O suplemento Ípsilon do Jornal Público dedicou uma capa, seis páginas
e uma recensão crítica ao filme,“Alentejo,
Alentejo”, de Sérgio Tréfaut e, que, saúde-se agora, chega às salas de
cinema portuguesas. O interior do suplemento contém também a apreciação de dois críticos do
jornal – Luís Miguel Oliveira e Vasco Câmara - com duas estrelas ao documentário,
e que é sinónimo de razoável. Quem
escreve a recensão sobre o filme, o jornalista Jorge Mourinha, atribui-lhe a apreciação
de três estrelas, sinónimo de bom. Não
se pode deixar de pensar que houve aqui alguma contenção crítica ou avareza encomiástica
após considerável destaque efectivo, palpável, visível aos olhos de um leitor
assíduo do jornal. Arriscaríamos dizer que talvez tenha havido aqui um pequeno
desacerto com essa celebração do país que canta, com aquilo que há de melhor numa
comunidade que se organiza para preservar e manter viva uma das suas mais
antigas tradições, e que o demonstra com alegria e a disponibilidade representada por todos os que se envolveram neste enorme labor. E, curiosidade das curiosidades, celebra o cante enquanto come, enquanto bebe, ou
em lugares públicos, muitas vezes de braço dado. Por outro lado, ainda bem que nem todos
podemos dizer maravilhas ou ter grandes arrebatamentos após visionarmos este trabalho documental, bem como podemos, inclusive, discordar de semelhante prémio almejado e conquistado em
festival de cariz interno. E que do ponto de vista crítico ou cinematográfico podemos considerar que a razoabilidade é aceitável dentro de um panorama de reconhecimento amplo e merecido. Ou, então, será que estamos sob efeito desse drama social
que nos afecta enquanto cidadãos deste país à beira mar defenestrado e que se trata dessa nossa eterna dificuldade de gostarmos de nós próprios,
simplesmente de nos orgulharmos de sermos quem somos e de nos revermos nessa pertença à alma que julgamos ser portuguesa?
domingo, 21 de setembro de 2014
Dois Poemas de Heitor Aghá Silva
Na mão direita o silex
Na mão direita o sílex,
a pedra tosca.
Preênsil o sonho adere
o gume rápido,
à súbita e excessiva claridade.
Galho a galho, feericamente iluminado,
treparei às bagas mais desejadas
e nos ramos mais altos dos meus olhos
Trepador exímio de cíclicas mutações
visceralmente confluo
às regiões remotas
onde a Primavera permanece intacta.
Comovido pelo remoinho ancestral
no vértice mais criativo
redescubro a água e a luz,
raiz e sonho da memória biológica
assimilada.
in "A Arqueologia da Palavra", Heitor Aghá Silva, 1991.
Na mão direita o sílex,
a pedra tosca.
Preênsil o sonho adere
o gume rápido,
à súbita e excessiva claridade.
Galho a galho, feericamente iluminado,
treparei às bagas mais desejadas
e nos ramos mais altos dos meus olhos
sílaba a sílaba construirei
as luzes rápidas
da minha anunciada humanidade.
Trepador
exímio
visceralmente confluo
às regiões remotas
onde a Primavera permanece intacta.
Comovido pelo remoinho ancestral
no vértice mais criativo
redescubro a água e a luz,
raiz e sonho da memória biológica
assimilada.
in "A Arqueologia da Palavra", Heitor Aghá Silva, 1991.
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