Banana do Pico
é um documento fílmico iniciático, porventura um trabalho cinematográfico de
fim de curso, mas nem por isso deixa de ser um objecto valioso, confirmando-se
assim o reconhecimento e os prémios obtidos pelos festivais por onde tem
passado. Desta forma, só há que louvar esta belíssima mostra de cinema açoriano
intitulada “Amostram´isse”, prenúncio de dinamismo e alavanca exibicional há
muito necessária desta pequena mas vital cinematografia produzida em solo
açoriano e que merece uma divulgação condizente. Angra do Heroísmo foi, já que
termina hoje à noite, a primeira a abrir as “hostilidades”…seguem-se Horta,
Ponta Delgada e Lisboa.
O que fazer
depois do curso de cinema terminado? Deve ter sido esta a pergunta que o realizador
de cinema Luís Bicudo, natural da Ilha do Faial, deve ter feito num país em que
ser cineasta pode bem ser uma miragem, um sonho adiado ou uma batalha infinita
pela obtenção de boas condições (financeiras, e não só!) para filmar e seguir
adiante nessa profissão e labor da sétima arte. Daí este retorno às origens
para filmar a casa dos avós, a ilha das suas férias estivais, as lembranças e
memórias de infância e adolescência ali passadas ou ainda o reencontro com o
bananal que serviu de espaço para brincadeiras e peripécias. “Banana do Pico” é,
portanto, um objecto nostálgico mas tem a vitalidade de fazer perguntas
certeiras e acutilantes num momento preciso, agora que já passaram três anos (o
documentário é de 2010). O que Luís Bicudo nos mostra neste documentário até à
exaustão é que pode existir um regresso doce às raízes, à infância e aos
afectos vividos em Santa Cruz das Ribeiras, Ilha do Pico. O que depois fazer
com a permanência parece ser a grande dificuldade dos que voltam aos lugares
aonde foram felizes, já dizia Cesare Pavese, escritor italiano. Será que
devemos continuar aquilo que outros começaram? Este documento levanta,
portanto, questões muito sérias sobre os jovens açorianos que partem com o fito
de melhorar a sua formação e um dia “decidem” voltar àquilo a que muitos
apelidam de “terrinha”. Poderão eles trabalhar naquilo em que mais gostam
nestas suas ilhas de nascimento? Poderão trabalhar a terra e produzir filmes
numa ilha no meio do atlântico? O jovem cineasta empreendeu assim uma viagem às
raízes para atestar a sua posição enquanto cidadão açoriano e atestar também a
validade da sua cidadania num mundo que se globalizou pela negativa e em que o
consumo e a distribuição de bananas à escala planetária não é alheia. Estes
vinte e seis minutos são um importante documento de reflexão sobre o que são ou
poderão vir a ser as Ilhas dos Açores muito em breve, isto é, serão lugares de
esperança e estímulos para os que regressam ou o abandono e desespero total
para os que ficam? O mesmo acontece com Santa Cruz das Ribeiras, a freguesia
picarota que agora já não é o mesmo lugar, pois foi filmada com alma e coração
de ilhéu, deixando de ser só o ponto de onde partem bananas para todo o
arquipélago açoriano e antigo poiso de baleeiros mas também o sítio escolhido
para filmar uma memória, uma passagem, uma vida e habitat açoriano a que muita
gente quis ver, assistir e…sentir.
Por fim, lembre-se a abertura do
filme quando o avó do realizador, Francisco Soares da Silva, disfere um rude golpe
de asa à juventude actual: “Se eles não
quiserem trabalhar hão-de comer amoras, de silvado.” Há nestas palavras um
pessimismo quanto ao futuro, um lado lunar que se nos cola ao corpo lusitano e
à fatalidade do destino, como se alguém com muita, muita experiência, nos
viesse dizer que tanto as bananas bem como o cinema necessitam de toda a nossa
dedicação, empenho e, porque não expressá-la, da nossa infinita devoção.
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