domingo, 21 de junho de 2015

O Meu Avô e o Riso

       Quando era pequeno, aliás, demasiado pequeno, ri muito com o meu avô. O meu avô e o meu riso eram parte do mesmo cenário. Ainda hoje quando me rio parece que estou na presença do meu avô. O meu avô contava-me muitas histórias, tantas histórias que vim a saber alguns anos mais tarde, eram, na sua maioria, inventadas por ele naquele preciso momento. O meu avô ria-se sempre mais do que qualquer um das suas histórias. Eram histórias de aventura, partidas, regressos, promessas de felicidade, ou momentos de pura estúrdia. O meu avô nunca viveu connosco e, quando aparecia em nossa casa, eu expulsava-o sempre do alto das escadas e ao qual ele respondia com uma palavra apenas: "Judas"! 
     Ele acordava-me muito cedo para passear pela praia do pescado e, junto com ele, fui algumas vezes navegar de barco ou ver os outros barcos varados no areal. E por isso ainda hoje me lembro de ter chorado tanto quando o meu avô nos levou pela primeira vez numa viagem de barco com o propósito de perder o medo. O meu avô morreu quando eu tinha dez anos sem ninguém esperar, sem ter dito a ninguém que se ia embora, assim de repente. Disseram que foi um formigueiro num braço, até que lhe deu uma daquelas fúrias e foi sozinho até ao hospital. Sozinho, madrugada fora. O meu avô viveu uma boa parte da sua vida no Brasil, esse país em que lhe prometiam a construção naval e acabava na pesca. A minha avó contava que quando ele voltou de vez, veio vestido de fato branco sem um tostão no bolso, aliás o meu avô gostava tanto do Brasil que raramente trazia dinheiro para ajudar a família. Tenho pena, muita pena de só ter vivido apenas até aos dez anos com o meu avô. E talvez seja por isso que continuo a rir.