quinta-feira, 29 de novembro de 2018

Carta Injuriosa de Janeiro Alves no Cair do Outono


Caro Doutor Mara,
               
Imagino que esta carta o encontre no auge da sua popularidade, depois do deplorável espectáculo na televisão pública, onde o seu nome surgiu ligado à libertinagem e à cultura ”imediática”, na circunstância do lançamento de um panfleto de qualidade duvidosa escrito por meia dúzia de papalvos. Imagino então o meu amigo colhendo exuberâncias desta situação plastificada, rodeado de ananáses e outros ornamentos exóticos, num estado de graça que o subjuga à tentação do sorriso artificial e dos inevitáveis tiques burgueses. No fundo, eu sei que gosta desse glamour da televisão e do cinema, da vernissage e do croquete. Não pretendendo esta carta tecer críticas a seu respeito, não poderia deixar de lamentar esta situação tendo em conta a nossa já longa amizade.
                Mas não é de facto este o motivo que me leva a escrever-lhe. Imagine o Doutor Mara que vou ser homenageado pela Sociedade das Artes e das Letras, pois esta semana fui surpreendido com o galardão de ”Pior Livro do Ano 2017” com a minha obra ”Compêndio Geral de Plantas Exóticas”. Neste momento preparo o discurso para a entrega de prémios, enquanto tiro da caixa o meu fato de asas de grilo, que já não via a luz do dia desde que o enverguei categoricamente nas últimas Conferências da Fajã perante a estupefacção geral dos presentes. Conto dizer apenas algumas palavras de agradecimento, ir ao beberete e de seguida levantar o cheque. Julgo que este acontecimento exponenciará as vendas do meu livro, pelo que este natal conto alugar a vivenda inteira em Penedono, e não apenas o quarto das traseiras com vista para a serra. Como forma de agradecimento pelos importantes contributos que o Doutor Mara foi emprestando ao meu livro, envio-lhe por correio um exemplar que poderá pagar a contra-reembolso. São 25 euros em numerário, Doutor. Não precisa de me agradecer.
                Acabo esta breve carta com um semblante de desconfiança repentina relativamente a um facto que gostaria de ver esclarecido por seu intermédio. Em Fevereiro deste ano, escreveu-me o meu amigo uma carta, em que referia ter ouvido um rumor de que eu iria merecer a distinção de melhor obra de 2017. O meu caro amigo percebeu quase tudo bem. De ”melhor” para ”pior” é apenas um pormenor de somenos. O que me intriga e me provoca um franzir de sobrolho é o seguinte: onde obteve essa informação, Doutor Mara?

Com apreensão e estima,           
Janeiro Alves

terça-feira, 27 de novembro de 2018

FALTA, Ver: no Cine Auditório da Lira do Rosário, Lagoa

FALTA, Ver:  

Ciclo de documentários com a presença do realizador Raffaele Brunetti e de Ilaria de Laurentis da produtora B&B Film.


Housing, de Federica di Giacomo, quarta-feira, dia 28 de Novembro, 21h30, Auditório da Lira do Rosário, Lagoa.



Hair India, de Marco Leopardi e Raffaele Brunetti, quinta-feira, dia 29 de Novembro, 21h30, Auditório da Lira do Rosário, Lagoa

O Céu que nos Protege

The Sheltering Sky, de Bernardo Bertolucci, 1990.

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

FALTAM 3 Dias


           Assistiremos à performance da Patrícia Gabriel numa rua emblemática de Ponta Delgada - Hintze Ribeiro - no edifício da Sociedade Corretora, espaço carregado de vínculos históricos à cidade e à memória dos seus vizinhos. Esqueceremos, por instantes, a gentrificação e celebraremos as artes, os nossos possíveis ou já existentes talentos, assumir essa coisa tão frágil que é a identidade, a sua construção, sem abdicar dos costumes, da cultura local, comendo e bebendo os produtos que a terra nos oferece. Em boa verdade, vimos de muitos lugares e é dessa luz que é feito o mosaico artístico das nações, dos povos, dos locais. 
         Patrícia Gabriel agilizará alimentos à sua maneira, Raffaele Brunetti confirmará o seu cinema documental comprometido, Pedro Freire (Dj Fellini) encarregar-se-á de perambular em torno do equilíbrio sonoro, José Castelo destapará as portas do Auditório da Lira do Rosário, na Lagoa, como quem recebe amigos na sala de jantar, tornando assim os dias da FALTA inesquecíveis.

segunda-feira, 19 de novembro de 2018

sábado, 17 de novembro de 2018

Sol de Março sobe ao Palco do Teatro Micaelense




É hoje, no Teatro Micaelense, às 21h30, inserido no evento literário “Arquipélago de Escritores”, que se apresenta a banda de Medeiros/Lucas para mais um espectáculo da sua digressão do Outono. Em palco irão estar a voz de Carlinhos Medeiros, a guitarra de Pedro Lucas, o baixo de Augusto Macedo, a bateria de Ian Carlo Mendonza e os sintetizadores de Rui Souza. Durante o concerto serão ouvidos temas dos três álbuns editados: “Mar Aberto” (2015), “Terra do Corpo” (2016) e “Sol de Março” (2018), sendo as letras dos últimos dois discos pertença do escritor micaelense, João Pedro Porto. Assim, aguarda-se uma sala bem composta para uma noite musical com sabor a mar, corpo e luz.

Cabo Verde: E já lá vão três!


           A aventura musical caboverdiana nos Açores começou em Maio com o concerto dos Alma Crioula no Teatro Micaelense. Em palco, a presença e voz de Jenifer Soledad mas, sobretudo, ficou patente na mestria de Bau e respectiva descendência num concerto contido, mas  intenso. O músico Bau é autodidacta, já esteve ao lado de Cesária Évora ou acompanhou músicos como Tito Paris ou Bius, onde fundou os Gaiatos. A sua carreira viria a ter um momento alto com o tema “Raquel”, a "mazurka" que foi parte integrante do filme Fala com Ela, banda sonora da obra do realizador Pedro Almodóvar. Este músico amante do cavaquinho, natural da ilha de Santiago, continua assim  a ter im papel impulsionador de novas vozes e talentos emergentes no seu país.
                Seguiu-se, em Setembro, a voz de Elida Almeida, cabeça de cartaz da edição deste ano do Azores Burning Summer Festival, em Porto Formoso, numa digressão por Portugal depois do sucesso retumbante no arquipélago cabo-verdiano. Numa noite de mornas, coladeras e funaná, o concerto terminaria ao rubro com o público rendido a dançar de forma vibrante, esforçando-se por cantar num crioulo improvisado as canções sugeridas em encore. Alguns minutos depois a festa cabo-verdiana tornou-se ainda mais intensa com o encerramento efetuado pelos Fogo, Fogo, que deu o mote para o primeiro dia do festival com uma prestação inesquecível rodeada de água e bailarico. Apesar do dilúvio, o público não arredaria pé.
              Agora em Novembro, no Festival "O Mundo Aqui", numa proposta assente na diversidade cultural e na integração social dos imigrantes no arquipélago, foi a vez de Nancy Vieira transportar na sua voz os aromas e sabores da terra de Cise e Bana. É certo que a acústica daquele espaço, o multiusos das Portas do Mar, pode não ser o melhor para a exploração das diferentes sonoridades em questão ou mesmo para um concerto desta natureza, no entanto os músicos e a cantora evidenciaram uma entrega intensa, empenhada e irrepreensível. Ao longo do concerto, a cantora revelou talento e demonstrou aos açorianos que as ilhas atlânticas são, muito embora já o soubéssemos há muito tempo,  curioso viveiro de músicos, canções bonitas, sentimentos de partilha e interessantes cumplicidades.  

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Em Novembro...

Em Novembro, prova o vinho e planta o cebolinho.
in Agenda Terra, Tipografia Micaelense, 2018.

3 Mulheres de Fernando Vendrell

sítio da RTP

                       
     Está a ser exibida na na RTP a série de Fernando Vendrell, “Três Mulheres”, baseada nos factos que uniram Snu Abecassis, Vera Lagoa e Natália Correia, sobretudo entre o período de 1961 e 1973. Esta série foi concebida por Fernando Vendrell e Elsa Garcia, conta com o argumento de Fátima Ribeiro e Luís Alvarães, para além de um vasto leque de actores: Victoria Guerra (Snu), Maria João Bastos (Vera Lagoa), Soraia Chaves (Natália), Pedro Lamares (Sttau Monteiro), entre tantos outros. Cada episódio tem a duração de cinquenta minutos e termina no treze. E... pelo que já foi dado a ver, vale bem a pena!

domingo, 11 de novembro de 2018

Dias da FALTA

Poster de Júlia Garcia 

Apartamo-nos Bruscamente e em Silêncio

Apartamo-nos bruscamente e em silêncio
Temos crenças bem fundas das metas a alcançar
Irmãos do vendaval e de pássaros lestos
Levam-nos para lá de qualquer sombra ou recordação
Esquecer é fuga se pensamos em desperdício
Uma vez que voltamos continuamente ao princípio
Quando o presente é anseio e indecisão
Arte sóbria da descoberta e do desconhecido
Resquício de lava cálida em vulcão extinto

São Martinho ilhéu

Fotografia de Carlos Olyveira

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

Pintura: Código Postal 9500 - Três residentes artistas: Beatriz Brum, João Miguel Ramos e Sara Rocha Silva no CMC de PDL

O Centro Municipal de Cultura de Ponta Delgada inaugurou recentemente a exposição “Código Postal 9500 - Três residentes artistas: Beatriz Brum, João Miguel Ramos e Sara Rocha Silva”. Este núcleo expositivo ficará patente até 28 de Dezembro e está aberto ao público no horário de expediente. A ideia partiu da artista plástica Maria José Cavaco que, aludindo ao conto de Joseph Conrad, O plantador de Malata, aliou também o correio postal do lugar de origem dos três jovens artistas a criar e a residir em território micaelense.
O artista plástico, João Miguel Ramos, dá-nos a conhecer alguns trabalhos com o sugestivo título “Bad Painting”, vários balões com cabeças em gesso em forma de suporte e ainda balões com pinturas que evocam Gustave Courbet ou Domingos Rebelo. Um trabalho marcado por um refinado bom gosto e pela auto ironia, permitindo ao espectador uma curiosa reflexão assente na desconstrução da arte enquanto instituição, bem como a sua rotineira representação. A confirmá-lo basta observar o modo como “dissemina” os seus materiais pelo espaço expositivo e os suportes em que os trabalhos se encontram. Por outro lado, Beatriz Brum usa a simplicidade do acetato para dialogar de forma experimental com a iluminação e as diferentes linhas e formas de representação cromática presente nos materiais. Aproveita a busca interior e demanda artesanal para mapear o território formal a seu bel prazer. Por fim, temos o trabalho figurativo de Sara Rocha Silva a revelar um interessante domínio da técnica e da perspectiva, focando a sua deambulação por lugares assépticos que quotidianamente frequentamos: zona das partidas em aeroportos, centros comerciais, salas de espera de bancos ou hospitais ou as singelas cadeiras de autocarros insulares.
Deste modo, vale bem a pena despender atenção e tempo do nosso olhar pelos diferentes espaços do Centro Municipal de Cultura - assim recomeçado e reaberto para exposições - nesta interessante proposta que nos é feita, pressentindo que aquilo que nos reserva as paredes e no chão deste renovado espaço expositivo é um novo e curioso diálogo com as obras expostas pelos novos ou já conhecidos artistas plásticos açorianos.

quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Medeiros/Lucas: Faltam Dez Dias

"Sol de Março", Medeiros/Lucas, 2018


        Faltam dez dias para o Teatro Micaelense e o evento literário “Arquipélago de Escritores” acolher a banda de Medeiros/Lucas para um concerto único no arquipélago açoriano. Para além da voz de Carlinhos Medeiros e a guitarra de Pedro Lucas, estarão presentes Augusto Macedo (teclado) e Ian Carlo Mendonza na bateria. Este projecto musical conta já com três álbuns gravados: “Mar Aberto”, “Terra do Corpo” e “Sol de Março”, tendo este último as letras do escritor micaelense João Pedro Porto. Sendo assim, não tarda nada e escutaremos o refrão de “Galgar", o tema mais dançante do disco editado em Março deste ano: "Feito raio de acinte/ Galga tudo de rédea ardente/ Interessa pouco ou quase nada/ Todo o que não se enfrente”. Os bilhetes já estão à venda e custam oito euros!

Do Outono

        "O facto pelo qual prefiro o Outono à Primavera é porque no Outono olhamos para o céu, na Primavera para a terra."
 Søren Kierkegaard

terça-feira, 6 de novembro de 2018

Agenda da FALTA para Novembro na Ilha de São Miguel

   A F A L T A, projecto colectivo e independente que reúne contributos literários e artísticos, lança o seu nº 1, dedicado ao tema da Falha. Desta feita, desdobramos o acontecimento na FALTA, Experimentar - lançamento da fanzine com performance gastronómica de Patrícia Gabriel no espaço da Sociedade Corretora, rua Hintze Ribeiro, em Ponta Delgada. E na FALTA, Ver - com a projecção de documentários de Raffaele Brunetti e da sua produtora B&B Film no Auditório da Lira do Rosário, na cidade de Lagoa.

FALTA, Ler: - lançamento da fanzine, dia 24 de Novembro, sábado, às 18h00, na Sociedade Corretora, rua Hintze Ribeiro, nº34, em Ponta Delgada.
FALTA, Experimentar: o lançamento conta com performance gastronómica de Patrícia Gabriel, às 18h30, no espaço da Sociedade Corretora.
FALTA, Ver:  Ciclo de documentários com a presença do realizador Raffaele Brunetti.
Housing, de Frederica di Giacomo, quarta-feira, dia 28 de Novembro, 21h30, Auditório da Lira do Rosário, Lagoa.
Hair India, de Marco Leopardi e Raffaele Brunetti, quinta-feira, dia 29 de Novembro, 21h30, Auditório da Lira do Rosário, Lagoa.

Um Poema de Sophia de Mello Breyner Andresen


As Ondas 

As ondas quebravam uma a uma
Eu estava só com a areia e com a espuma
Do mar que cantava só para mim.

segunda-feira, 5 de novembro de 2018

Divergências, Ama Romanta (1986)

    
             "Que seja assim o canto da esperança/ num ar que reluz e de revolta", ouve-se num coro sentido dos Linha Geral, em "Hino à Nossa Luta" e...de imediato um arrepio na espinha. Este disco que, apesar de já ter passado tanto tempo sobre a sua edição, continua bastante actual, à semelhança do discurso no final de Paquete de Oliveira.  Há um lado nostálgico neste recuar a meados dos anos 80,  ao eclodir de um dos momentos mais interessantes da música moderna feita em Portugal de forma livre e independente. Talvez, por isso, faltem novas e arrojadas Divergências para que se repitam façanhas deste tipo. À cabeça do movimento, constava o vocalista dos Pop Dell´Arte, João Peste, acompanhado pela sua sócia, Maria João Serra, que ambos viriam a fundar a editora Ama Romanta, e assim foram capazes de editar nomes como: Sei Miguel, Telectu, Tozé Ferreira, Pop Dell'Arte, Mão Morta ou os Croix Sainte, entre tantos outros. 

Do Interesse

"Penso que o motivo por que nos interessamos por determinadas pessoas ou por certos temas, e não por outros, é, muito provavelmente, da ordem do inconsciente. Chegamos às coisas ou são as coisas que chegam a nós?"
Manuela Fleming, professora e psicanalista.

sexta-feira, 2 de novembro de 2018

Al Cabo

Al cabo, son muy pocas las palabras
que de verdad nos duelen, y muy pocas
las que consiguen alegrar el alma.
Y son también muy pocas las personas
que mueven nuestro corazón, y menos
aún las que lo mueven mucho tiempo.
Al cabo, son poquísimas las cosas
que de verdad importan en la vida:
poder querer a alguien, que nos quieran
y no morir después que nuestros hijos

Amalia Bautista in Cuentamolo todo outra vez, 1996.

Um verso de Sharon Van Etten

I can't wait 'til we're afraid of nothing

Fotografia de Carlos Olyveira



Pascal Comelade: Haikus de Pianos

(imagem retirada da discogs)