As bibliotecas
são, por vezes, lugares demasiado solenes, cerimoniosos e, porventura, ainda
bem. Uma biblioteca é uma casa de cultura viva, guardiã máxima do saber e da
memória e, porque não dizê-lo, ponto de descoberta de mundos novos, espaço,
portanto, de vários encontros entre quem lê e quem escreve, impulsionador da
troca de saberes e de experiências e, quem sabe, um lugar propício ao
aparecimento de novas vozes literárias, podendo estas ir de encontro ou não ao
que sentimos e queremos deste mundo em que vivemos. Esperemos, entretanto, que
novas utopias brotem.
A memória
de infância que guardo de uma Biblioteca não é a melhor. Estou ainda a ver uma
senhora bibliotecária numa minúscula sala com livros, ali com os seus cabelos
brancos encaracolados, o rosto duro e fechado, os seus olhos negros enfiados
pelos óculos de vidro de garrafa, a instigar terror quando os livros passavam o
prazo de entrega. Era vê-la aos berros a ver se envergonhava os faltosos, a
controlar a ficha dos incumpridores e a verificar o estado dos livros um a um
(maioritariamente, banda desenhada), chegando mesmo a ruborizar tudo e todos,
só para que víssemos o sacrilégio que tínhamos acabado de cometer, fosse aquilo
que fosse. Devo ter demorado alguns anos até voltar a entrar numa biblioteca
pública.
Os anos
passaram e, à volta das cidades portuguesas, as novas bibliotecas abriram-se aos novos tempos e
diversificaram a sua actividade, imprimindo diferentes funcionalidades, deixando
assim de ser exclusivamente depósitos de livros ou consulta de documentos, para
ser também lugares de estudo ou pesquisas de livros, deslocando espaços para a fruição
e prazer associado à leitura, tais como salas
dedicadas à Hemeroteca (material periódico) ou videoteca (cinema e
documentários), para além de outras salas dedicadas às crianças, com leituras de histórias e
conto infantis, preparando assim novos e futuros leitores! As bibliotecas
poderiam ter também um espaço consagrado ao absoluto silêncio, à leitura e introspecção
pura, onde nem sequer fosse possível ouvir a voz humana.
Ultimamente,
partilho com frequência e com muitos outros a Biblioteca Municipal e Arquivo de
Ponta Delgada, em São Miguel, apreciando deste modo a beleza e largueza do seu edifício,
trata-se de um projecto de recuperação do antigo Colégio Jesuíta, contém no seu
interior diferentes espaços, sendo visitada diariamente por centenas de
estudantes e investigadores, possui pátios exteriores muito bonitos (um deles, conta
com uma escultura do João Cutileiro). Proporciona também um agradável serviço de
bar, com uma gastronomia cuidada e diversificada e um serviço de empréstimo de livros vasto e bastante
actualizado, pois como diria o físico, Carlos Fiolhais, “investir em belos
livros é investir na beleza e a beleza é sempre consoladora”. Consolemo-nos, pois!