"Isabel Lucas: Os
Cus de Judas é
publicado logo depois de Memória de Elefante. Pela primeira vez aprofunda o
tema da guerra.
António Lobo Antunes: É difícil falar de guerra. Não sei se a guerra era tanto o tema quanto o
espanto daquele rapaz que teve uma infância agradável. Os meus pais não eram
ricos, não havia semanadas; se queríamos dinheiro, tínhamos de o ganhar. O meu
pai ganhava pouco. Era o desespero da minha mãe, porque ia para o consultório
e, em vez de levar dinheiro aos doentes, levava-os para casa. Não era capaz de
levar dinheiro às pessoas porque estavam doentes. E nós éramos seis filhos.
Tínhamos uma casa grande que o meu avô, pai do meu pai, tinha comprado. Ele era
rico. Chamava-se António Lobo Antunes e eu adorava-o. Quando soube que eu
escrevia, tinha eu 8 ou 9 anos, chamou-me e perguntou-me: “Ouve lá, tu és
paneleiro?” Eu não sabia o que era paneleiro. E fui perguntar e a explicação
deixou-me ainda mais aflito."
Excerto da entrevista de Isabel Lucas a António Lobo
Antunes, Ípsilon, 19 de Outubro
de 2018.