quarta-feira, 28 de novembro de 2012

À Terceira Ilha: o olhar lento do viajante

 No culminar do Outono chega-se à Ilha Terceira de avião, com uma gare do aeroporto completamente deserta, típica de um domingo insular. O destino inicial é São Mateus, àrea rural na zona envolvente de Angra do Heroísmo, composta de colinas e pequenos vales, nascida desse contraste entre a forte ruralidade e a evidente presença do mar. Passagem, no entanto, obrigatória pelo centro histórico da cidade de Angra do Heroísmo, a caminho de completar no próximo ano as suas três décadas de património da Humanidade, declaradas pela UNESCO no ano de 1983. À chegada a São Mateus avista-se a sua acolhedora e agradável baía com os barcos encostados ao porto e pescadores olhando o horizonte em descanso domingueiro.
Regresso nos dias seguintes à cidade de Angra que se abre ao fascínio da arquitectura, a sua vetusta e assinalável personalidade, o seu impulso desenhado ao longo de séculos e o seu conjunto arquitetónico rico e diversificado. O início deste périplo é pela Sé Catedral, a sede da religiosidade do arquipélago, exemplar da arquitectura filipina acrescentado a uma igreja gótica do século XV, fustigada pelo terramoto de 1980 e mais tarde por fogo posto, tendo a sua reconstrução permitido respeitar a traça original. Uma simpática senhora dá-nos a ver a capela-mor, repleta de pinturas e pratas do séc. XVII e ainda a sacristia com móveis de jacarandá, avistamos também a parede composta por uma galeria de retratos a óleo dos prelados diocesanos. E nem só do passado regurgita a arquitectura de angra, já que o século XX trouxe consigo o Palacete Silveira e Paulo, durante muitos anos a Escola Comercial de Angra, obra arquitectónica do mestre micaelense João da Ponte, característico da imponência visual ao cimo da Rua do Galo, actualmente a casa da Direcção Regional da Cultura. Atravesse-se desta feita o centro da cidade para chegar ao edifício do Centro Regional de Segurança Social pertencente ao arquitecto da "geração moderna", Raul Chorão Ramalho, numa obra moderna e singular, aberta à luz e ao encontro. E se fosse necessário confirmar a enorme vitalidade cultural angrense, nada melhor do que confirmar in loco o leque variadíssimo de actividades de pendor reflexivo e artístico, num único fim de semana preenchido pela filosofia, teatro e música. Tempo, portanto, para assistir ao Colóquio Internacional Comemorativo do Dia Mundial da Filosofia, sob o signo de "A Filosofia, Hoje", organizado pelo Centro de Estudos Filosóficos da Universidade dos Açores, que teve enquanto oradores personalidades variadas: Viriato Soromenho Marques, João Branquinho, Marcelino Agís Villaverde, Magda Costa Barcelos, Nuno Ornelas Martins, entre muitos outros presentes no Pico da Urze. Depois foi a vez de assistir na sede do Alpendre à peça de teatro "Colmeia", num texto contemporâneo divertido, crítico e mordaz à sociedade e literatura light, evidenciando assim a necessidade de partilha do riso e do humor com a assistência. No foyer do Centro de Congressos de Angra do Heroísmo houve também atenção e reforçada expectativa para ver e ouvir o concerto de Luísa Alcobia, acompanhada ao piano por Grigory Grytsyuk, numa encantadora viagem pela música dos séculos com as partituras de Mozart, Schubert, Fauré, Luís Freitas Branco, o açoriano Francisco de Lacerda e, por último, Erik Satie.