sexta-feira, 29 de abril de 2016

WE SEA: Fézada Musical!

Nada como festejar a noite de 24 para 25 de Abril e ouvir música variada e diferentes músicos em conjunto com muita alegria e alvedrio de tocar. O lugar escolhido já tinha sido palco recente do último Tremor ainda que o nome dado ao evento estivesse eivado de um sentimento e carga revivalista. De qualquer modo, esta salutar e curiosa iniciativa permitia um regresso ao espaço do Solar da Graça para encontrar diferentes tipos de propostas musicais. Entretanto, não demorou muito para a grande surpresa da noite soasse aquando do nome da banda em palco fosse sussurrada pelo Rodrigo. A banda já tinha tido outro nome – Broad Beans (Favas Guisadas) e que agora a formação reduzida tinha ganho outra nomenclatura.  E, se havia coisa que dava logo para ver nestes WE SEA, era o enorme à vontade, concentração e entusiasmo com que se apresentaram em palco. Estes chegaram mesmo a ironizar com o ferro de engomar que servia de base aos instrumentos do vocalista. A banda é constituída pelo Rui Rofino, voz e teclas, que demonstra grande confiança na batida e atmosferas musicais e por Clemente Almeida, no teclado e respectivas criações melódicas.
                Foi assim que, numa noite de cravos e música diversa, o espaço do Solar da Graça deu a conhecer estes WE SEA, em pleno estado de graça, com a vantagem do primeiro tema “Ser de Ver” soar de imediato a intensidade e paixão. Que belo poema-canção! É que, subitamente, a banda ribeira-grandense tomou conta daquelas mesas de madeira e público presente com aqueles desenhos e quadros nas paredes a lembrar uma ilha de outros tempos. Rui Rofino canta, por isso, com muita alma e entrega na língua de Antero de Quental.  Quem ouviu pela primeira vez, soou logo a descoberta  e prevê algo muito arejado em embrião, o que só augura um futuro promissor.

3 x William Shakespeare

Soneto 10

Recusa, por vergonha, que não sabes amar,
Tu, que para ti mesmo és tão pouco prudente!
Concede, se puderes, que és por muitos amado,
Porém, que a ninguém amas é por todos sabido.
Pois tu de um ódio tal te encontras possuído
Que mesmo contra ti não ousas conspirar,
E arriscas arruinar esse tecto tão belo,
E havias em desvelo dele melhor cuidar.
Ah, muda o teu pensar, para que eu mude o meu!
Deve o ódio ter lar mais belo que o amor?
Sê como é o teu estar, gracioso e encantador,
Ou ao menos a ti prova o teu bom sentir.
      Torna-te em outro eu, fá-lo por meu amor,
      Possa o belo viver quer nos teus, quer em ti.

Soneto 18

Poderei igualar-te a um dia de Verão?
És mais ameno e brando, e muito mais gentil.
Vacila ao vento rude o rebento em botão
E a vida do Verão, demasiado breve.
Queimando muita vez, o olho do céu brilha,
Muita vez sua face dourada se embacia;
E sempre o que é mais belo da beleza declina
Ao mando do destino ou natural porfia.
Mas não definhará o teu eterno Verão,
Nem a tua beleza há-de deixar de ser,
Nem a Morte dirá que em sua sombra és,
Quando, em eternos versos, no tempo tu cresceres.
     Enquanto alento houver e houver humano olhar,
     Hão-de viver meus versos, e tu neles viver.

Soneto 104

Para mim, belo amigo, nunca terás idade,
Pois tal como me foste, quando te olhei no olhar,
Assim me és: belo ainda. Três Invernos medonhos
Agitaram dos ramos três Estios em esplendor.
Três gentis Primaveras se tornaram Outonos,
Eu vi as estações em constante mudar,
Três perfumes de Abril queimados por três Junhos
Desde que então te vi; e ainda: igual frescor.
Ah! Porém, a beleza, sem passo percebido,
Como braço do tempo recua, rouba a forma;
E a tua doce cor, parecendo não mudar,
Varia na mudança, pode iludir-me o olhar.
     Para que tal não fora, escutai, vós, por nascer:
     Antes de vós nascerdes, o mais belo morrera.

William Shakespeare, “31 Sonetos”, Tradução de Ana Luísa Amaral, Relógio D´Água.