terça-feira, 17 de novembro de 2015
Sala de Embarque
Rapariga Aluada: Eu gosto tanto de olhar pelas janelas do avião. As nuvens parecem-me farrapos brancos a voar pelo céu. E todas elas têm nomes curiosos, há a cumulus, a congestus, a Cumulonimbus, a Stratocumulus, a Nimbostratus, a Altocumulus, a Cirrus, a Cirrocumulus...
segunda-feira, 16 de novembro de 2015
sábado, 14 de novembro de 2015
Resposta a Janeiro Alves no Mês das Castanhas
Caro Janeiro Alves,
Escrevo-lhe de
uma nuvem de sonho em que estou imerso, por sinal de seu nome: Altocumulus. Ultimamente só frequento
nuvens e, como é do seu conhecimento, chafaricas urbanas de grande nível. É por
lá que me vou alimentando de sopas de alho francês e me dou ao trabalho de dar
duas ou três de conversa antes de regressar novamente ao meu estado nefelibata.
Recebi a sua
missiva com muito agrado e pertinência. Esta foi-me lida em voz alta pela minha
mui amiga Miriam Manaia enquanto me amaciava os pés com água bem quente
polvilhada pela erva-dormideira. Fico deveras admirado com tanta verborreia da
sua parte que a meio da sua epístola encravei uma unha na frincha da bacia e
tive de retirar o dedo mindinho com um alicate. Isto só possível após o
relaxamento do músculo e da polpa do dedo dado ter ficado petrificado com o seu
discurso. Tenho, sem dúvida, plena consciência que face ao momento crítico e
caótico que estamos a atravessar são necessários homens rijos e valentes. No
entanto, há muito que a comunidade de sábios da numerologia não conta comigo
para decifrar os mistérios da alta finança e do bolo-rei. Tenho muita pena,
portanto.
Permita-me que
lhe demonstre a minha total disponibilidade para esse nosso encontro há muito
aguardado, responsabilizando-me pelo transporte dos dossiers do célere e
afamado Congresso da Fajã bem como levarei comigo moedas de um cêntimo para o
crónico jogo da moeda. É possível que inicialmente não me consiga reconhecer
pois faço questão de me apresentar de túnica helénica e de óculos de mergulho,
já para não falar que irei com a cabeleira do Mancha. A palavra de código será –
Darandina!
Saúdo,
portanto, o meu caro amigo com um copo de tinto – palavra que em sânscrito significava
amado – e revelo assim a minha
sensação ilusória de felicidade momentânea que aguardo em breve podê-la
partilhar consigo.
Com as
respectivas saudações marianas,
Doutor Mara
(Embora Tenha o Sol...)
Embora tenha o sol para me alumiar
e a lua e as estrelas depois do sol se pôr
sem a luz dos teus olhos negros
é sempre negra a noite em meu redor.
Bhartrhari, Índia, séc. V. d.c
(Tradução de Jorge Sousa Braga)
quarta-feira, 11 de novembro de 2015
O Beijo
Um rapaz beijou-me ontem à tarde
E o seu beijo era um vinho perfumado
Tão longamente bebi nesses lábios o vinho do amor
que ainda agora me sinto embriagado
Anónimo, Grécia, Séc. I a.c
Tradução de Jorge Sousa Braga.
E o seu beijo era um vinho perfumado
Tão longamente bebi nesses lábios o vinho do amor
que ainda agora me sinto embriagado
Anónimo, Grécia, Séc. I a.c
Tradução de Jorge Sousa Braga.
Rapariga Seduzida
Embalou-me - eu era tão inocente -
com vinho e palavras de amor
e todas as juras. Ao acordar
qual não foi a minha surpresa
A seda que cobria os meus seios e o ventre
desaparecera e com ela a minha pureza
Deusa lembra-te que estávamos sós
e ele era forte - e eu tão indefesa
Hedylos, Grécia, séc. II. A.C
Tradução de Jorge Sousa Braga.
com vinho e palavras de amor
e todas as juras. Ao acordar
qual não foi a minha surpresa
A seda que cobria os meus seios e o ventre
desaparecera e com ela a minha pureza
Deusa lembra-te que estávamos sós
e ele era forte - e eu tão indefesa
Hedylos, Grécia, séc. II. A.C
Tradução de Jorge Sousa Braga.
Da Poesia...
"A poesia não oferece respostas, a poesia não
pode apagar o sofrimento, a poesia não trará um ser amado de volta à vida, a
poesia não protege do mal, a poesia não nos vinga as vítimas nem castiga os que
as vitimam. Tudo o que a poesia pode fazer, e só quando as estrelas são
caridosas, é emprestar palavras às nossas perguntas, ecoar o nosso sofrimento,
ajuda-nos a recordar os mortos, nomear as obras do mal, ensina-nos a reflectir
acerca das consequências da vingança e dos castigos, e também da bondade, mesmo
quando essa bondade já não existe. Uma velha oração judaica recorda-nos
humildemente: “Senhor, retira a pedra do meio do caminho, para que o ladrão não
tropece durante a noite.”
in Uma História da Curiosidade, Alberto Manguel, edições Tinta da China, 2015.
domingo, 8 de novembro de 2015
Escrever versos...
Escrever versos é um acelerador extraordinário de consciência, do pensamento, da compreensão do universo. Quem experimentou uma vez essa aceleração, nunca mais será capaz de recusar a possibilidade de repetir essa experiência; torna-se dependente do processo, como outros se tornam dependentes da droga ou do álcool. Aquele que verifica que está dependente da língua é, creio, o que se chama um poeta."
Joseph Brodsky
sábado, 7 de novembro de 2015
Orpheu por Armando Cortes-Rodrigues
"Conheci Fernando Pessoa quando cheguei a Lisboa para frequentar o antigo curso superior de Letras. Já não sei quem me apresentou no Chiado, como poeta das ilhas. O traço comum da poesia e a simpatia acolhedora de Pessoa iniciaram uma amizade cada vez mais última, durante cinco anos de convívio.
Todos os dias me encontrava com Pessoa sempre depois das aulas e à noite depois das aulas, a princípio na Brasileira do Chiado e depois no Rossio.
Pessoa tinha um grupo de amigos e admiradores que abancavam à mesma mesa do café. Dessas conversas nasceu o movimento do Orpheu e a possibilidade daquela revista, da qual saíram apenas dois números."
Manuscrito de Armando Côrtes-Rodrigues escrito em Ponta Delgada por altura do 30ºAniversário da publicação da Revista Orpheu. Junho 1945.
quinta-feira, 5 de novembro de 2015
Uma Epístola de Janeiro Alves no Cair da Cacimba....
Caro Dr. Mara,
Os meus dias mais recentes têm-se revestido de uma
certa e determinada preocupação. Preocupação com o estado das coisas, e
preocupação com o facto de não saber de si para as resolver. Nem de si nem do
seu paradeiro. A única pista relevante foi-me dada por um transeunte comum e
incaracterístico que me confidenciou ter visto o seu paradeiro de soslaio numa
chafarica urbana.
Essa sua ausência certamente catártica tem-me causado
algum transtorno, pois como sabe há muito que conto com a sua diligência e até
esperteza na aplicação de métodos de trabalho com vista à implementação do
nosso projecto futurista. Confiei nas suas mãos os mais engenhosos, invulgares
e até pouco ortodoxos planos de instalação de novas consciências para a
transformação colectiva. Trouxe até si toda a filosofia reformadora que o
subtraiu ao mundo das trevas onde estava afundado há anos e lhe permitiu
vislumbrar o brilho cintilante e cristalino da luz do conhecimento. Fui tantas
vezes assistência da sua oratória ensaísta, aplaudindo-o e aclamando-o de pé à
boa maneira Vienense, depois de horas e horas de retórica sobre ideias ainda
pouco consistentes. Apliquei-lhe os mais diversos correctivos de índole
estética, estilística, formal e etílica, em longas noites de trabalho
objectivando o seu crescimento intelectual. E agora desaparece do mapa, sem
dizer ai nem ui, e quando o país mais precisa de si.
Estou renitente quanto à sua saúde mental, sendo
certo que o isolamento forçado potencialmente contribui para a sua debilidade. Pretendo
portanto marcar uma reunião urgente consigo, em que a ordem dos trabalhos será
a seguinte: a) Fazer um balanço das conferências da Fajã; b) Escarnecer e
censurar sem piedade alguns acontecimentos contemporâneos; c) Agendar o nosso
habitual jantar de Natal com os nossos colaboradores internacionais; d) Jogar à
moeda para ver quem paga a conta.
É de toda a conveniência que esta reunião se mantenha
secreta, pois desconfio que neste momento ando a ser alvo de escutas por parte
de ouvintes profissionais ao serviço d’Eles. Proponho então que a mesma se
concretize na cave do Alfa Pendular, junto à Via do Mississípi X, quarta
cavalariça. A data e hora serão a combinar, de preferência antes da reunião
para que a mesma possa suceder.
Ainda que se mantenha no seu refúgio, e ainda que
esse refúgio possa ser imaginário, e ainda que a sua imaginação lhe forneça a
sensação ilusória de felicidade momentânea, estou certo que ao responder a esta
carta que lhe envio, encetará um movimento que poderá vir a dar o contributo
decisivo para a afirmação do seu palmarés.
Janeiro Alves
Lisboa, 4 de Novembro de 2015
terça-feira, 3 de novembro de 2015
FAZENDO 103
António
Pinto Ribeiro aquando da sua presença numa conferência organizada pelo FAZENDO (https://issuu.com/fazendofazendo) na
celebração da centésima edição do Boletim Cultural, em Maio último, comentou
em público que aquilo que mais o tinha impressionado nesta publicação insular era “a
capacidade de todos os anos mudar de figurino, a ousadia de alterar completamente o seu
visual, o seu grafismo”. E é assim que o FAZENDO entra no oitavo ano de
actividade com a mesma postura, de “cara lavada e renovada” e com a máxima curiosidade e
inventividade para continuar a surpreender o público leitor. Nesta nova
apresentação gráfica do jornal, desta feita com a assinatura gráfica de Raquel
Vila Arisa, paginação de Góel e também da Raquel, a direcção continu a ser do Tomás Melo
e da Aurora Ribeiro. O FAZENDO dedicará a mesma atenção à actividade cultural
existente no arquipélago, bem como continuará a
apresentar rubricas ligadas à ciência, insistindo (e bem!) no seu Fazendinho, para
além do REBUS e outros assuntos e temáticas. Deu-se, entretanto, o desaparecimento da entrevista do Morcego, mas permanecerá a entrevista feita pela Sara Soares a
pessoas que habitam por esse mundo fora sobre a geografia e costumes do arquipélago. Boas leituras!
José Fonseca e Costa (1933-2015)
À
semelhança de Fernando Lopes, José Fonseca e Costa foi dos cineastas portugueses
da sua geração que agregou um grande número de amantes e entusiastas à volta dos seus
filmes. Recorde-se assim o poético “O Recado” (1972), o hilariante “Kilas, o
Mau da Fita” ou o fraterno “Cinco Dias, Cinco Noites”. E onde é que se pode
hoje vê-los?
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