Doutor Mara: Uma pergunta para
um milhão de euros: a arte tenta imitar a vida?
Peter Casper: Eu diria que
a arte tenta perceber a vida.
DM: Nós, portugueses, somos os
responsáveis pela invenção do Nónio, a Geringonça, o Pastel de Belém, a Caixa
Multibanco e a Via Verde. O que é que ainda é possível inventar?
PC: Tendo em conta que a
maioria das invenções que o Doutor Mara refere são praticamente contemporâneas,
podemos deduzir que o espírito criativo do português não cessará com tal
fugacidade.
DM: Sei que Peter Casper não
considera a atitude estética uma disposição, mas sim um ato, porquê?
PC: Eu diria que é um acto
que temos à nossa disposição. Uma atitude estética não é necessariamente uma
acção criativa. Poderá ser contemplativa ou reflexiva, e poderá (ou não) vir a
resultar num produto final palpável.
DM: Peter Casper disse um dia:
"a satisfação de desejos e necessidades está sempre presente em quem cria,
escreve, pinta, toca, assim como em quem observa, lê, escuta". Isto
significa que não existe arte desinteressada?
PC: Sim. Em primeira
instância, o processo criativo propõe-nos problemas para os quais devemos
arranjar soluções. Antes de desafiarmos o olhar do público, temos de desafiar o
nosso. Cada vez é mais urgente essa auto-provocação para estarmos mais cientes
do nosso lugar na sociedade.
DM: O que é uma experiência
estética real, concreta e verdadeira, para Peter Casper?
PC: Não há experiência
estética mais concreta e verdadeira do que a pura contemplação da natureza.
DM: Peter Casper, tal como
dizia Segismundo Freud e António Lobo Antunes, a arte é a infância fermentada.
Corrobora?
PC: Concordo. Sou uma
pessoa muito infantil. Gugu Dada.
DM: Depois de observar a sua pintura, parece que há um fascínio particular pelo primeiro gesto, a pulsão
inicial dos criadores, o toque vibrante dos debutantes. É isso que procura, o
gesto primacial ou fundacional?
PC: Sim. Tudo o resto é excedência, como um manto de nevoeiro que se adensa à medida que nos afastamos do nosso objecto de desejo.