Agnès Varda, 1956 (Póvoa de Varzim) |
«Como dizia Agnès,“as recordações são
como bolas de sabão que sobem”. Durante muito tempo, tudo o que eu conhecia de
Portugal era uma fotografia que Agnès tinha feito em 1956. Aquela mulher tão
bonita, tão altiva, que caminhava descalça numa rua da Póvoa de Varzim, cidade
marítima da Porto. Entre essa mulher, vestida de preto – rainha anónima, rainha
das gentes pobres – e os restos de um cartaz colado na parede com a bela Sophia
Loren – outra rainha, uma rainha do cinema – que fez sonhar tantos
adolescentes, prefiro a portuguesa. Falámos muitas vezes dessa fotografia, Agnès
e eu. O movimento de andar, essa acção simples de caminhar em direcção a alguma
coisa. É o famoso “instante decisivo" de Cartier-Bresson captado por Agnès,
e ao mesmo tempo um plano de cinema – um instante suspenso. Mas onde acaba a
fotografia e onde começa o cinema? Poderíamos imaginar a história dessa mulher.
Está furiosa? Vai ao encontro da sua família, dos seus amigos, de um marido, de
um amante? Ou, muito simplesmente, está a regressar a casa. Agnès veio a
Portugal em 1956. Interessou-se pelas mulheres, pelas crianças, pelos
pescadores, as actividades do quotidiano e, evidentemente, pela tourada. As suas
provas de contacto da Leica 24x36 mostram-nos um Portugal pobre e austero.»
Rosalie Varda,
in “Regressar ao Porto, a Serralves”, livro
“Luz e Sonho”, Agnès Varda, Serralves, 2022.
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