quarta-feira, 4 de março de 2020

Cá estão as Asas


“E era uma vida incomparável, uma vida de alegria e entusiasmo em que se desenvolvia aquele amor como uma flor ébria de seiva. Era uma vida livre, sem restrições nem limites. Tinham a sensação de uma liberdade física absoluta, como se os sentidos estivessem libertos de entraves desconhecidos, como se os olhos se movessem mais livremente nas órbitas e as orelhas ouvissem sons que habitualmente são imperceptíveis. Era uma vida de seres sobre-humanos. Que maravilhosa sensação! Voar como os pássaros, em silêncio, no ar submisso; ver, como deuses, a mudança ininterrupta de cenários; descer as planícies nos vales, subir ao longo das colinas, andar de cidade em cidade, acompanhar os rios, desvendar florestas, e tudo isto graças à potência dos músculos, ao funcionamento correcto dos pulmões, à tenacidade do querer. E isto tudo sem quaisquer inconvenientes. Gostam do sol que lhes aquece a nuca, mas também gostam da chuva que os fustiga e do vento que os açoita, porque se sentem formidáveis, vencedores dos elementos, donos do mundo.”

Maurice Leblanc, in “De Bicicleta, Antologia de Textos”, Relógio D´Água, 2018.