quarta-feira, 31 de outubro de 2012
Foguetório
Há uma violência feroz no ar e depois há o mar
diz a antena, o écran, talvez o radar
é tempo do sacrifício, ossos contínuos
do ofício, desafios, por fios silenciamos
anda ver arder em Agosto o nosso sol
como um desgosto todo o ano
ninguém ganha uma pátria por acaso
ninguém nasce aqui por engano
ter um país é ter uma casa e não
um acaso de que só agora acordamos
Os teus dedos dão o sinal
há uma mão que o teu cabelo penteia
o país do risco ao meio no mapa
pisa o chão e calcorreia sem limite
é esse o nosso único propósito
depositar esperanças no sol e no vento
correria louca dos santos e dos mártires
desperta em nós floração
Quem viu a semente ser lançada?
pequena lembrança de um gesto
um balão rebenta em cores
cavalo rosa move-se a planar
subirá, subirá, subirá
Há um miolo de festa na boca
coro entrelaçado de gente
cai no chão aquecido embrulhado
urgente despe-se à luz de um tecido
levanta-se o véu sem escarcéu
e teme esta secular resistência
defendendo o corpo a corpo
enérgico o toque do sono
dá toque a reboque e cresce
entrada tardia em cena
riso cândido não é derrota
é o carrossel da animação
há a rapidez ao rodar da estação
entrou o Outono terminou o verão
desce à tristeza vem à melancolia
caro contentamento do adeus, enfim,
vitória ao vento, bóias ao mar,
pintar o quadro romper o círculo
Como foi possível chegarmos aqui?
Trazemos duas tábuas nos braços
chove tanto em Penafiel
laço antigo guarda-chuva caído
janela entreaberta e espreitar
vestidos e cortinados à porta
um raio contínuo de luz que entra
o capacete barroco ilude a queda, a morte,
veloz tirania do tempo presente
impaciente volúpia que rasga
gradação incerta da luta
graciosidade humana da criação
explode em brilho até o foguete cair
nós?
Existimos.
(texto escrito a 27 de Setembro enquanto assistia ao espectáculo "Arraial" da companhia Circolando no Mosteiro São Bento da Vitória, com o sonoro apoio dos Dead Combo)
diz a antena, o écran, talvez o radar
é tempo do sacrifício, ossos contínuos
do ofício, desafios, por fios silenciamos
anda ver arder em Agosto o nosso sol
como um desgosto todo o ano
ninguém ganha uma pátria por acaso
ninguém nasce aqui por engano
ter um país é ter uma casa e não
um acaso de que só agora acordamos
Os teus dedos dão o sinal
há uma mão que o teu cabelo penteia
o país do risco ao meio no mapa
pisa o chão e calcorreia sem limite
é esse o nosso único propósito
depositar esperanças no sol e no vento
correria louca dos santos e dos mártires
desperta em nós floração
Quem viu a semente ser lançada?
pequena lembrança de um gesto
um balão rebenta em cores
cavalo rosa move-se a planar
subirá, subirá, subirá
Há um miolo de festa na boca
coro entrelaçado de gente
cai no chão aquecido embrulhado
urgente despe-se à luz de um tecido
levanta-se o véu sem escarcéu
e teme esta secular resistência
defendendo o corpo a corpo
enérgico o toque do sono
dá toque a reboque e cresce
entrada tardia em cena
riso cândido não é derrota
é o carrossel da animação
há a rapidez ao rodar da estação
entrou o Outono terminou o verão
desce à tristeza vem à melancolia
caro contentamento do adeus, enfim,
vitória ao vento, bóias ao mar,
pintar o quadro romper o círculo
Como foi possível chegarmos aqui?
Trazemos duas tábuas nos braços
chove tanto em Penafiel
laço antigo guarda-chuva caído
janela entreaberta e espreitar
vestidos e cortinados à porta
um raio contínuo de luz que entra
o capacete barroco ilude a queda, a morte,
veloz tirania do tempo presente
impaciente volúpia que rasga
gradação incerta da luta
graciosidade humana da criação
explode em brilho até o foguete cair
nós?
Existimos.
(texto escrito a 27 de Setembro enquanto assistia ao espectáculo "Arraial" da companhia Circolando no Mosteiro São Bento da Vitória, com o sonoro apoio dos Dead Combo)
Associativos e Desempoeirados
Quando não há ou o que existe não tem interesse, ou porque é muito caro e não é solidário, ou porque não gera nem se multiplicam as vozes, as pessoas juntam-se e fazem. Nestas associações há sempre muita carolice, muita invenção e dedicação bem como uma genuína vontade de marcar a diferença. Quem vai regularmente a Cedofeita, cidade do Porto, reconhece este empenho, para lá do lugar de convívio e encontro, identifica neste espaço da Associação Cultural Compasso uma abertura para a aprendizagem, a partilha de saberes e de intervenção social. Das aulas de blues, de permacultura, yoga, sessões colectivas de poesia e de cinema, o espaço do Compasso é, essencialmente, um lugar aberto e dado à curiosidade e realização. Assim continue...
sexta-feira, 26 de outubro de 2012
Um Documentário Bestial
Na sala do Passos Manuel quase cheia, o Cineclube do Porto deu a conhecer "Um documentário Bestial" realizado por Nuno Costa. O documentário começa por expor os dois lados da barricada (depoimentos de Moita Flores e Paulo Borges) mas logo assume o seu rumo e de que lado se encontra numa tradição com plenas raízes na sociedade portuguesa. Inventivo e irónico, este documentário tem a narração de Adolfo Luxúria Canibal e Rui Reininho, concentrando-se sobretudo numa ideia essencial que pode e deve ser questionada em qualquer civilização dita avançada: será legítimo o sofrimento animal, aliás, a promoção da violência e espectáculo do seu sofrimento? Estamos perante um documentário estimulante e inteligente, que ajuda a pensar e a sentir, com bom ritmo, acentuadamente irónico e com uma parte final absolutamente hilariante - onde o ás deste filme é o touro Fadjen e o amor que este tem ao seu dono - com direito a um "Je t´aime", cantado por Serges Gainsbourg na sua conclusão.
quinta-feira, 25 de outubro de 2012
As cidades e os cineclubes
Os cineclubes estão de regresso às cidades. Durante muitos anos os cineclubes laboraram com a ajuda estimável e prolongada dos institutos de cinema, da cinemateca, de consulados e embaixadas de muitos países que foram cedendo filmes e informação disponível sobre as películas e os realizadores. Os cineclubes continuam portanto a ser lugares de aprendizagem e descoberta da sétima arte. A forma como nos relacionamos com o mundo das imagens em movimento está a mudar de uma forma vertiginosa mas ninguém ignora a suprema satisfação que é assistir a um filme na sala de cinema. Os cineclubes tentam reformular o seu espaço, a sua actividade e a sua relação com o(s) públicos(s). Não nos enganamos se dissermos que muitos deles foram o "viveiro", a verdadeira escola de uma parte dos festivais de cinema em Portugal bem como tiveram um papel preponderante na criação de actores, realizadores, técnicos e produtores. O cineclube do Porto regressa hoje, após algumas sessões no Espaço Compasso da Cedofeita, ao Passos Manuel com a sessão:"Um documentário Bestial", um filme documental sobre touradas, touros, bestas e muitas outras bestialidades.
Outonia
A cantora Anna Järvinen começou por pertencer aos Granada, grupo extinto em 2003. Neste momento conta já com três álbuns: "Jag fick feeling", (2007), "Man var bland molnen" (2009), e "Anna sjalv tredje"(2011). A cantora de origem filandesa canta em sueco e sorve as suas influências na música dos Carpenters, The Cure, Elthon John ou mesmo na banda sonora de Reviver o Passado em Brideshead. Aquando da edição do primeiro álbum ganhou o prémio de música da cidade de Estocolmo. Fácil portanto a rendição a canções longas e carregadas de extensões e inflexões vocais, expressa num timbre doce e melancólico que inquieta e seduz até às entranhas. Há canções que vão ficando: Boulevarden, "Kom Hem" e "Vals För Anna", autênticas catarses emocionais, no seu já acentuado sentimento de comoção, doce e demorado. Por último, repare-se no seu lado multi-instrumental, pois Anna Jarvinen toca diversos instrumentos: harmónica, piano, guitarra e, claro, canta. O Outono e a melancolia merecem canções assim.
quarta-feira, 24 de outubro de 2012
O Festival de Números do Professor Crato
Há três anos assisti a uma conferência do professor Nuno Crato num auditório de uma escola. O objectivo era estimular o gosto pela aprendizagem dos números, reforçar o papel e estudo da Matemática bem como compreender e interpretar a importância da aplicação dos números e do cálculo matemático em sociedade. Nada contra, bem pelo contrário, pois enquanto ouvi aprendi, escutei com interesse, atenção e prazer a prelecção, muito embora este tivesse começado o seu discurso por apelar à desconfiança das aprendizagens da Filosofia em detrimento das ciências exactas. Incomodava-o na Filosofia, o discurso redundante, a ausência de intencionalismo nas aprendizagens, a falta de aplicação dos conhecimentos.O auditório composto por alunos de científico-naturais e professores da disciplina de Matemática aceitou sem contestar o argumentário pois há muitos anos que o vento sopra a favor dos números, das contas, das estatísticas, ainda que sem grandes resultados aparentemente favoráveis. Esperemos mais um pouco e tudo façamos pelo rigor científico da contas e dos números. O que já se torna mais ingrato é ser professor de Filosofia sem pensar nas consequências de tais mistificações, passar o ano a referir a relevância de coisas valiosas ainda que tenham uma aplicação prática no quotidiano, ou que mesmo os alunos digam que estas coisas filosóficas não sirvam para nada. Sabemos também que sem conceitos e o seu esclarecimento não se consegue pensar, o mesmo se pode dizer que sem pensamento analítico e crítico as coisas não avançam assim como nunca foi tão necessário a produção e fundamentação de argumentos válidos e convincentes para convencer adversários ou opositores. O garrote e desdém pela Filosofia não é de agora, já começou há muitos anos, falta apenas saber até quando irá continuar???
terça-feira, 23 de outubro de 2012
Porto São Bento
Porto São Bento é o desejo de
teatro na verdadeira acepção da palavra, a sua mais carnal vontade, o seu rito
colectivo de afirmar a voz e o corpo no palco, a realidade crua e sem fingimentos, a polis em palco. Cá fora há uma nova cidade que pulsa, regurgita e
se agita, apesar da crise, mal-grado o medo, muito para lá da economia, do
desemprego e da depressão. Eis-nos dentro do Teatro Carlos Alberto para ver Porto
São Bento e ver que o trânsito existencial é plural, reflexo da coralidade, da
polifonia, muito embora cada um fale na primeira pessoa, é-nos permitido viajar até
ao interior do Porto com história e com estórias de gente com carne e osso e que
julgam (des)esperar nas estações de metro. No fundo, pessoas como nós que nascem,
crescem e morrem na cidade do rio douro, da foz, da francesinha e do granito. Daí a topografia
não ficar circunscrita às estações de metro, mas sim a tudo aquilo que se
inscreve no corpo de cada um e na cidade, convocando para isso o outro e o
desejo de teatro, sendo que estamos na presença de actores profissionais e não
profissionais. É que ao contrário das estações de metro o teatro pode ser também isto:
encontro, partilha e reflexão.
quarta-feira, 17 de outubro de 2012
Fazendo
O boletim Fazendo(https://issuu.com/fazendofazendo) regressa no dia 19 para o seu quinto ano, assumindo a periodicidade mensal.Convirá referir que o Fazendo deve muito da sua existência à vontade, empenho e dedicação dos seus colaboradores e, essencialmente, ao seu núcleo directivo. Outro factor é o empenho dos gráficos que nestes cinco anos criaram linguagem diferentes aos assuntos espelhados nas suas páginas. As dificuldades, mesmo com os obstáculos decorrentes da exigência da periodicidade quinzenal, o Fazendo conseguiu manter a regularidade e a qualidade, conseguiu também sintonizar-se com o que de melhor se foi fazendo na Ilha do Faial, no arquipélago e no continente. Deste modo, alargou o seu número de colaboradores e estendeu o seu raio de acção à Ilha do Pico. Esta existência do Fazendo não seria possível sem o contributo financeiro da direcção regional que foi reconhecendo a qualidade e validade deste projecto de índole literária e cultural. Pode-se assim afirmar que este projecto mantém-se no essencial bem sucedido, faltando apenas cumprir aquilo que é hoje tão apregoado e necessário: alargar o seu número de leitores.
terça-feira, 9 de outubro de 2012
As coisas eternas perduram
Ilustração de Pedro Valim |
Comecemos assim pela singularidade e estranheza do título: “É na Terra não é na Lua”! O filme foi exibido no dia 7 de Outubro, no Auditório de Vila do Conde, numa proposta do cineclube local. Este super premiado documentário remete para o afastamento e isolamento deste lugar terrestre com apenas 17 quilómetros e 440 habitantes. O realizador Gonçalo Tocha, acompanhado por Dídio Pestana, faz aqui demanda às suas raízes açorianas com o objectivo de fixar o presente corvino em película, revelando-nos assim a ilha mais pequena do arquipélago bem como um gorro tecido por mãos que ligam o passado ao presente. O escritor Raul Brandão, também ele, deixou-se fascinar pelo Corvo em 1924 e onde viria a escrever dois anos depois nas “Ilhas Desconhecidas”: "Aqui acabam as palavras, aqui acaba o mundo que conheço; aqui neste tremendo isolamento onde a vida artificial está reduzida ao mínimo só as coisas eternas perduram.” O filme do Gonçalo Tocha e Dídio Pestana é um milagre que agora está acessível a todos - acaba de sair em DVD - aproximando-nos assim do Corvo, essa pequena ilha com alma de gigante guardada no meio do atlântico.
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