“Como poderemos ver hoje a Lua com os olhos de
um grego? Foi uma experiência que eu mesmo fiz, na minha juventude, durante a
primeira viagem à Grécia. Navegava de noite, de ilha em ilha; estendido no
convés, olhava o céu por cima de mim, onde a Lua brilhava, luminoso rosto
nocturno que projectava o seu claro reflexo, imóvel, oscilando sobre a
obscuridade do mar. Sentia-me deslumbrado, fascinado por aquele suave e
estranho brilho que banhava as ondas adormecidas; sentia-me emocionado como se
tratasse de uma presença feminina, próxima e simultaneamente longínqua,
familiar mas inacessível, cujo esplendor tivesse vindo visitar a obscuridade da
noite. O que estou a ver é Selene, dizia para comigo, nocturna, misteriosa e
brilhante. Muitos anos depois, ao ver no ecrã do meu televisor as imagens do
primeiro astronauta lunar saltitando pesadamente, com o seu escafandro de
cosmonauta, no espaço triste de uma desolada periferia, à impressão de
sacrilégio que senti hoje juntou-se o sentimento doloroso de uma ferida que não
poderia ser curada: o meu neto, que como toda a gente viu nessas imagens, já
não será capaz de ver a lua como eu a vi: com os olhos de um grego. A palavra
Selene tornou-se uma referência meramente erudita: a Lua, tal como surge hoje
no céu, já não responde a esse nome.”
in “O Homem Grego”, de Jean-Pierre Vernant, Editorial Presença
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