quarta-feira, 10 de maio de 2017

Tabacaria Açoreana

É esta a minha rua – decidi
eu, por razão nenhuma.
Um grupo local, já velho, discute
diariamente política nacional.
Indiferente, e não menos assíduo,
o cão branco ladra (ou pede afagos?)
na varanda por caiar da casa em frente.

E há tabacos, jornais, revistas,
uma espécie de jardim
onde os fantasmas se riem
da nossa rude e descrente democracia.

De quando em quando, um vulto
suspeito pede-me lume, light,
algo que já não «bruxuleia firme»
– ou os rigorosos vinte cêntimos
que prefiro recusar, num sorriso coxo.

O cão recolhe-se. Não se lembra
do tempo em que a Casa das Palmeiras
trazia fausto e povo rico a esta rua
que se tornou tão minha.

Mesmo que não regresse.

Manuel de Freitas, Portas do mar, edição do Autor, 2011, com capa e ilustração de Urbano.

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