Caro Janeiro Alves,
Acuso a recepção entusiasta da sua ferial
missiva, típica de um homem que sabe que só o verão vale a pena e que esta é a
mais louca, livre e estouvada das estações. Na canícula, creio, temos tudo para
sermos felizes excepto os grilos. Nada contra os seus cânticos mecânicos e
repetitivos mas desconfio que na infância suportava muito melhor o seu
rebarbativo rumor. De certeza que e, fazendo jus à sua carta estival sobre os
doutores e engenheiros que partiram de férias e que não mais regressaram, estes
deverão, pelo menos, lembrar-se do trilar, ou melhor, do “gri-gri” de outros
verões.
Também eu, amigo Janeiro, continuo
entusiasmado com o turismo e sobretudo com a sua capacidade de irradiação. Imagine
só que há instantes, nesta cidade em que me calhou viver, me vieram
interrogar se estaria disponível para vender esta missiva que me encontro a
escrevinhar para si. Segundo o casal de jovens turistas, no seu país de origem
desconhecem já o que é a caligrafia e o próprio acto de escrever missivas em
esplanadas. Este acto quotidiano tornou-se, porventura, excêntrico. Por sinal, até
me queriam oferecer bom dinheiro mas disse-lhe que podiam fazer um registo
fotográfico e que procurassem um lugar na sombra. Curiosamente, enquanto
insistiam na aquisição da missiva, o empregado do café proferiu num português
arrematado e doce: “Vocês querem é mamar!”. Estes, embebecidos e discretos,
afastaram-se da mesa sem antes dizer: “You are really an artist!”
E o aluguer de casas? O meu amigo nem queira saber mas há dias passei nas ruas do agora denominado "Centro Histórico" e reparei que as casas onde tinha morado são agora sítios de alojamento local. Ainda bem que fui salvo a tempo pela nossa amiga Miriam que me arrendou um pequeno tugúrio baratinho junto do mar e que me serve, essencialmente, para assentar a moleirinha e o costado durante a noite.
Por último, auguro-lhe assim umas férias
inesquecíveis e espero que volte pois estou já a salivar pelo envio dum tupperware
de filetes de peixe que seguramente me enviará da cidade mais piscatória do sotavento
algarvio: Olhão!
Doutor Mara