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| A Mulher que Morreu de Pé de Rosa Coutinho Cabral |
domingo, 30 de novembro de 2025
XVI Curtas Açores: Há Cinema Insular?
sábado, 29 de novembro de 2025
O Corpo Ardeu
Toda a aldeia reunida no adro;
corremos sobre ele aos gritos
fizemo-lo cair de grande altura.
O padre disse que agora, sim, é
que começa a verdadeira vida
e eu pensei com muita força e muita fé:
mete a verdadeira vida no cu.
Acordo a meio da noite com uivos das pessoas sãs.
Prendem um homem no manicómio
atam-no à cama, enfiam-lhe comida
pela goela abaixo, engordam-lhe o fígado.
Ele tinha um anjo dentro da cabeça
sempre a lavá-lo, a voá-lo muito
para lá das nuvens, repuxava-lhe os fios
forçava-os a uns esgares, uns dizeres obscenos.
Quando o deixava a planar a meia altura
a uns quinhentos metros, digamos, uma
corrente inesgotável de lenços coloridos
saia-lhe da cartola, com as músicas mais belas
Tanto medo da loucura,
tantas verdades incómodas ali à mostra,
tantos segredos insuportáveis.
Vamos estabilizá-lo, disseram.
Quero escapar, morrer,
arder-vos por entre os dedos
ó boas pessoas, ó sãos de espírito,
ó assassinos, adeus.
sexta-feira, 28 de novembro de 2025
Sozinho de Ângelo de Lima
Vá sem Pompa o caminho do coval,
Acompanhe-me apenas a tristeza
Não vá do bronze o som de val´em val!
Chove o céu sobre mim de orvalho as bagas
Luz do sol-posto fulja em seu cristal,
Cantem-me o «dorme em paz» ao longe as vagas,
Vá assim té ermas, afastadas plagas...
Lá...fique eu só!
Não volte lá ninguém!
terça-feira, 25 de novembro de 2025
59 de Manuel Zerbone
Nem já os campos me alegram, essas crianças eternas, que despem cada Inverno o manto suavíssimo das suas ilusões, para novamente se enfeitarem com ele nas suas Primaveras que se sucedem; nem o mar com os seus suspiros de ternura, nem com os seus rugidos de cólera, nem com a sua vastidão imensa, por cima da qual o meu espírito paira e se agita às vezes, como a pena caída da asa de uma pomba, pode vogar em baldões, à tona de uma niágara que se despenha em cascatas de espuma.
Quando assim anda enlutado o nosso espírito, a ponto que nem mesmo a música, esse bálsamo consolador de todas as amarguras, pode fazer-lhe bem, em tudo vemos um motivo tristeza, e os nossos corações abrem-se facilmente para receber e compreender as mágoas daqueles que nos parecem ainda mais infelizes que nós."
Novembro de Almeida Firmino
Ao cemitério do seu berço
(Os crisântemos junto ao peito
Num jeito de contrição)
Depor as pétalas de saudade
Nas compras do perdão.
No aceno breve do seu olhar
O diálogo mudo de mágoa
Só memória e asa...
E se vão calados, tristes e sós
Mais tristes e sós voltam a casa.
Não estão longe os seus mortos, não...
Vivem aqui perto e felizes
À sombra dos ciprestes
Bem junto ao coração.
Mas os meuss que ficaram
(Feitas as malas e a viagem)
Para lá do mar a distância...
Como tocar a sua imagem?
Da Terra...
Mas pouco a pouco descobrimos que não ouviremos mais o riso claro daquele companheiro; descobrimos que aquele jardim está fechado para sempre. Então começa o nosso verdadeiro luto, que não é desesperado, mas um pouco amargo. Nada jamais, na verdade, substituirá o companheiro perdido. Ninguém pode criar velhos companheiros. Nada vale o tesouro de tantas recordações comuns, de tantas horas vividas juntos, de tantas reconciliações, de tantos impulsos afecxtivos. Não se reconstroem essas amizades. Seria inútil plantar um carvalho na esperança de ter, em breve, o abrigo de suas folhas.
Antoine de Saint-Exupéry, Terra de Homens.
Do Outono
O facto pelo qual prefiro o Outono à Primavera é porque no Outono olhamos para o céu, na Primavera para a terra.
domingo, 23 de novembro de 2025
Deriva Litoral de Sofia Barata
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| Clube de Cinema da Ribeira Grande Exibido dia 21 de Novembro de 2025 18h30 |
As razões desta erosão? Essas são múltiplas, aqui esclarecidas por Ana Carrilho, Bruno Pedrosa, Cátia Azevedo Clife, Pedro Hugo, Domingues Laura Tubarão e Tiago Abreu. Ao longo dos seus 75 minutos, Deriva Litoral mostra-nos imagens da costa portuguesa e a acentuada erosão das suas praias. Uma reflexão da situação actual será cada mais premente e necessária.
Do Abrigo
sexta-feira, 21 de novembro de 2025
Filipe Furtado: As Primaveras Outonais!
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Filipe Furtado: Quando o Prelúdio sai a público, com as demoras inerentes a um primeiro lançamento, já estava noutra fase de pensar a minha linguagem e a minha composição e já a iniciar o processo de fazer novas canções, de continuar a compor material novo. Depois foi começar a trabalhar esses temas com o restante trio, integrar alguns nos repertórios ao vivo, de forma a muscular essas composições, perceber que caminhos poderiam seguir. Nas questões pragmáticas de gravações, mistura e masterização levamos quase dois anos a terminar o álbum.
DM: O que é que estás a preparar para os concertos ao vivo?
FF: Os concertos ao vivo são onde a magia acontece. Todos os concertos são diferentes, principalmente, onde pode haver mais improvisação. Tento sempre pensar como posso fazer as coisas melhor ou de forma diferente, muitos vezes ajustando também ao estado de espírito com que subimos a palco. Alguns poemas do álbum ganham um outra vida em palco, trocamos as sonoplastias e os floreados minimalistas por uma nova vida harmónica e melódica, de forma espontânea que nós os três seguimos intuitivamente.
DM: Quais são os motores essenciais à criação/processo criativo das novas músicas?
FF: Penso que, em primeiro lugar, essa transição gradual da guitarra para o piano. Sentia que a guitarra, o meu primeiro instrumento, já não me permitia percorrer os caminhos que começava a imaginar para a música que queria fazer/escrever. O tempo também é um factor de mudança grande. O "Prelúdio" havia sido o primeiro álbum, inevitavelmente para mim um compêndio com as primeiras experiências a compor, a escrever, a musicar poemas e, ainda para mais, já desfasado no tempo. Um segundo álbum já vem com outra maturidade, menos desconhecimento sobre todo o processo de gravar um álbum, vem com essas outras referências que passara a escutar com outra atenção. Vem, certamente, muito da experiência em palco que fui adquirindo e desenvolvendo com o Paulo e com o Fidalgo enquanto trio. Em função dessa possível maturidade também uma escrita que também transmita maior pensamento e questionamento político e filosófico. Claro, a tentativa de abordar a música próxima de linguagens do cinema ou da fotografia. Interessa-me muito essa ideia de viagem, da viagem que esses formatos nos permitem também pela nostalgia, pela melancolia, porum contexto do tempo e espaço. Foi propositado todo o processo fotográfico analógico para as capas de singles e do álbum "Como Se Matam Primaveras". Os livros são sempre uma foto importante para imaginar e dar corpo a canções. A "Ada" é uma leitura musical sobre um romance de Vladimir Nabokov com o mesmo título, por exemplo, um dos escritores que lia ainda nos tempos das aulas de literatura russa na Faculdade de Letras de Coimbra.
DM: Este disco dá continuidade ao “Prelúdio”?
FF: Acho que o único elo de ligação é ao single do "Prelúdio", a canção "Uma Coisa Linda de Morrer", que havia sido a última a integrar o alinhamento do primeiro álbum e já representava uma transição para o piano, para os teclados. Entre nesses novos horizontes instrumentais e cinematográficos que começava a procurar. Há um afastamento óbvio da guitarra, até dessa influência muito grande do cancioneiro do Brasil, da Bossa Nova. Estava a voltar a querer abraçar o jazz, pelo menos nas suas formas contemporâneas menos verticais, mais abrangentes. Comecei a ouvir muito a cena UK Jazz, que é uma mistura muito grande e muito versátil.
quinta-feira, 20 de novembro de 2025
Tira o Disco e Toca ao Vivo
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| A Indústria Musical em Portugal João Gobern |
Do Estudo
quarta-feira, 19 de novembro de 2025
Surda de Eva Libertad
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| Surda de Eva Libertad, 2025 |
Bestiário dos Rios
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| BD de Filipe Felizardo Coletivo Guarda Rios |
terça-feira, 18 de novembro de 2025
Um Poema de Gastão Cruz
O Sítio Inverso
onde o mar corre prós rios
onde a luz que há de dia
é de noite que alumia
Onde as coisas que há de pé
Estão sentadas
E onde o vento ao soprar
deixa as coisas mais paradas
um sítio tal que o deserto aqui
é floresta tropical
e o lume é gelo
e a montanha vale
Um sítio roxo
um sítio que é o inverso dos lugares
aqui o são é coxo
e o cego rasga os mares
Inventar um sítio assim:
fazê-lo de tão sábios traços
que ao supores fugir de mim
me venhas cair nos braços.
João Habitualmente, in Poemas em Peças - Quase Dito, Fevereiro de 2014.
segunda-feira, 17 de novembro de 2025
Era uma vez uma Capital da Cultura...
Não havia apenas mais filmes para ver na tela grande, peças de teatro para fruir, bons concertos de música para assistir, mas também muito mais gente envolvida nas ditas actividades culturais, mais gente capacitada para realizar peças de teatro e estar em palco, outras ainda que pudessem arriscar realizar filmes, interpretar papéis no cinema português e estrangeiro, mais juventude a tocar nas filarmónicas, pessoas mais capacitadas para organizar e promover actividades culturais. Sim, é verdade, mais espectadores emancipados, críticos e intervenientes do espaço público, impulsionadores de eventos exigentes, reflexivos, aglutinadores, divertidos, etc. Enfim, que possa ser um momento de partilha e reunião, uma possibilidade de mobilizar e convocar a esperança...
domingo, 16 de novembro de 2025
O Homem de Argila de Anaïs Tellenne
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| O Homem de Argila, 2023 |
quarta-feira, 12 de novembro de 2025
Espera-me
terça-feira, 11 de novembro de 2025
segunda-feira, 10 de novembro de 2025
O Mundo Aqui: Batucadeiras de Santiago!
Todos os anos em Novembro, por esta altura, a AIPA (Associação de Imigrantes dos Açores) agrega e promove uma festa com gente de muitas proveniências num único espaço: o Multiusos das Portas do Mar, em Ponta Delgada. É comum encontrar comida, artesanato, artes visuais e muita música para fruir naquele espaço em apenas dois dias. Neste evento podemos saborear as comidas e bebidas dos países e povos que aqui vivem e trabalham – da cachupa à muamba de galinha, da feijoada ao cuscuz, passando pelos tacos, chamuças, ou ainda beber um grogue, provar uma caipirinha ou degustar uma sobremesa como o bolo de coco ou cenoura, tudo é possível nesta gastronomia rica e variada.
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| Herança di nós Terra Fotografia de Jorge Kol de Carvalho |
domingo, 9 de novembro de 2025
CAC: Nova Direcção
Do Medo
"O medo de sair (da sociedade autoritária do medo) fez com que nunca realmente se saísse do medo. Como se voltou à velha tendência nacional de não conflitualidade social e política, ela infiltrou-se naturalmente na ausência de conflito inerente à sociedade globalizada de controlo. O salazarismo havia obtiddo a supressão dos conflitos com a repressão, mas a passagem actual para a mundialização reactiva a tendência, democraticamente, graças à existência da norma única (que é ausência de norma e de autoridade visíveis)."
José Gil, Portugal, Hoje. O Medo de Existir, Relógio D´Água Edições, 2005
sábado, 8 de novembro de 2025
Alfredo, O Coleccionador de Borboletas
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| S.A Marionetas Teatro & Bonecos no CAC na 2ªEdição do FIOS |
sexta-feira, 7 de novembro de 2025
Adeus, Gianni Berengo Gardin
GBG: Sì, certo. Credo che alcune mie fotografie possano indurre un simile sentimento.
Gianni Berengo Gardin faleceu no Verão deste ano, com 94 anos. Só me dei conta do seu trabalho fotográfico em solo açoriano, decorria o ano de 2018 e foi um acontecimento surpreendente dado que desejei de imediato conhecer a sua obra e entrevistá-lo para a FALTA fanzine, uma publicação com seis números que um grupo de amigos se disponibilizou a editar. Trabalhávamos, portanto, nas Oficinas de São Miguel no número inicial da fanzine FALTA quando nos deparámos com uma mala cheia de revistas da publicação alemã intitulada Mare. Entre elas o número 18 - uma edição dedicada àquela cidade “familiar e estrangeira”, de seu nome Veneza. Ele ficaria para sempre conhecido pelo “fotógrafo de Veneza”, apesar de ter nascido na Ligúria, tendo editado ao longo de 50 anos de carreira mais de 250 livros, tal como aquele em que expõe a sua descaraterização pelo turismo de massas -“Veneza e le Grande Navi”.
Naquela edição da revista Mare soltava-se, assim, o nome de Gianni Berengo Gardin, encontrando-se por lá alguns registos fotográficos das construções venezianas sobre o mar, as gôndolas que varrem a paisagem líquida desta cidade italiana, o Vaporetto com gente de todas as classes, os jovens clérigos que passeiam pelas avenidas, outros jovens reunidos na praia do Lido a ouvir música desde uma grafonola. Demorou pouco tempo até procurarmos a origem e biografia deste fotógrafo. O fascínio pelas suas imagens fez com que gostaríamos que este estivesse presente no número 1 da nossa revista marcada pelas artes gráficas. Será que ele aceitaria?
O pedido da entrevista começou por ser feito através da sua Agência Fotográfica, Contrasto, que só depois de algum tempo nos concedeu o contacto pessoal de Gianni. A resposta demorou – foi necessário enviar o nº0 da FALTA – mas o remetente vinha carregado de amabilidade e generosidade. A verdade é que um dos mais antigos fotógrafos italianos em actividade tinha acedido conversar com uma fanzine/revista sediada no meio do atlântico. A sua filha, Susanna Gardin, conhecida por tratar do acervo fotográfico de seu pai, fez-lhe chegar as perguntas bem como nos enviou, prontamente, as respostas. Entretanto, o encarte pretendido não se consumou, pois havia uma verba envolvida que não conseguíamos comportar. Sobraram duas belíssimas fotografias para o interior da revista e a certeza de que lhe endereçaríamos um exemplar.
A satisfação da curiosidade, nesta entrevista inesquecível, deu-se pela afirmação de uma fotografia enquanto “documento, testemunho do mundo em que vivemos” e do trabalho do fotógrafo feito de estudo nesse “aprender como ver e contar as coisas”. O espanto surgiu do seu desconhecimento de Portugal ainda que conhecesse (e bem!) a obra de Gérard Castello-Lopes ou que reconhecesse nas suas próprias fotografias um sentimento semelhante à saudade. Logo na abertura do mês de Agosto passado, Gianni Berengo Gardin deixou de fotografar…o futuro dir-nos-á da sua importância!
terça-feira, 4 de novembro de 2025
Da Proximidade
E à Esquerda Nada de Novo?
"Catherine Connoly, Zohran Mamdani ou até Sónia Nicolau, de Ponta Delgada, podem mostrar que há outra formas de inclinar a escolha política para outro lado, mas são exceções a uma regra de desnorte. Se na semana passada, quiséssemos olhar para a regra, bastaria evocar o fim ao ralenti de Mariana Mortágua, ou a dispersão de candidaturas presidenciais à esquerda, para qual o Livre deu mais um incompreensível contributo embrulhado num processo de decisão esdrúxulo. Claro que que António José Seguro também não ajuda, surdo ao apelo de Nanni Moretti de dizer "qualquer coisa de esquerda". Uma falta de coragem e de clarividência que também é regra."
David Pontes, in "E à Esquerda Nada de Novo?", editorial Público, 27 de Outubro de 2025.










