quinta-feira, 23 de julho de 2020
quarta-feira, 22 de julho de 2020
segunda-feira, 20 de julho de 2020
Da Educação
"Hoje, no dia do aniversário de Nélson Mandela, que nunca deixou de valorizar a aprendizagem, a educação e o conhecimento como forma por excelência de afirmação da liberdade humana, e que enquanto esteve detido em Robben Island completou um curso universitário por correspondência, lembremos as suas inspiradoras palavras para nos guiar na acção e dar força na luta pela construção de um mundo mais próspero, justo, livre e pacífico - "A educação é a arma mais poderosa que se pode usar para mudar o mundo."
Jorge Sampaio, Público, Sábado, 18 de Julho de 2020.
sexta-feira, 10 de julho de 2020
Relógio de Sol
o rapaz sobre a amurada
vai casar com a rapariga
mais magra de todas
mas ainda é novo
lança alimento à praia
onde as gaivotas
se encontram
é o sítio onde mora
irá casar,
não passa da madrugada,
repousa agora,
é cedo
a irmã desse rapaz
deixou o pai morrer
casou com um libertino
amando-o como a uma profecia
dela a mulher de crença
gasta-se
com a luz do dia
o irmão de ambos
prá cidade servir
crivou a arma de balas
-sabe-se que a a alma é um número-
o homem enche-lhes o copo
d´água tinge-se-lhes o coração
plúmbeo cor de pedra
inevitável os persegue
são três as horas
que se lhes esgotam no corpo.
vai casar com a rapariga
mais magra de todas
mas ainda é novo
lança alimento à praia
onde as gaivotas
se encontram
é o sítio onde mora
irá casar,
não passa da madrugada,
repousa agora,
é cedo
a irmã desse rapaz
deixou o pai morrer
casou com um libertino
amando-o como a uma profecia
dela a mulher de crença
gasta-se
com a luz do dia
o irmão de ambos
prá cidade servir
crivou a arma de balas
-sabe-se que a a alma é um número-
o homem enche-lhes o copo
d´água tinge-se-lhes o coração
plúmbeo cor de pedra
inevitável os persegue
são três as horas
que se lhes esgotam no corpo.
Ana Paula Inácio in "As Vinhas do Meu Pai", Quasi Edições, Junho de 2000.
quinta-feira, 9 de julho de 2020
"Um Passo para Sul" de Judite Canha Fernandes
"-Professora! - gritou uma voz.
Fingiu que não ouvia. O pior que lhe podia acontecer naquele momento era ter de falar com alguém.
-Professora! Professora!!
Continuou.
-Professora Ângela!
A voz dizia-lhe qualquer coisa (talvez das turmas dos anos anteriores?), mas já alguém lhe tocava no ombro. Um rapaz alto e magro, polo vermelho por fora das calças de ganga escura, aí pelos vinte anos, sorria à sua frente com ar nervoso. O volume na garganta aumentou. Enquanto dava aulas a uma turma, lembrava-se dos nomes de toda a gente, sem excepção, porém, depois de registar as últimas notas na pauta, esquecia nomes e sobrenomes para sempre e desejava com profunda intensidade nunca mais encontrar os respectivos seres humanos.
-Como está, professora?-perguntou.
-Tudo bem - respondeu, tentando sorrir.
-Há uma coisa que tenho de lhe dizer...- balbuciou, torcendo as mãos.
-Sim?
-A senhora foi a melhor professora que alguma vez tive....mudou a minha vida.
Dito isto, afastou-se rapidamente.
Ângela suspirou e continuou a andar. Só ao dobrar a curva, a duas ruas da casa, se deu conta do bonito e enorme daquilo. As aulas, as aulas. O seu precioso e surpreendente prazer. Fechava a porta da sala atrás de si e deixava cada turma engoli-la, voraz, o quadro, os olhos, os livros, recentemente também os vídeos, os links, a conversa, as perguntas, tudo encaixava perfeitamente. Parecera ter nascido para dar aulas magníficas, um poder mágico que nunca soube de onde vinha. Nos intervalos perdia-se de aborrecimento. Às vezes tomava café no bar, outras lia qualquer coisa quando ouvia o que diziam à sua volta, em geral conversas que pareciam discursos, coisas do individualismo hedonista contemporâneo de self-change, sublimadas em vaga espiritualidade. Inevitavelmente, surgia uma frase do tipo: «Eu sei o que isso é, passei por isso, mas tive a força de mudar. Mas até para isso tinha alguma paciência, se alguém lhe dirigia a conversa, ficava calada, sorria, às vezes até anuía com ar compreensivo. Só as aulas lhe interessavam.Talvez por isso os dias de ataques como aquele acontecessem mais ao fim de semana. Ao contrário de muita gente, trabalhar era a actividade mais saudável."
Judite Canha Fernandes, in "Um Passo para Sul", Gradiva, Setembro de 2019.
quarta-feira, 8 de julho de 2020
segunda-feira, 6 de julho de 2020
domingo, 5 de julho de 2020
...que as Varinas eram as ovarinas de Ovar?
"Sim, é verdade. As varinas, mulheres que em Lisboa vendiam peixe e se fixaram sobretudo no bairro da Madragoa, e mais tarde em Alfama e Mouraria, são descendentes das gerações de ovarinas vindas do litoral de Aveiro no início do século XIX, essencialmente do concelho de Ovar, para acompanhar os maridos pescadores. Com o tempo caiu a letra que as ligava às raízes e fixava residência na sua alma. De Ovar trouxeram a atitude viva e desperta que fazia delas uma população inteiramente à parte. E era vê-las, atrevidas e ruidosas com uma canastra de fundo chato, que equilibravam na cabeça com imodesta habilidade."
Ana Rita Ramos, in Jornal Público, sábado, 4 de Julho de 2020.
Aprender a fazer chá
"Para aprender a fazer chá recomendo que se usem exclusivamente os chás sublimes da Gorreana. Visitei há muitos anos as plantações de chá em São Miguel e recomendo a visita a quem tiver a sorte de ir àquela abençoada ilha.
Os chás são todos muito bons e claramente etiquetados, os preços são justíssimos e têm a vantagem de serem naturalmente bio (não há pragas de insectos em São Miguel). A Gorreana é uma família que faz uma família de chás, desde o chá verde ao Oolong e ao chá preto, com folhas inteiras ou partidas ou naturalmente moídas."
Miguel Esteves Cardoso, in Fugas, 4 de Julho de 2020.
sábado, 4 de julho de 2020
"Surdina", de Rodrigo Areias, estreia dia 9 de Julho.
daqui: cinema da villa |
"Embora discuta muito com os realizadores no processo de criação, não tenho intenção de fazer filmes parecidos com os deles, nem que os deles se pareçam com os meus. A liberdade criativa e artística é o que melhor caracteriza o nosso cinema. A desformatação do cinema português está alicerçada nessa liberdade, na abrangência de abordagens e não em criar escolas e linhas de pensamento.
Sobre o Teatro...
"O teatro é uma forma social que depende, mais do que qualquer
outra da sua eventual manifestação pública e por isso, de condições culturais
gerais. Pode-se teoricamente conceber um filme rodado com intenção de
posterioridade, o teatro, esse existe no presente, ou não existe."
Vaclav Havel in jornal "Expresso",
sexta-feira, 3 de julho de 2020
Um Poema de José Tolentino Mendonça
Os homens nasceram para ser esquecidos
perante o batalhão de bandeiras extintas
é natural que muitos se perguntem
para que servem as mãos
mas na penumbra, quando o coração bate
sem que saibamos porquê
vem-nos ao pensamento
que talvez a chama não esqueça
o silêncio onde se consumiu
in Três Poemas inéditos, Jornal de Letras, Julho de 2020
Da Claustrofobia
"O filme é um retrato social. Essa má-língua, esse burburinho popular, que se torna um pouco claustrofóbico, ainda subsiste ?
-Os meios pequenos têm essa característica. Senti essa claustrofobia quando cresci em Guimarães. Foi por isso que saí de cá aos 17 anos e só voltei aos 30. E o que me fez voltar é exactamente o que mesmo que outrora me fez ir embora. É bom passear pela rua e perguntarem-me pelos meus filhos. Há uma relação de proximidade. Guimarães tem 160 mil habitantes, mas é como se fosse uma aldeia."
Rodrigo Areias, entrevista de Manuel Halpern, in Jornal de Letras, Julho 2020.
terça-feira, 30 de junho de 2020
"As Charlas Quotidianas do Doutor Mara" no You Tube
Tiago Vouga (Doutor Mara) e Aurora Ribeiro (Jornalista) |
O
texto teatral oscila entre o dramático e o cómico e tem como principal ideia colocar em
palco as contradições dos diálogos entre uma jornalista e um improvável "cientista social", jogar sobre que é público e o privado, ambicionando
alcançar uma verdade possível e ainda caricaturar factos ampliados pelos meios de comunicação
social e as redes sociais. Servimo-nos, por isso, deste Doutor Mara, habitual frequentador de tugúrios inimagináveis, que vai desde a discoteca, jardins público, tascas e afins e que, aproveitando-se do seu estatuto de
figura pública sem mácula, irá dialogar e dissertar com o "grande público" sobre a vida e o mundo, nem sempre um lugar bem frequentado.
As
representações dos papéis estiveram a cargo de Tiago Vouga (Doutor
Mara) e de Aurora Ribeiro (Jornalista) que, assim, interpretaram os capítulos “Ginecomagia”, “Tarantoterapia” e “Enomátria”,
ao longo de 26 minutos. Deste modo, quem quiser ver ou rever, fica aqui a respetiva
ligação:https://www.youtube.com/watch?v=0m_9pwmHtqc&t=12s
segunda-feira, 29 de junho de 2020
"Tenho Tantas Saudades" de Francisco de Lacerda
Tenho
tantas saudades
Tenho
tantas saudades
Como
folhas tem o trigo,
Não
as conto a ninguém,
Todas
consumo comigo.
Tenho
tantas saudades
Como
areias tem o mar,
Tantas, tantas, noite e dia,
Tantas, tantas, noite e dia,
Que
não as posso contar.
Combate
Sei o tamanho do verão
Pelo lugar que divide as mãos
E pelo subir sinuoso
Que mais e mais rompe os vestidos
Pelos golpes desferidos sei
O tamanho profundo das espadas
Daniel Faria, in Poesia, edição de Vera Vouga, Quasi Edições, 2009.
Pelo lugar que divide as mãos
E pelo subir sinuoso
Que mais e mais rompe os vestidos
Pelos golpes desferidos sei
O tamanho profundo das espadas
Daniel Faria, in Poesia, edição de Vera Vouga, Quasi Edições, 2009.
domingo, 28 de junho de 2020
"Florida Project" de Sean Baker
Imagem da Wikipédia |
Aqui há
Flórida, mas não há projecto. Sean Baker acompanha a vida de uma criança de
seis anos, com nome de Moonee, que habita num pequeno apartamento de um motel pintado de cor lilás, ao lado da sua jovem mãe (Halley), desocupada e dependente dos
apoios do estado, sobrevivendo ao sabor de pequenos actividades obscuras e
fugas para a frente. À sua volta tudo parece volátil, imersa numa realidade
descartável, fria e consumista. Desta feita, Moonee agrega-se a outras crianças que ali vivem e é
através desse mundo de aventuras que se evade do vazio e futilidade que a circunda.
"Florida Project" é um filme
surpreendente, quase sufocante, é de uma força e transparência incríveis.
Estreada em 2017, a película traz-nos também Willem Dafoe (Bobby), no
papel duma figura protectora do universo infantil, com o bom senso e a madurez diante de um mundo em desagregação, à beira do colapso. O final não podia ter sido
melhor engendrado, com a entrada daquelas duas pequenas amigas pelo parque da Walt Disney
adentro.
Sobre o Uso das Coisas...
"Tudo na história tem o seu lado positivo e negativo. O avião é um progresso, mas polui a atmosfera. O iPhone é magnífico porque nos liga aos amigos pelo mundo inteiro, mas diminui a comunicação em família. A faca serve para cortar o pão e as batatas, mas também para ser espetada no coração de alguém. Na vida tudo foi, é e será assim. Não são as invenções ou descobertas que em si são más, mas o uso que delas fazemos."
Onésimo Teotónio Almeida, entrevista de Teresa Firmino, in Jornal "Público", 27 de Junho de 2020.
sábado, 27 de junho de 2020
"Himne d´Amour": um documentário em torno de Canto da Maya
"Família", 1928.
Peça exposta na Exposição "Canto da Maya",
a decorrer no Núcleo Santa Bárbara.
(Fotografia Carlos Olyveira)
|
“Canto da Maya merece um lugar melhor na história
da arte do século XX”, é dito logo na apresentação do documentário que conta
com testemunhos de amigos, críticos e artistas. Em “Hymne d´Amour” constatamos a
dedicação à volta do seu trabalho, ainda as razões em torno da figuração e do seu
empenho em representar as relações e laços que as pessoas mantém entre si, para além da suavidade
e delicadeza dos afectos, corporizado numa escultura de representações
afectivas e simbólicas, pautando o seu
discurso escultórico por uma busca incessante da beleza e da felicidade.
sexta-feira, 26 de junho de 2020
sábado, 20 de junho de 2020
sexta-feira, 19 de junho de 2020
quinta-feira, 18 de junho de 2020
"Enlouquecer é Morrer numa Ilha" de Maria Brandão
Daqui: Livraria Almedina. |
"Tem de se pôr a mexer. O voo é ao meio-dia e não pode contar com Donika para a levar ao aeroporto. Não depois da discussão de há instantes. Quer entrar e sair de casa sem se fazer notar, sem provocar mais abalos. Tem sorte. Donika voltou a dormir, com recurso ao habitual comprimido. Lara pega na pequena mala pronta desde a véspera, mete-se num eléctrico até ao Hauptbahnhof e aí apanha um comboio para o aeroporto. Tudo rápido, inócuo, automático. Do check-in ao controlo de segurança, do drop off de bagagem ao embarque, o contacto humano reduz-se ao binómio Grüezi - Danke. Um alívio. Uma alívio redobrado por não ter ninguém sentado ao seu lado no avião, por ter sossego para adiantar a leitura que tem entre mãos, um livro viciante de Eduarda Monforte. Contos negros com contornos policiais e apontamentos divertidos. A autora intriga-a. É gémea de Marta, com quem Rogério se casa no dia seguinte, e escreve com contenção e humor, atributos existentes na irmã em grau muito reduzido. A nota biográfica na badana é lacónica e não apresenta fotografia. Apenas refere que tem imensa visibilidade no mercado de língua alemã e nasceu no lugar para onde o seu avião se dirige."
Maria Brandão, in "Enlouquecer é Morrer numa Ilha", Companhia das Ilhas, 2020.
domingo, 14 de junho de 2020
"Merlí": Uma série catalã à volta da Filosofia
Séri "Merlí" na RTP Play |
Na Grécia Antiga de Aristóteles existia uma escola (os Peripatéticos), criada por este, que tinha como missão realizar um itinerário com uma questão e onde o
percurso só estaria concluído quando a interrogação estivesse resolvida. Pensar
que o ensino da Filosofia possa dar uma boa série e cativar audiências foi o
móbil da série “Merlí”, escrita por Héctor Lozano, cabendo a direcção de
actores de Eduard Cortés. Ao todo foram quarenta episódios que se aprimoraram na Catalunha, no canal TV3, espalhando-se a seguir pelos canais televisivos do mundo inteiro, tendo a sua exibição ocorrido em Portugal, através da RTP2.
Merlí (Francesc Orella), o professor de Filosofia,
transporta consigo o carisma da docência filosófica e ainda os procedimentos pouco habituais do seu "modus operandi", instalando, por isso, a desorientação junto dos seus colegas tal como nos alunos debutantes da disciplina de Filosofia. No
entanto, o seu lado humanista, isto é, mais próximo e compreensivo junto dos discentes, sobretudo pelo lado afectivo, ganha ascendência junto
destes, aumentando naturalamente a sua influência. Ele é o professor de Filosofia que
pretende que os seus alunos contemplem e absorvam a Filosofia como algo estimulante,
instiga à autonomia do pensar, invectiva a crítica e lança a dúvida permanente, ao mesmo tempo que fomenta o espírito de grupo junto da turma, ressaltando desta forma o melhor de cada um.
Neste formato televisivo, um episódio da série "Merlí" dá-se em cinquenta
minutos e todos eles contém o pensamento de um filósofo, com situações de aula e
diálogos dedicados a cada um dos filósofos - Hannah Arendt, Nietzsche,
Schopenhauer, Thomas Hobbes, Albert Camus, Kierkegaard, Karl Marx, Kant, David
Hume, entre tantos outros. A série conta com bons actores e um contéudo da sala de aula instigante e bastante apelativo. Esta não deve ser tida como modelo para a actividade docente mas pode ser entendida como uma boa fonte de inspiração, um motor de compreensão rápido do que é ensinado pela Filosofia no secundário e uma forma muito lúdica de entender ou tentar perceber a juventude estudantil actual.
"Trutas" de Rodrigo Alves Guerra Júnior
"Que título esplêndido.
Estou a ver já os gastrónomos antegozarem com estalos de língua aquele peixe de fino paladar, que chegou a dar o ser ao muito conhecido adágio:« Não se apanham trutas as bragas enxutas» A cena passa-se onde quiserem; no Cairo, no Egipto, em Malta, no Pico, em Nesquim, em***-aqui peço licença para pôr as entrelinhas convencionais, à laia dos romances antigos: os cavaleiros embuçados entraram na freguesia de ***
E de facto numa bela manhã de Julho, entraram três sujeitos de carruagem na freguesia de ***Deixo muito de propósito estas três entrelinhas à investigação dos homens de ciência; uma equação a resolver.
O que lhes afianço é que os os três entraram pela freguesia dentro ao trote manhoso de três mulas, que o chicote do cocheiro não conseguia de maneira nenhuma despertar."
Estou a ver já os gastrónomos antegozarem com estalos de língua aquele peixe de fino paladar, que chegou a dar o ser ao muito conhecido adágio:« Não se apanham trutas as bragas enxutas» A cena passa-se onde quiserem; no Cairo, no Egipto, em Malta, no Pico, em Nesquim, em***-aqui peço licença para pôr as entrelinhas convencionais, à laia dos romances antigos: os cavaleiros embuçados entraram na freguesia de ***
E de facto numa bela manhã de Julho, entraram três sujeitos de carruagem na freguesia de ***Deixo muito de propósito estas três entrelinhas à investigação dos homens de ciência; uma equação a resolver.
O que lhes afianço é que os os três entraram pela freguesia dentro ao trote manhoso de três mulas, que o chicote do cocheiro não conseguia de maneira nenhuma despertar."
in Edição, conjunta Câmara Municipal da Horta e da Secretaria Regional da Educação e Cultura/Direcção Regional dos Assuntos Culturais, 1988.
sábado, 13 de junho de 2020
sexta-feira, 12 de junho de 2020
Um poema de Emily Dickinson
Faz desta uma cama generosa
Faz esta cama com respeito
Aguarda nela a sentença
Esplêndid e justa
Que o seu colchão
esteja direito
A sua almofada fofa
Não deixes o ruído
do nascer do sol
Perturbar esse leito
Tradução de Rosário Valadas Vieira
Faz esta cama com respeito
Aguarda nela a sentença
Esplêndid e justa
Que o seu colchão
esteja direito
A sua almofada fofa
Não deixes o ruído
do nascer do sol
Perturbar esse leito
Tradução de Rosário Valadas Vieira
Envelhecer
"-As pessoas? As pessoas não recusam meter uma cunha quando vêem nela a oportunidade de ultrapassarem os outros ou compensarem as suas fracas aptidões. As pessoas exigem prioridade e serviços públicos de excelência, mas só não fogem aos impostos se não puderem. As pessoas pagam e recebem luvas com a naturalidade de quem regateia roupas de contrafacção numa feira. As pessoas inscrevem-se em concursos de talentos e não se importam de os vencer apenas com os votos dos familiares e amigos, mesmo quando estes viciam os resultados telefonando ou clicando mais de uma vez...Que ética ou honestidade têm as pessoas? Que amor-próprio? Que carácter? Como poderiam as pessoas escolher dirigentes, em que de resto votam tribalmente, que se distinguissem pela exigência, o rigor, a honra, os escrúpulos ou a dignidade?"
Rui Angelo Araújo, excerto do texto "Envelhecer", inserido na Grotta nº4, Arquipélago de Escritores, Junho 2020.
quinta-feira, 11 de junho de 2020
Um Poema de Lucebert
não sou um poeta amoroso
sou o vigarista iroso
do amor, vejo debaixo dele o ódio
e por cima um gesto cacarejando
a lírica é a mãe da política
apenas sou o apregoador de revolta
e a minha mística é a comida corrompida
da mentira com a qual a virtude se desintoxica
proclama que os poetas de veludo
estão a morrer tímidos e humanísticos
doravante a ardente gola férrea
dos carrascos comovidos abrir-se-á em cânticos
ainda eu, que moro nesta coletânea
como um rato na ratoeira, anseio pelo esgoto
da revolução e grito: ratos de rima, zombai
zombai ainda desta escola da linda poesia
sou o vigarista iroso
do amor, vejo debaixo dele o ódio
e por cima um gesto cacarejando
a lírica é a mãe da política
apenas sou o apregoador de revolta
e a minha mística é a comida corrompida
da mentira com a qual a virtude se desintoxica
proclama que os poetas de veludo
estão a morrer tímidos e humanísticos
doravante a ardente gola férrea
dos carrascos comovidos abrir-se-á em cânticos
ainda eu, que moro nesta coletânea
como um rato na ratoeira, anseio pelo esgoto
da revolução e grito: ratos de rima, zombai
zombai ainda desta escola da linda poesia
in revista Grotta nº4, Arquipélago de Escritores, (Dossier Lucebert -Traduções de Jos van den Hoogen, Daniel Rocha e Arie Pos), Junho de 2020
quarta-feira, 10 de junho de 2020
sono
o vento velho chora com cinzas o mar dourado
onde devagar e triste se afasta o dia
morre a conversa severa e leal e um suspiro
levanta-se entre os pinhos escuros
pálido o passo fugidio da lua
no fundo e em silênco
mãos futuras vão a caminho do
trabalho nas ribeiras e raízes
nas nuvens porém descansam
olhos agora supérfluos
todos fecham as asas finas
na rígida luz estrelada
Lucebert, in revista Grotta nº4, Arquipélago de Escritores (Dossier Lucebert, tradução de Jos van der Hoogen, Daniel Rocha e Arie Pos), Junho de 2020.
onde devagar e triste se afasta o dia
morre a conversa severa e leal e um suspiro
levanta-se entre os pinhos escuros
pálido o passo fugidio da lua
no fundo e em silênco
mãos futuras vão a caminho do
trabalho nas ribeiras e raízes
nas nuvens porém descansam
olhos agora supérfluos
todos fecham as asas finas
na rígida luz estrelada
Lucebert, in revista Grotta nº4, Arquipélago de Escritores (Dossier Lucebert, tradução de Jos van der Hoogen, Daniel Rocha e Arie Pos), Junho de 2020.
terça-feira, 9 de junho de 2020
No Dia Mundial dos Oceanos...
Fotografia de Tânia Neves dos Santos |
"Temos de mudar o paradigma da conservação para o paradigma da restauração. Preservar o que existe já não chega, temos de passar para uma lógica da restauração. Esta lógica implica uma mudança profunda nas pescas a nível mundial, em termos de subsídio e monitorização, da gestão que tem que ser feita muito mais em co-gestão, com os pescadores a terem uma co-gestão, com os pescadores a terem uma responsabilidade dos stocks pesqueiros, que hoje em dia não têm. Temos de voltar a regenerar as zonas costeiras, que são as mais martirizadas do oceano. Temos de pensar como podemos aumentar exponencialmente as zonas costeiras naturais que produzem serviços ecossistémicos fundamentais para o oceano e as nossas sociedades - como a retenção do carbono, a função de maternidade dos peixes e a protecção das costas. Estamos a falar das pradarias marinhas, dos mangais, e das barreiras de coral, das zonas de sapal, das florestas de kelp - tudo isto vai ser objeto de reparação. Da mesma maneira que percebemos há muitos anos que era preciso reflorestar a natureza, temos de fazer agora isso no mar. As pradarias marinhas, os sapais, os mangais absorvem mais carbono do que as florestas, em média, cerca de oito vezes. Têm enorme importância para a descarbonização e a luta contra as alterações climáticas."
Tiago Pitta e Cunha em entrevista a Teresa Firmino, Jornal Público, 8 de Junho de 2020.
Olof Palme: o Sonho da Social-Democacia!
Há
mais de três décadas que foi cometido o homicídio de Olof Palme,
primeiro-ministro sueco, à porta do Grand Cinema, na cidade de Estocolmo, na Suécia. O crime deu-se pelas costas quando se encontrava acompanhado pela sua mulher à
porta do cinema. Passaram-se, assim, muitos carnavais e até hoje ninguém foi capaz de deslindar o autor dos disparos. As investigações já trouxeram mais de cem autores confessos de quem não se obteve qualquer prova evidente. Segundo os jornais de hoje, a
polícia sueca tem novidades para os dias que se avizinham e encerrar o caso. Entretanto, a Europa parece lentamente
recuperar esse testemunho de uma social-democracia avançada, sob o signo
de Palme e Willy Brandt. Sobre Olof
Palme, sabemos que foi um primeiro ministro que saía à rua sem guarda-costas e
que ia muitas vezes ao cinema de metro. Conhecido pelo seu exemplar serviço e dedicação à causa pública,
simboliza ainda hoje o exercício e a prática do que melhor ficou da social-democracia. Defensor do Estado
Social que deve assegurar o Serviço Nacional de Saúde e da Educação aos seus concidadãos, tal como o cuidado e a protecção aos mais velhos, o reforço da educação das crianças e
adolescentes, o auxílio aos mais desfavorecidos, a garantia de igualdade entre homens e mulheres bem como a protecção das minorias. Mesmo assim, Olof Palme está a precisar que alguém trilhe os seus passos, aprofunde o seu pensamento, arrisque ir mais longe na justiça de um mundo melhor. Em vida, acreditou no fim do
apartheid na África do Sul, combateu o avanço nuclear, foi defensor do
Exército de Libertação da Palestina e esteve ao lado da Cuba de Fidel Castro
contra o embargo americano. Em plena Suécia capitalista, acreditava na defesa integral de direitos de quem oferecia a sua força de trabalho. Era um homem que se entregava de corpo e alma ao bem comum…será que se
enganou?
Excerto de"Vista Desarmada", por Lígia Soares
"(...)A linguagem fez-se por comparação. Não temos culpa. Sabemos que somos diferentes das árvores porque nos comparámos, e assim queremos ficar. Diferentes por comparação, isto é, mais bronzeados com mais firmeza e por mais tempo. Se não estamos perdidos.
Teremos de olhar tudo do início outra vez. Como cientistas. Como aqueles que continuam a abrir hipóteses, a perguntar porquê.
Os cientistas, quem é que quer saber deles?
Dizem tudo tão explicadinho, tudo com tanta falta de estilo, e depois querem ser ouvidos. Não fora algumas estrelas de Hollywood que se vão dando ao trabalho de divulgar na internet entre uma outra fotografia na carpete..."
in Gerador, Janeiro de 2020.
Documentário, Cinema do Real?
«O documentário puro não existe, tal como a ficção pura também não existe. É importante lembrarmo-nos disso: de que há sempre alguém por detrás de uma câmara. Que ela não dispara sozinha, que ela não escolhe o ângulo para ver e dar a ver o mundo.»
Luís Mendonça, in "Revista Gerador", número 29, Janeiro de 2020.
segunda-feira, 8 de junho de 2020
Atlântico de Helder Luís
Fotografia de António João Lima |
Esteve em exibição,
no verão passado, no Museu Municipal da Póvoa de Varzim, uma exposição que teve
por título de “Atlântico”, e que agregava um conjunto alargado de fotografias que
documentava uma viagem iniciada na Póvoa de Varzim e concluída em Ponta Delgada
da embarcação açoriana “Íris do Mar”. O artista multimédia, Helder Luís, responsável
pelas imagens, juntou-se à tripulação e registou o vigor do ofício quotidiano e
esforçado dum grupo de pescadores, provenientes de diferentes comunidades e
nacionalidades, que reflectem já uma labuta piscatória em profunda alteração. O
livro que acompanha a exposição, apresenta-se como registo de imagens da faina
piscatória, essencialmente, dá conta dos seus gestos e técnicas, o seu modus operandi, apontando caminhos e estabelecendo
pontes entre dois universos a precisar de diálogo. O livro apresenta ainda soluções
para uma pesca responsável, o que seria de todo útil que fosse tido em conta.
Grotta - Arquipélago de Escritores nº4
O número quatro da revista Grotta, arquipélago de escritores, já saiu e pode ser pedido ou comprado através da livraria “Letras Lavadas”. A direcção pertence a Nuno Costa Santos, a coordenação editorial de Diogo Ourique e a composição fotográfica da capa é de Sara Leal. O seu conteúdo contém uma resenha alargada sobre o trabalho poético de José Henrique Santos Barros, uma entrevista ao crítico literário, Vamberto Freitas, uma súmula poética do holandês Lucebert e de Armando Emmanuel, outra prosa sobre o silêncio e lentidão das fajãs de Ana Monteiro e muitos outros textos propícios às mais diversas leituras. A revista tem o preço de venda ao público de 14 euros.
É Preciso Ver o Cubo Para Não Ficarmos Quadrados
“(...)Neste vaivém diário do não
questionamento, da luta alienada pela sobrevivência e da inversão de
prioridades, acredito que os lugares da cultura devem ser lugares de
questionamento. Devem ser templos do pensar por pensar, os lugares do
verdadeiro encontro da reflexão. Mais do que nunca, museus, bibliotecas e
auditórios são essenciais para podermos criar espaço para os processos de
empatia. Um centro cultural deverá ser um espaço com tempo lá dentro.
Necessitamos de programas que nos provoquem e desafiem a olhar o diferente e
acreditar na diferença como única possibilidade de ver os outros lados do cubo.
Necessitamos de mais espaços culturais que apostem nos encontros da
diversidade. Verdadeiros espaços públicos, espaços cúbicos com faces opostas,
com arestas confluentes e com vértices mobilizadores.”
Luis
Sousa Ferreira, in Disco
Riscado, Revista Gerador, Janeiro de 2020
...
o barco à cabeceira do filho
que a mãe encharca de luz
na invectiva infanticida
de afundar o barco
o barco onde o filho navega
a sonho alto gritando
a fúria que o impele
contra o excesso de luz.
Ana Paula Inácio in "As Vinhas do Meu Pai", in Quasi Edições, 2000.
que a mãe encharca de luz
na invectiva infanticida
de afundar o barco
o barco onde o filho navega
a sonho alto gritando
a fúria que o impele
contra o excesso de luz.
Ana Paula Inácio in "As Vinhas do Meu Pai", in Quasi Edições, 2000.
Documentário, Cinema do Real?
«Todo o cinema é espelho do real e da ficção. O cinema é o espelho da vida. E a vida é una, não se pode separar. É na realidade que encontramos a fantasia. Mas é também na fantasia que encontramos o real. O cinema é a linguagem do olhar, da procura daquilo que aparentemente não se vê.»
Claudia Varejão, in "Revista Gerador", número 29, Janeiro de 2020.
domingo, 7 de junho de 2020
sábado, 6 de junho de 2020
Ao Fim da Tarde
De qualquer maneira não durariam muito. A observação
mostra-mo há muitos anos. Embora um tanto apressadamente
veio e parou-as a Sina então.
Foi breve a bela vida.
Porém quanto das essências a tensão,
em que leito excelente nos deitámos,
em que prazer os nossos corpos demos.
Um eco dos dias do prazer,
um eco dos dias junto de mim veio,
algo da juventude de nós ambos em ardente exaltação;
um carta voltei a pegar na minha mão
e lia mais e mais até falhar a luz.
E saí para a varanda melancolicamente -
saí para mudar de pensamentos vendo pelo menos
pouca cidade amada,
pouco movimento da rua e das loja.
Kostandinos Kavafis, in "Os Poemas", Relógio D´Água Editores, Julho de 2005.
mostra-mo há muitos anos. Embora um tanto apressadamente
veio e parou-as a Sina então.
Foi breve a bela vida.
Porém quanto das essências a tensão,
em que leito excelente nos deitámos,
em que prazer os nossos corpos demos.
Um eco dos dias do prazer,
um eco dos dias junto de mim veio,
algo da juventude de nós ambos em ardente exaltação;
um carta voltei a pegar na minha mão
e lia mais e mais até falhar a luz.
E saí para a varanda melancolicamente -
saí para mudar de pensamentos vendo pelo menos
pouca cidade amada,
pouco movimento da rua e das loja.
Kostandinos Kavafis, in "Os Poemas", Relógio D´Água Editores, Julho de 2005.
Um Soneto de Luíz Vaz de Camões
Já a roxa e clara Aurora destoucava
Os seus cabelos de ouros delicados
E das flores os campos esmaltados
Com cristalino orvalho borrifava;
Quando o formoso gado se espalhava
de Sílvio e Laurente pelos prados;
pastores ambos, e ambos apartados
de quem o mesmo Amor não se apartava.
Com verdadeiras lágrimas, Laurente
-Não sei -, dizia, -ó Ninfa delicada,
Porque não morre já quem vive ausente
Pois a vida sem ti não presta nada.
Responde Sílvio:-Amor não o consente,
que ofende as esperanças da tornada.
Os seus cabelos de ouros delicados
E das flores os campos esmaltados
Com cristalino orvalho borrifava;
Quando o formoso gado se espalhava
de Sílvio e Laurente pelos prados;
pastores ambos, e ambos apartados
de quem o mesmo Amor não se apartava.
Com verdadeiras lágrimas, Laurente
-Não sei -, dizia, -ó Ninfa delicada,
Porque não morre já quem vive ausente
Pois a vida sem ti não presta nada.
Responde Sílvio:-Amor não o consente,
que ofende as esperanças da tornada.
sexta-feira, 5 de junho de 2020
I would like to have met you before
A
distância fustiga e reclama
A
perfeição da árvore no quintal
Não
brilharemos tão cedo na noite
Como os dedos da viagem apartados
Sem
contrariar a tempestade dentro
Saber de cor o trecho da sedução
Fantasias
de pérola descoberta
Idioma
à mesa de cor delineado
Afagamos
corpos no findar da tela
Ausência
de vibração latente
Contraímos
um silêncio banal
Nada fixamos no coral da maresia
Arte de Viver
"Na arte de viver, o homem é ao mesmo tempo o artista e o objecto da sua arte, é o escultor e o mármore, o médico e o paciente."
Erich Fromm
Erich Fromm
O Sonho Impossível
Sonhar o sonho impossível
Sofrer a angústia implacável
Reparar o mal irreparável
Amar um amor casto à distância
Enfrentar o inimigo invencível
Tentar quando as forças se esvaem
Alcançar a estrela inatingível
Essa é a minha busca
Miguel de Cervantes, in Dom Quixote de La Mancha, 1605.
Sofrer a angústia implacável
Reparar o mal irreparável
Amar um amor casto à distância
Enfrentar o inimigo invencível
Tentar quando as forças se esvaem
Alcançar a estrela inatingível
Essa é a minha busca
Miguel de Cervantes, in Dom Quixote de La Mancha, 1605.
quinta-feira, 4 de junho de 2020
A Hora que Ainda Não é
"Há sempre uma hora que ainda não é. Nessa hora hora nós esperamos tudo que ainda não está e tudo que ainda não foi. É a hora de beber vinho e amar, amar muito, amar muito a lucidez, a loucura , as mulheres e as cartas de jogar a vida, as cartas de jogar a vida, de jogar o amor, a loucura, a lucidez, as mulheres e as pinturas que já fazíamos com cascas, garrafas, pedras, cartas velhas e geográficas que arrancávamos com fúria das paredes da velha casa burguesa, em que imperava uma pantufa já rota mas, apesar de tudo, sempre pantufa. Só nos fica aquela sensação que é o esperar e duvidar. Esperar até que a nossa própria camisa branca se transforme numa camisa de quadrados, quadrados tão cheios de cor que se espetam nos nossos olhos, e nos gritam: - Foge da tua escuridão! Agarra o ar encarnado e a atmosfera azul das montanhas cúbicas que ascendem em espirais imóveis no céu de todos os Deuses que só existem em nós.
Cresce agora a árvore sem folhas secas, a árvore feita de nós, da hora e de tudo que é vivo."
in Obras Completas de Mário Henrique Leiria, E-Prematur, 2017.
quarta-feira, 3 de junho de 2020
Exageros
"O Alfredo atirou o jornal ao chão, irritadíssimo, e virou-se para mim:
-Estes jornalistas! Passam a vida a inventar coisas, é o que digo. Então não afirmam que, no Sardoal, foi encontrado um frango com três pernas! Vê lá tu! É preciso descaramento.
Ajeitou-se melhor no sofá e, realmente indignado, coçou a tromba com a pata do meio."
in Obras Completas de Mário Henrique Leiria, E-Prematur, 2017.
"O Rapaz da Última Fila” de Juan Mayorga
German: Está bem. Até está bastante bem. Se
o que pretendes é que as pessoas se riam das tuas personagens. Mas isso é um
objectivo baixo. A primeira pergunta que um escritor deve fazer a si próprio é: Para quem escrevo? Para quem é que tu escreves? É muito fácil pôr em destaque o
pior de qualquer pessoa, para que os medíocres, sentindo-se superiores, se riam
dela. É muito fácil pegar numa pessoa e vê-la pelo lado mais ridículo. O que é
difícil é olhar para ela de perto, sem preconceitos, sem a condenar
antecipadamente. Encontrar as suas razões, a sua ferida, as suas pequenas
esperanças, o seu pequeno desespero. Mostrar a beleza da dor humana, isto só
está ao alcance de um verdadeiro artista.”
Juan Mayorga, in “O Rapaz da Última Fila”, Livrinhos de
Teatro, 2008, Artistas Unidos
Na Décima Nona Primavera Antes do Fim do Século
Por uma árvore
que dê primeiro frutos
depois flores
depois folhas
e só depois
muito depois
crie raízes
Jorge Sousa Braga, in "O Poeta Nu" - (Poesia Reunida), Assírio&Alvim, 2007.
que dê primeiro frutos
depois flores
depois folhas
e só depois
muito depois
crie raízes
Jorge Sousa Braga, in "O Poeta Nu" - (Poesia Reunida), Assírio&Alvim, 2007.
terça-feira, 2 de junho de 2020
As Janelas
Nestas salas vazias, onde vou passando
dias pesados, para cá e para lá ando
à descoberta das janelas - Uma janela
quando abrir será uma consolação. -
Mas as janelas não se descobrem, ou não hei-de conseguir
descobri-las. E é melhor talvez não as descobrir
Talvez seja a luz uma nova subjugação.
Quem sabe que novas coisas nos mostrará ela.
Kostandinos Kavafis, in "Os Poemas", Relógio D´Água Editores, Julho de 2005.
dias pesados, para cá e para lá ando
à descoberta das janelas - Uma janela
quando abrir será uma consolação. -
Mas as janelas não se descobrem, ou não hei-de conseguir
descobri-las. E é melhor talvez não as descobrir
Talvez seja a luz uma nova subjugação.
Quem sabe que novas coisas nos mostrará ela.
Kostandinos Kavafis, in "Os Poemas", Relógio D´Água Editores, Julho de 2005.
" - O que é a felicidade para si?
-A felicidade é algo efémero, não se consegue definir, só sentir. Para mim, na maior parte das vezes, é uma frase bonita, um bom livro, a ideia para uma história. Talvez, neste momento, seja a cadela da rua que, mesmo à frente da minha casa, teve sete filhos. Apenas isso."
Arundhati Roy, entrevista de Luciana Leiderfarb na Revista Expresso,
30 de Maio de 2020.
domingo, 31 de maio de 2020
sábado, 30 de maio de 2020
sexta-feira, 29 de maio de 2020
Um Poema de Ana Paula Inácio
Partir com os barcos
e ferir os dedos
ao puxar das redes.
Mas o sangue, que se confundirá nas malhas, não será
ainda tão significativo como aquele que verterá o peixe
ao cair nelas.
in "As Vinhas do Meu Pai", in Quasi Edições, 2000.
e ferir os dedos
ao puxar das redes.
Mas o sangue, que se confundirá nas malhas, não será
ainda tão significativo como aquele que verterá o peixe
ao cair nelas.
in "As Vinhas do Meu Pai", in Quasi Edições, 2000.
quinta-feira, 28 de maio de 2020
"Western": um filme de Valeska Grisebach
"Western"
é um filme da cineasta Valeska Grisebach, com ligações à Escola de Cinema de Berlim.
É evidente que o título remete para o género cinematográfico do velho oeste
americano mas o cenário passa-se nas fronteiras do continente europeu.
Esta longa metragem de 2017 viria a obter uma boa recepção pela crítica cinematográfica. "Western" mostra a história de um grupo de
trabalhadores alemães que é incumbido de construir uma central hidroeléctrica numa
aldeia da Bulgária. À parte as dificuldades linguísticas entre o grupo e os
habitantes locais, há aqui também questões de percepção e representações que
ganham contornos antagónicos. Nesse grupo hierárquico bem definido encontra-se Meinhard (Meinhard Neumann), que irá ser o personagem central deste drama sem
tragédia, ora por ser ele quem se avizinha da pequena comunidade ou porque
cedo constatamos que, também ele, é vítima de preconceito e marginalização.
Ele demonstra que por vezes nem é necessário criar muitas ondas ou tão pouco
ser muito exuberante para sentir na pele a rejeição e o desapego do grupo. O momento
final em que este dança com a comunidade local é uma revelação do princípio
libertador da abertura ao outro. Só quem é poroso pode ser fecundo!
«Vidro Azul»
tenho que vos pedir desculpa
se hoje escancarei demasiado
o meu cansaço
não foi fácil
disse o locutor no fim
da emissão
antecipando-se assim
a todos os epílogos
Miguel-Manso, in Santo Subito, Março de 2010
se hoje escancarei demasiado
o meu cansaço
não foi fácil
disse o locutor no fim
da emissão
antecipando-se assim
a todos os epílogos
Miguel-Manso, in Santo Subito, Março de 2010
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