IFotografia de Eduardo Brito |
sábado, 31 de janeiro de 2015
O Poeta Albanês na Mesa do Hotel
O poeta
albanês aproxima-se astuto
em câmara
lenta da democracia literária
como nos
filmes mudos com banda sonora
à demanda
excelsa de dedicatória irmã
recontado o
périplo, o prato do ovo com arroz,
avenidas
largas de paranóica amplitude
de privações era feito o paraíso e a reclusão
de privações era feito o paraíso e a reclusão
em páginas
gastas com o ditador se comia
os avisos do
professor e a cantora careca
na mesa de
hotel a fintar o charme e a delícia
sem
reverência torpe ou linguístico terror
cada qual no
seu papel e a inventiva escritora
vai
escrevendo incessantes letras sem parar
são
arquitecturas perdidas na sua memória
palavras que
um amador de livros lhe quis oferecer...sexta-feira, 30 de janeiro de 2015
As Ilhas de Nuvens
"O sol baixou no céu. As ilhas de nuvens ganharam em densidade e atravessaram-se à frente do sol, tornaram-se negras, o mar perdeu o seu azul e tornou-se prateado e as sombras foram sopradas como toalhas cinzentas sobre o mar."
Virginia Wolf, in As Ondas.
quinta-feira, 29 de janeiro de 2015
quarta-feira, 28 de janeiro de 2015
FAZENDO 96
A edição do Boletim Cultural
Fazendo nº 96 ((https://issuu.com/fazendofazendo) já está nas ruas, nos cafés, nas bibliotecas, e nos lugares mais
improváveis de cinco ilhas do arquipélago açoriano onde este é normalmente distribuído. A publicação chega agora ao Faial, Pico, Terceira, São
Miguel e Santa Maria. A capa do nº96 é do ilustrador terceirense Luís Brum, um desenho
inverosímil (será?), contando esta renovada série do Fazendo com o design das ilhas Cook
e com conteúdos que vão da actualidade científica, musical, cinematográfica até às novidades
literárias existentes no arquipélago. O corpo editorial é da responsabilidade do Tomás
Melo e da Aurora Ribeiro, contém uma curiosa secção intitulada Fazendinho, pequeno
suplemento dedicado aos mais jovens e a graúdos com coração pueril. Esta nova
edição do Fazendo continua, portanto, a informar que é comunitário,
independente e gratuito.
terça-feira, 27 de janeiro de 2015
Esboços de Luís Brum para a Capa do Fazendo 96
Esboço I |
Esboço III |
Esboço II |
"Os primeiros desenhos são
difíceis. Os esquissos são duros", diz o autor deles. E desenhar inicialmente os primeiros esquissos, esboçar alguma
coisa na folha em branco bem podia ser uma luta declarada contra bloqueios, um
desafio assumido, uma luta árdua connosco e com o branco do papel. Desenho após
desenho, traço após traço, esquissos devassados e destruídos uns atrás dos outros. E o tema? Ir de
encontro à ideia de estarmos isolados na cidade, as ruas tomadas pelos carros, a loucura automóvel que tomou conta de nós, das cidades, dos passeios e dos lugares mais pequenos. E, por instantes, a rapidez, a pressão, os
prazos, os telefonemas, as mensagens no telemóvel: “Olha, posso falar-te rapidamente do desenho”, a eclodir, a entrar de mansinho pela caixa do
correio electrónico. Escutam-se, com toda a certeza, as novas explicações do autor: “Parte
duma convergência com uma "desconversa" com o Tomás, em que se falava da cidade
auto-estrada, sem espaço para os peões. Um nova realidade citadina que agora transita cada vez
mais para os Açores”. Os pedidos feitos de uma ilha para outra, a rapidez tecnológica a funcionar, as mensagens novamente deixadas no chat: “Vá lá, despacha-te, ó
criador!”. Sabendo de antemão que dali só podia vir coisa trabalhada,
esmiuçada, garantia da dedicação, do empenho e do esforço. E, aí vem mais uma deriva, mais uma conversa, mais um detalhe sobre o trabalho encetado: "Perceber onde estão os limites e como te sentes perante eles. Algo assim do género. O
barco virado como telhado, uma casa que não anda, um desejo de partir, e um
oceano de peixes mas que não são de comer”. Por fim, o trabalho e o dever cumprido da arte final: “É pá, os esquissos são meios duros, mas foi a partir daqui…tinha mais um, mas estava já
devassado com outras coisas...”. Ufa, companheiro, já se pode realizar a capa. Valeu todo este trabalho, claro que valeu, Luís!
segunda-feira, 26 de janeiro de 2015
Um Postal Janeirinho para Miriam Manaia
Querida Miriam, adorei o seu singelo postal.
Sim, é verdade, vivo no interior de um vulcão
após ter dado um pontapé numa cratera e, talvez por isso, cá estou
usufruindo de uma certa paz interior, recusando assim por instantes a convulsão do mundo exterior e ainda o mundo moderno. Como
sobrevivo com tanto cheiro a enxofre? É certamente uma escolha arriscada pois vivo e adormeço no meio das ervas e das rochas, saindo apenas para recolher vegetais e frutas, bem como dar longos
passeios e meditar. Por vezes, vou até alguma casa de pasto mais próxima “abastecer-me” de líquidos e comer alguns citrinos que me permitam aguentar os próximos meses, quem sabe, alguns anos. Viver junto de um vulcão adormecido sempre implicou alguns riscos mas o facto de ouvir o barulho de um riacho que passa aqui perto faz-me esquecer este báratro interior.
Aparentemente está tudo bem por aqui pois tenho as minhas necessidades básicas satisfeitas, sendo uma sorte aquilo que me aconteceu, isto a propósito do seu postal, já que o carteiro procurava nas imediações do Farol pelo“professor doutor que se retirou da civilização”, enquanto eu tomava o meu banho de banheira mensal, uma benesse que me é concedida pelo faroleiro. Sorte a minha, portanto, em ter lido as suas notícias e ainda a novidade dos seus
mergulhos com animais de grande porte. Que risco, amiga Miriam, mas quem não arrisca não petisca, já dizia o ditado. E como deve ser engraçado ter o olhar e a corte de tanto"crocodilo amigo".E, enquanto eles não mordem...
Permita-lhe que lhe diga que não sei muito bem quando voltarei ao convívio do mestre Janeiro Alves, já que soube que se transformou recentemente num coleccionador de liras, um instrumento musical que
povoou os seus serões de infância e que lhe devolvem agora as suas memórias pueris nas primeiras notas escutadas. Sendo assim, quando souber do seu ímpeto viajeiro, acompanhá-lo-ei neste nosso desejo de mútuo reencontro.
Com consideração, alegria e estima,
(Professor) Doutor Mara
domingo, 25 de janeiro de 2015
sábado, 24 de janeiro de 2015
Um Postal de Miriam Manaia
Caro Doutor, como tem passado
este sol de Inverno com temperaturas amenas e agradáveis?
Nem imagina o quanto amei saber
que se encontra de novo a viver junto de um vulcão adormecido. Passou tanto
tempo desde o nosso último encontro e sei que nunca mais transmiti nada da
minha parte, típico desta minha personalidade errante, bruxuleante e ondulante. Durante os
últimos meses viajei sem cessar, corri mundo, fartei-me de viajar até cansar.
Regresso agora de uma viagem ao sudoeste asiático onde, pela primeira vez, nadei
com crocodilos, e, talvez por isso, tenha tido necessidade de lhe escrever com esta brevidade. É
um impulso estranho nadar com animais de grande porte, rodeá-los sem que
estes nos mordam ou apanhem, sempre com esta sensação imanente de "toca e foge". É preciso muito treino, evidentemente.
Soube, por voz amiga, que o agora (Professor) Doutor tem tido contactos
recentes com o mui amigo Janeiro Alves. Que bom seria ter a vossa companhia no recém-renovado Solar dos
Manaias.
Até breve na caixa dos correios,
com imensas saudades suas
Miriam Manaia
O Quarto
Quem te pôs
a mão no ombro,
a faca que
te atravessou o coração,
são feridas
alheias, talvez algo que leste;
entretanto
partiste
para lugares
menos iluminados
e corações
menos vulneráveis,
pode
perguntar-se é o que fazes ainda aqui
se já cá não
estás.
A hora havia
de chegar em que
nos
perderíamos um do outro.
E
acabaríamos necessariamente assim,
mortos
inventariando mortos.
Morrer,
porém, não é fácil,
ficam
sombras nem sequer as nossas,
e a nossa
voz fala-nos
numa língua
estrangeira.
Apaga a luz
e vira-te para o outro lado
e acorda
amanhã como novo,
barba
impecavelmente feita,
o dia um
sonho sólido onde a noite se limpa e se deita.
Manuel António Pina, in Como se Desenha
uma Casa, Assírio & Alvim, 2011
quinta-feira, 22 de janeiro de 2015
O Maçariku!
Fotograma de "Jaime"de António Reis (1974) |
A Casa da Achada, Centro Mário Dionísio, dedica o mês todo da sua actividade ao Vitor Ribeiro, mais conhecido pelo "Maçariku". Incentivo e agradedecimentos à Casa da Achada por mais este gesto, simples homenagem, evocação de um sócio que ajudou a fundar e a erguer aquele espaço em pleno coração da Mouraria, em Lisboa. O Vitor Ribeiro desapareceu bastante cedo, sendo ele um, entre muitos outros, que ajudava a dinamizar aquele espaço de cultura, de partilha, de práticas e intervenções plurais. Permitam-me que vos diga que terei sempre saudades do Maçariku, um verdadeiro amigo. Há alguns anos atrás, numa das passagens pela Achada, falei em plena na sala de trabalho do filme "Jaime", do cineasta António Reis, enquanto ele cirandava de um lado para o outro, envolvido em dezenas de tarefas e coisas por tratar. Eu não me continha de recordar o entusiasmo numa das sessões do Fantasporto, em pleno Instituto Francês, a lembrança de ter visto um filme poético e bonito com apenas meia dúzia de pessoas e a forma estrondosa como aquele filme passou a povoar o meu imaginário de amador de filmes. Contava então aos presentes o quanto tinha gostado daquele filme e o quanto o gostaria de o rever. Dito e feito, o Maçariku não descansou enquanto eu não pudesse revê-lo pois, passado algum tempo, lá estava ele ali com o filme na mão para me oferecer e a dizer que o fosse ver. E a verdade, é que fui mesmo para casa à procura do écran do computador para assim o poder visionar. Obrigado, Maçariku!
terça-feira, 20 de janeiro de 2015
segunda-feira, 19 de janeiro de 2015
Encostas a Face à Melancolia
Encostas a
face à melancolia e nem sequer
ouves o
rouxinol. Ou é a cotovia?
Suportas mal
o ar, dividido
entre a
fidelidade que deves
à terra de
tua mãe e ao quase branco
azul onde a
ave se perde.
A música,
chamemos-lhe assim,
foi sempre a
tua ferida, mas também
foi sobre as
dunas a exaltação.
Não ouças o
rouxinol. Ou a cotovia.
É dentro de
ti
que toda a
música é ave.
Eugénio de Andrade
domingo, 18 de janeiro de 2015
sábado, 17 de janeiro de 2015
Herberto Helder
se um
dia destes parar não sei se não morro logo,
disse Emília
David, padeira,
não sei se
fazer um poema não é fazer um pão
um pão que
se tire do forno e se coma quente ainda por entre as linhas,
um dia
destes vejo que não vou parar nunca,
as mãos
súbito cheias:
o mundo é só
fogo e pão cozido,
e o fogo é
que dá ao mundo os fundamentos da forma,
pão comprido
nas terras de França,
pão curto
agora nestes reinos salgados,
se parar não
sei se não caio logo ali redonda no chão frio
como se
caísse fundo em mim mesma,
a mão dentro
do pão para comê-lo
-disse ela.
-disse ela.
Herberto Helder "A Morte sem Mestre", 2014, Porto
Editora (p. 29)
sexta-feira, 16 de janeiro de 2015
quinta-feira, 15 de janeiro de 2015
Tempos Modernos no Auditório da BPAJJG
O filme "Tempos Modernos", de Charlie Chaplin, será exibido amanhã, sexta-feira, dia 16 de Janeiro, às 21 horas, na Biblioteca Pública e Arquivo João José da Graça, na cidade da Horta, Ilha do Faial. Trata-se de um ciclo de três filmes, sempre às sextas-feiras, sobre este realizador inglês, nascido em Londres, em 1889, e que se viria a tornar uma referência importante na História do Cinema do século XX. O filme, com o título original de “Modern Times”, foi realizado em 1936 e é uma crítica mordaz e rábula inteligente “à industrialização e às máquinas que passaram a tomar conta da vida e do tempo dos seres humanos à escala planetária”.
terça-feira, 13 de janeiro de 2015
Há 30 anos...
Fotografia dos Madredeus na Ilha do Faial
|
A onomástica desse período é
marcada pela atribuição às raparigas dos nomes de Ana, Carla, Maria, Sandra e
Claúdia e dos rapazes por Ricardo, Pedro, Nuno, João e Bruno. O norte-americano
Tom Waits lançou o álbum de originais “Rain Dogs”.Na televisão o acontecimento é
o Live Aid, organização planetária que apresenta o arrojo de Bob Geldof e a coragem de Bono Vox dos
U2 e que é visto por mais de um bilião de pessoas. Às salas chegam dois filmes que
chocam a opinião pública: Je vous salue, Marie, de Jean-Luc Godard, com Myriem
Roussel e Juliette Binoche e “O Beijo da Mulher-Aranha”, de Hector Babenco, com
William Hurt, Raul Juliá, Sónia Braga, José Lewgoy e Milton Gonçalves. No
cinema em Portugal surge "Um Adeus Português"do realizador João
Botelho, o primeiro filme português de ficção a abordar de forma explícita a
guerra colonial e João César Monteiro realiza “À Flor do Mar”, tendo Teresa
Villaverde como actriz. José Afonso, bastante debilitado, edita um novo LP de
originais intitulado“Galinhas do Mato” com a companhia dos músicos: Júlio
Pereira, Luís Represas, Helena Vieira, Janita Salomé, Né Ladeiras e José Mário
Branco. Pedro Ayres Magalhães (guitarra clássica) e Rodrigo Leão (teclados)
encontram-se para formar um novo grupo musical. Um ano depois gravam "Os Dias da Madredeus" no Convento da Madre Deus, em Xabregas. Até hoje mais nenhum grupo português conseguiu semelhante reconhecimento internacional.
domingo, 11 de janeiro de 2015
O Núcleo da Claridade
"Numa manhã de Março de 2010,
voltei à casa de Queluz, onde Ruy Belo vivera. Aí se encontram actualmente os
versos escritos por sua mão e muitos outros papéis, livros, documentos,
objectos, ou as fotografias em que se encontra retratado. Elementos em que fora
deixada a sua marca indelével. Tencionava voltar a fotografar a casa, na
continuidade de Ruy Belo - Coisas de Silêncio, agora dez anos volvidos sobre a
publicação desse livro. A casa mantém-se nos seus aspectos essenciais, tal como
eu a encontrara dez anos antes, mas tomava agora consciência que não fazia para
mim sentido voltar a fotografar esse espaço. A sua escrita, os seus poemas,
abriam-me outras linhas de pensamento:"
Duarte Belo
quarta-feira, 7 de janeiro de 2015
Poemas no Silêncio da Gaveta
terça-feira, 6 de janeiro de 2015
segunda-feira, 5 de janeiro de 2015
...
o destino
deu-me uma frustração
para cada sonho
e em cada uma dessas frustrações
pôs fermento
com um amor não correspondido
ou um desgosto do género
o Benfica perder o campeonato a dois minutos do fim
ou nos pênaltis
ficar sem receber e sem saber quando ia receber
sofrer com a falta de dinheiro
e comer pão com ovos muitos dias seguidos
coisas desse género
o destino pegou nas árvores que tinha plantado
enquanto criança
e fez delas estacas
pediu à sorte para mas espetar
no coração
mas só havia um buraco no lugar do coração
o meu coração engoliu as árvores que em criança
alguém plantou por mim
e cuspiu um caroço pequenino
com a forma de um buraco sem fundo
o destino disse-me que era boa ideia morrer
e eu acreditei muito nele
como quando antes me disse
que era boa ideia ser escritor
ou jogador de futebol
eu acreditava muito no destino
mesmo depois dele ter começado a mentir
era como o melhor amigo
a mãe, a namorada.
Júlio Ávila
para cada sonho
e em cada uma dessas frustrações
pôs fermento
com um amor não correspondido
ou um desgosto do género
o Benfica perder o campeonato a dois minutos do fim
ou nos pênaltis
ficar sem receber e sem saber quando ia receber
sofrer com a falta de dinheiro
e comer pão com ovos muitos dias seguidos
coisas desse género
o destino pegou nas árvores que tinha plantado
enquanto criança
e fez delas estacas
pediu à sorte para mas espetar
no coração
mas só havia um buraco no lugar do coração
o meu coração engoliu as árvores que em criança
alguém plantou por mim
e cuspiu um caroço pequenino
com a forma de um buraco sem fundo
o destino disse-me que era boa ideia morrer
e eu acreditei muito nele
como quando antes me disse
que era boa ideia ser escritor
ou jogador de futebol
eu acreditava muito no destino
mesmo depois dele ter começado a mentir
era como o melhor amigo
a mãe, a namorada.
Júlio Ávila
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