços entre quem fica de dentro e que fica de fora, quem vai à frente e quem fica para trás.
No fundo, o que importa é nunca parar de lançar sementes à terra. Aproximar e misturar culturas e promover a permeabilidade da nossa superfície social. Não negar a ninguém o direito à autorrepresentação, mas também não esconder que seria bom que mais pessoas tivessem a capacidade de ler com sentido crítico e ouvir com uma escuta atenta. Todos temos cultura, sim, mas melhor do que isso é sair de casa e ser participante activo na vida cultural de uma comunidade. Todo temos cultura, sim, mas ninguém tem em quantidades tais que se possa dar por satisfeito e fechar portas ao mundo. 
Não liguemos ao que dizem os “mental coaches”. Ter uma zona de conforto não só é óptimo como é fundamental. Há que encontrar e estimar aquilo que nos faz sentir em segurança. Só assim podemos ter alento para experimentar o que está do lado de fora e percorrer os caminhos da inquietação e curiosidade. E, quando esse momento chegar, saibamos abrir as portas e sair por elas.

Martim Sousa Tavares, in Brotéria, Maio/Junho 2023.