terça-feira, 11 de julho de 2017

Quando Foi que nos Sentimos Felizes?

“O que se transmitia assim, de geração em geração, com o lento progresso de um crescimento de árvore, era a vida mas era também a consciência. Que misteriosa ascensão! Surgidos de uma lava em fusão, de uma massa estelar, de uma célula viva miraculosamente germinada, vamos, pouco a pouco elevando-nos ao ponto de escrevermos cantatas e de calcularmos vias lácteas.
          A mãe não se limita a transmitir a vida: tinha ensinado aos filhos uma linguagem, tinha-lhes confiado a bagagem tão lentamente acumulada no decorrer dos séculos, o património espiritual que ela mesmo recebera como herança: esse pequeno lote de tradições, de conceitos e de mitos que constitui toda a diferença que separa Newton ou Shakespeare do bruto das cavernas.
        O que sentimos quando temos fome, aquela fome que impelia os soldados de Espanha, sob a chuva das balas, para a lição de Botânica, que impelia Mermoz para o Atlântico Sul, que impelia outro para o seu poema, é que a génese ainda não está concluída e porque nos falta tomar consciência de nós mesmo e do universo. Precisamos de lançar pontes na noite. Só ignora isto quem pensa que a sabedoria se estriba numa indiferença que julga ser egoísta; contudo, tudo desmente essa sabedoria! Companheiros, meus companheiros, tomo-vos como testemunha: quando foi que nos sentimos felizes?”
in Terra dos Homens, Antoine Saint-Exupéry, edição Relógio d`Água, (pág 140)

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