sexta-feira, 24 de abril de 2020

“Maria do Mar”: Cuidado com as Miúdas!

"Maria do Mar" de João Rosas, 2015
(imagem daqui:Icateca.ica.ip.pt)

“Sembra un angelo caduto dal cielo
com'è vestita quando entra al "Sassofono Blu"
ma si annoia appoggiata a uno specchio
tra fanatici in pelle che la scrutano senza poesia
sta perdendo, sta perdendo, sta perdendo, sta perdendo

Nada

        Maria do Mar” é uma curta-metragem de João Rosas, realizada em 2015, que se encontra disponível na plataforma da TerraTreme Filmes, uma produtora de cinema que tem disponibilizado semanalmente alguns dos seus filmes para (re)ver nesta quarentena cinéfila.
Da sinopse ficámos a saber que Nicolau (Francisco Melo) é um adolescente que acompanha o irmão mais velho e amigos, num fim de semana de estio até Sintra. Pelo meio há contadores de histórias familiares de engate, uma rapariga misteriosa e voluntária de esquerda e, que vê filmes de autor, e ainda um jovem personagem com indumentária de ursinho, este no apogeu da dor e sofrimento por desilusão amorosa. É ele quem avisa Nicolau - "Cuidado com as miúdas!" E quem vê o resto do filme outra coisa não seria de esperar.
Desta feita e, sem nos apercebermos imediatamente do que está em jogo, à semelhança dos amores na adolescência ou do nascimento das flores na Primavera, Nicolau é quem nos guia na descoberta desse desejo e encantamento primordial. Enquanto típico adolescente, atento e observador, vai subindo até ao cimo das árvores, realiza truques com baralhos de cartas ou faz uso das mãos ou do lápis para ludibriar, observando e contemplando o irmão e seus amigos de modo complacente, como se nada tivesse a ver com estes. João Rosas filma os subterrâneos da paixão, já que subentendemos em Nicolau o aflorar dos sentidos, a seiva a despontar nos tecidos, convocando-nos para esse  “Eros” estival que é, sem espinhas, a confirmação do anseio sexual perante aquela figura feminina enigmática.
Esta curta-metragem é, por isso, uma agradável surpresa, com momentos de grande cinema e em que dá mesmo gosto ter aquele olhar ingénuo, melhor, poder dormir ao relento depois do momento em que a rapariga italiana narra a origem e configuração da massa tortellini. Aparentemente, sem criar muito alarido, à semelhança da personagem feminina que lhe dá o título - “Maria do Mar”, este filme é penetrante e cativante, sobretudo pelo apelo à cumplicidade dos olhares que Nicolau vai estabelecendo com o espectador. Isso e…todos os silêncios que se vão formando e crescendo!
Depois, o filme encerra da melhor forma possível, isto é, conosco a intuirmos e acedermos secretamente à paixão de Nicolau por Maria do Mar (Mariana Galvão), quando ficamos todos confinados no interior do carro com música à escuta, num provável regresso à outra casa - será esta a casa do amor? “Maria do Mar” é, sem qualquer dúvida, um filme caído do céu!

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