sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

Carta de Janeiro Alves nos confins de 2021

Sintra, 31 de Dezembro

Benemérito Doutor Mara,

Antes de mais, agradeço o facto de me ter comunicado que estamos no fim de mais um ano. Como sabe sou propenso a distracções. Já tenho duas garrafas de Raposeira no frigorífico e o meu paletó hondurenho está neste momento a ser escovado a quatro mãos. Adivinha-se uma noite de arromba, Doutor.

Apesar de ter ficado com uma clara ideia de que o meu amigo se encontra no domínio total das suas capacidades físicas ao ponto de ostentar diariamente essa carcaça velha no pesqueiro de Ponta Delgada, fico por outro lado apreensivo com os dilemas que enfrenta relativamente à maquia que está prestes a receber. Neste momento tenho disponibilidade para o ajudar, e até já desmarquei coisas que tinha combinado para lhe oferecer todo o auxílio necessário. Os amigos são para estas coisas. Envio-lhe em folha anexa o meu nib para que possa transferir essa pequena fortuna que irá receber, livrando-se assim de transtornos relacionados com assuntos financeiros que não são do seu domínio. Doutor Mara, vá descansado para a casa do Burgau, e sente-se comodamente a beber o seu vinho enquanto eu lhe multiplico a fortuna! Verá que estará em boas mãos. Peço-lhe apenas que ainda este fim de semana me faça um adiantamento de alguns milhares de euros, para que eu possa já começar a montar um escritório de investimento, que será composto por uma secretária, uma cadeira, um computador, um candeeiro de pé desprovido de ornamentos, um poster da Sabrina em fato de banho molhado, e um mini-bar. Os dias estão frios aqui por Sintra, mas tratarei de levar o meu termo ventilador de casa para evitar mais gastos desnecessários nesta fase. Aguardarei impacientemente a transferência enquanto esfrego as mãos até a pele se gastar.

Resta-me agradecer-lhe toda a confiança depositada em mim neste assunto financeiro, e desejar-lhe uma passagem de ano condigna com a classe colossal da sua pessoa. Doutor Mara, você é um génio, e o melhor amigo que se pode ter. Não se engasgue com as passas que amanhã tem de ir ao banco. Um abraço acompanhado de uma lágrima de comoção. Se nos encontrarmos em Fevereiro, ver-nos-emos concerteza.

     p.s. Envio-lhe, à parte, os habituais filetes de peixe para a ceia de ano novo, agradecendo-lhe que posteriormente me devolva o respectivo recipiente já lavado.

 Do seu novo estratega financeiro e amigo em estado de permanência,

Janeiro Alves

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