segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

A Pé por PDL

            Quando o Inverno se instala, só é possível chegar a São Miguel de avião. Depois, começamos facilmente a percorrer as ruas de Ponta Delgada pelos próprios meios, usando os pés à velocidade do tempo que mais nos aprouver. É impossível passear por terra micaelense sem visitar o jardim António Borges e, se conseguirmos visitá-lo com uma visita guiada tanto melhor. Foi isso que aconteceu com a disponibilidade do funcionário Paulino, que teve o condão, a gentileza de mostrar árvore a árvore, recanto a recanto, tendo começado logo por apresentar o criador e desenhador daquele espaço - o paisagista, António Borges, erigido em busto à entrada, apercebendo-nos de imediato desse seu entusiasmo em reunir diversas espécies em cerca de 2,5 hectares, mesmo no centro da cidade insular. De imediato, a atenção foca-se numa “Phicus Macrophyla”- normalmente apelidada por Figueira Australiana, ostentando várias raízes externas como se fossem rugas salientes a marcar a passagem do tempo e da velhice. O Jardim António Borges é a imagem de marca do romantismo pitoresco do séc. XIX, tendo sido concretizado entre 1858 e 1861, passando para o domínio público na segunda metade do séc. XX, mais concretamente a 11 de Setembro de 1957. O responsável pela introdução deste riquíssimo e vasto património arbóreo, verdadeiro amante de botânica, dedicou uma boa parte da sua vida à preservação destas espécies, exóticas na ilha. Todo o espaço do jardim é um encantado passeio pela diversidade e variedade, onde podemos encontrar a Palmeira das Canárias, a Araucária Colunária, o Eucalipto-Limão, Jacarandá, Maciço de Bambu, etc.
          Depois de visitarmos aquela floresta encantada, e, continuando o percurso pedonal em redor da cidade insular, é agora tempo de visitar o Coliseu Micaelense, representante centenário da monumentalidade da época em que foi erigido, contém também um pólo museológico, possibilitando assim o acesso ao seu acervo histórico que data de 1912. Actualmente acolhe peças teatrais e concertos musicais, sendo a maior sala de espetáculos do arquipélago açoriano. Segue-se o périplo em direcção ao Teatro Micaelense, espaço destacado da vida social e cultural da urbe insular, com a apresentação pública em 1951, obtendo um projecto de requalificação no ano de 2004. Outro lugar de interesse histórico, desta feita de cariz religioso, é a sinagoga "Sahar Hassamain”, recentemente aberta ao público, após tantos anos encerrada. Trata-se da mais antiga sinagoga portuguesa, situada na rua do Brum, nº16, a sua recuperação tem sido feita de forma gradual e consistente, no sentido de manter no seu interior os traços, os sinais e as memórias da passagem da cultura hebraica pelas ilhas. De seguida, ainda antes que a noite caia, é necessário frequentar a Galeria Fonseca e Macedo, criada no ano de 2000 e com o propósito de servir a arte contemporânea. Neste momento, a galeria pede-nos para convocar o olhar no caleidoscópio de imagens/pinturas de Miguel Branco, um autor fascinado com a paisagem e fauna das ilhas, evidenciando a sua atenção e sensibilidade para uma síntese de pequenos quadros intitulados de “Ínsula”.
          Por último, para terminar este calcorrear escorreito pelas artérias da cidade, conviria visitar a rua de Pedro Homem e a galeria…Miolo. É um novo ponto de paragem e observação na rua de Pedro Homem, no centro histórico de Ponta Delgada. Segundo reza a história, Pedro Homem foi escrivão do Ouvidor do rei D. João III, viveu e morreu por ali, caracterizando-se por possuir capacete ou adaga e terá sido o introdutor de várias aves - falcões, cisnes e milhafres - na Ilha de São Miguel. A nova galeria que passa agora a existir no número 45 desta rua pretende ser, cinco séculos depois, mais um ex-libris de forte atracção e interesse, não só histórico, mas também cultural e turístico. E porquê? É que nesta rua já existe o restaurante vegetariano “Rotas”, o "Hostel The Nook", o Bed and Breakfast “By Lapsa” e, para além de tudo isto, há também um cabeleireiro, um dentista e uma farmácia na esquina.

Um pelo Menos

"Acredito no que faço, e que nos cabe honrar o que fazemos. É uma luta diária, antes de mais contra a facilidade, e se cada um não acreditar não sei por que os outros hão de acreditar. No caso das crónicas, será também, muitas vezes, uma forma de intervenção no colectivo. Não escrevemos para ter muitos leitores, mas acredito  em escrever para (e talvez por) um, pelo menos."

Alexandra Lucas Coelho, in Público, 24 de Janeiro de 2015.