“Um dos passeios que mais gosto de dar é ir
a Esposende ver desaguar o Cávado. Existe lá um bar apropriado para isso. Um
rio é a infância da água. As margens, o leito, tudo a protege. Na foz é que há
a aventura do mar largo. Acabou-se qualquer possível árvore genealógica,
visível no anel do dedo. Acabou-se mesmo qualquer passado. É o convívio com a
distância, com o incomensurável. É o anonimato. E a todo o momento há água que
se lança nessa aventura. Adeus margens verdejantes, adeus pontes, adeus peixes
conhecidos. Agora é o mar salgado, a aventura sem retorno, nem mesmo na maré
cheia. E é em Esposende que eu gosto de assistir, durante horas, a troco de uma
cerveja, à morte de um rio que envelheceu a romper pedras e plantas, que lutou,
que torneou obstáculos. Impossível voltar atrás. Agora é a morte. Ou a vida.”
Ruy Belo in “Todos os Poemas”.
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